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Apenas uma pequena fração da dark web está sendo usada para atividades ocultas, revela estudo

Por Peter Dockrill
Publicado na ScienceAlert

A dark web tem uma reputação duvidosa. Escondidas da transparência e visibilidade da superfície da Internet, as complexas redes de anonimato compõem os servidores de dark web e distribuem todos os tipos de conteúdo obscuro: drogas ilícitas, material de abuso infantil, armas ilegais, parafernália extremista e muito mais.

Mas a dark web também é um lugar mal compreendido, e as conotações que seu nome evoca não são representativas da grande maioria das atividades que ocorrem dentro de seus limites anônimos, de acordo com novas pesquisas.

Um novo estudo liderado pelo pesquisador de cibersegurança Eric Jardine da Virginia Tech sugere que apenas uma pequena fração da dark web está sendo usada para acessar sites ocultos – e, neste caso, a atividade oculta nem é necessariamente uma atividade ilícita (embora, devido ao caráter sombrio da dark web, pode ser sim).

No estudo, Jardine e sua equipe analisaram dados da rede Tor, geralmente considerada a maior e mais popular rede que permite acesso anônimo e privado à web sem censura, por meio do uso de um software especial que se conecta a um sistema de roteadores cebola, projetado para garantir o anonimato do usuário.

Não há nada necessariamente imoral ou errado nisso, aliás. A deep web, como é conhecida, é simplesmente as partes da Internet que não são indexadas por mecanismos de pesquisa regulares (ao contrário da surface web). Parte da deep web, no entanto, é a dark web, e partes da dark web hospedam conteúdo malicioso.

Por esse motivo, os pesquisadores queriam avaliar quanto da rede Tor pode estar sendo usado para fins ocultos (e potencialmente maliciosos). No entanto, não há uma maneira particularmente fácil de fazer isso, já que a rede Tor foi projetada para oferecer anonimato.

Mas, monitorando as assinaturas de dados coletadas dos nós de entrada do Tor, a equipe foi capaz de diferenciar entre os usuários que usam o Tor para acessar anonimamente sites regulares na surface web e outros que utilizam o sistema para acessar conteúdo oculto na dark web.

Surpreendentemente, os pesquisadores descobriram que apenas 6,7% dos usuários globais estavam usando o Tor para acessar serviços ocultos na dark web (que pode ou não fornecer material ilegal ou questionável).

“Descobrimos que a maioria dos usuários do Tor se volta para um conteúdo regular da web que provavelmente pode ser considerado benigno”, diz Jardine.

“Portanto, embora a rede de anonimato Tor possa ser usada para alguns fins altamente maliciosos, a maioria das pessoas em um dia normal parece usá-la mais como uma versão hiperprivada do Chrome ou do Firefox”.

Ainda mais interessante, a análise mostrou que o uso do Tor para acessar serviços ocultos ou conteúdo regular da web diferia entre nações democráticas liberais e países com leis e direitos mais repressivos.

“A taxa média de provável uso malicioso do Tor em nossos dados para países definidos pela Freedom House como ‘não livres’ é de apenas 4,8 por cento”, escrevem os autores em seu estudo.

“Em países definidodos como ‘livres’, a porcentagem de usuários que visitam o Roteador Cebola/Serviços Ocultos como uma proporção do uso diário total do Tor é quase o dobro ou ~7,8%”.

Em outras palavras, as pessoas que vivem em democracias liberais são mais propensas a explorar a dark web para fins maliciosos, enquanto os usuários que vivem sob regimes repressivos em países não-democráticos podem estar mais propensos a usar o Tor para contornar as restrições de censura local e acessar informações livres na Internet.

Existem algumas suposições feitas nesta análise, no entanto, e o próprio Tor Project – uma organização sem fins lucrativos incorporada nos Estados Unidos, se opôs a algumas das conclusões do estudo.

“Os autores deste artigo de pesquisa optaram por categorizar todos os sites .onion (cebola) e todo o tráfego para esses sites como ‘ilícitos’ e todo o tráfego na ‘Clear Web’ como ‘lícito'”, afirmou a diretora executiva do Tor Project, Isabela Bagueros, ao Ars Technica.

“Essa suposição é falha. Muitos sites, ferramentas e serviços populares usam os serviços do onion para oferecer privacidade e benefícios de contornar a censura contra seus usuários. Por exemplo, o Facebook oferece um serviço .onion. Organizações de notícias globais, incluindo The New York Times, BBC, Deutsche Welle, Mada Masr e Buzzfeed oferecem serviços .onion…

“Definir o tráfego para esses sites e serviços amplamente usados ​​como ‘ilícitos’ é uma generalização que demoniza pessoas e organizações que escolhem uma tecnologia que lhes permite proteger sua privacidade e contornar a censura”.

Vale ressaltar que Jardine e sua equipe reconhecem em seu estudo que a dark web pode conter conteúdo socialmente benéfico e também admitem que a clear/surface web hospeda conteúdo preocupante.

No entanto, eles justificam suas conclusões “probabilísticas” de que o acesso a sites e serviços ocultos .onion é provavelmente para fins maliciosos, apontando para pesquisas anteriores que sugerem que os sites obscuros ocultos são desproporcionalmente usados ​​para fins ilícitos.

Se estiverem certos, as descobertas sugerem que os danos da dark web podem estar se concentrando em países livres que hospedam a infraestrutura, enquanto seus benefícios têm maior probabilidade de proliferar em países repressivos.

Embora seja provável que o estudo seja mais debatido, ele traz algumas conclusões complicadas – e a dark web já era bastante complicada.

“Países ‘livres’ provavelmente estão arcando com um custo social maior em alguma escala (por meio dos danos causados por conteúdos de abuso infantil hospedado, mercados de drogas ilícitas etc.) do que aqueles em regimes não livres que buscam ter acesso a uma ferramenta robusta de aumento do anonimato”, escrevem os pesquisadores.

“Determinar se esses custos maiores são um fardo aceitável de pagar para que outros possam exercer direitos políticos básicos é um debate normativo importante para o qual o presente estudo fornece alguns resultados empíricos modestos”.

Os resultados são relatados no PNAS.

Julio Batista

Julio Batista

Sou Julio Batista, de Praia Grande, São Paulo, nascido em Santos. Professor de História no Ensino Fundamental II. Auxiliar na tradução de artigos científicos para o português brasileiro e colaboro com a divulgação do site e da página no Facebook. Sou formado em História pela Universidade Católica de Santos e em roteiro especializado em Cinema, TV e WebTV e videoclipes pela TecnoPonta. Autodidata e livre pensador, amante das ciências, da filosofia e das artes.