Milhões de pessoas vão observar o Grande Eclipse Americano em 21 de agosto, tirar fotografias e fazer selfies. Aqui no Brasil, o eclipse será visto de forma parcial em alguns lugares nas regiões Norte e Nordeste. Mil anos atrás, o povo Pueblo de Chaco Canyon – um parque histórico nacional da cultura Chaco, onde hoje é o Novo México, capturaram suas experiências de um eclipse solar total esculpindo em uma rocha – um círculo com um looping de flâmulas que se assemelham a atmosfera exterior do Sol, ou coroa.
Esta arte rupestre, ou petróglifo, não só retrata um eclipse solar com uma gigantesca erupção de plasma chamada de ejeção de massa coronal (EMC), suas linhas podem ter evocado uma experiência maravilhosa e inspiradora, disse o astrônomo solar, J. McKim Malville, um professor emérito da Universidade de Colorado Boulder, que é um especialista em arqueoastronomia.
“O petróglifo parece mais celebrador do que assustador”, disse Malville ao LiveScience. “Se nossa interpretação estiver correta, eles tentaram retratar a visão extraordinária da coroa, algo nunca visto antes por eles – eles associaram a coroa com uma divindade que era ainda mais misteriosa e poderosa do que eles imaginavam.”
Malville descobriu o petróglifo em 1992, durante uma excursão científica em Chaco Canyon, no Novo México, com W. James Judge, um professor de antropologia de Fort Lewis College, em Colorado. Eles encontraram o petróglifo juntamente com outras figuras rupestres em uma grande rocha chamada Piedra del Sol, perto das ruínas do Centro Cultural para os Chacoanos, que prosperaram há entre 900 e 1150 d.C. É também em Chaco Canyon que é encontrada uma das mais famosas artes rupestres arqueoastronômicas – um petróglifo retratando, provavelmente, a supernova do Caranguejo que ocorreu em 1054 d.C..
Quando ele viu o petróglifo, Malville imediatamente reconheceu algo familiar.
“Algumas pessoas podem vê-lo como um inseto, um carrapato ou uma aranha”, disse ele. “Mas me pareceu muito semelhante às fotografias e desenhos de ejeções de massa coronal que eu há havia visto.”
Em 2014, Malville e o professor José Vaquero, da Universidade da Extremadura em Cáceres, Espanha, publicou um estudo no Journal of Mediterranean Archaeology e Arqueometria descrevendo a descoberta. Eles sabiam que um eclipse tinha ocorrido na região em 11 de Julho de 1097, e que a coroa e até mesmo EMCs do Sol são visíveis a olho nu durante a totalidade (quando a sombra da Lua bloqueia completamente a luz do sol ao chegar a Terra). Mas eles precisavam de evidências de que o Sol estava em um período de atividade elevado, conhecido como máximo solar, quando tais expulsões são mais comuns. Ela ocorre a cada 11 anos ou mais, com alguma variação na intensidade, disse Malville.
Ele e seu colega consultaram várias fontes para determinar o nível de atividade na época do eclipse. Eles analisaram dados de anéis de árvores antigas, que armazenam os vestígios de carbono atmosférico da fotossíntese e também fornecem um calendário natural de crescimento anual. Durante os períodos de elevada atividade solar, campos magnéticos intensos do Sol desviam os raios cósmicos que atingiriam a Terra, reduzindo a quantidade de carbono radioativo, encontrado como isótopos de carbono-14, em anéis de árvores. No período em torno de 1097, a quantidade de isótopos de carbono-14 era baixa.
Observações a olho nu de manchas solares registradas em antigos textos chineses também indicaram maior atividade solar, assim como dados históricos do norte europeu sobre o número anual das chamadas “noites de auroras.” As evidências apontam para altos níveis de atividade solar durante o eclipse de 1097.
“O Sol estava em um período de muito alta atividade na época, consistente com uma coroa ativa e EMCs”, disse Malville, em comunicado de imprensa.
O símbolo do petróglifo, um círculo com serpentinas radiantes na borda, atingiu Malville como algo jubilante, e não assustador.
Há culturas que consideram eclipses como presságios perigosos e terríveis durante os momentos em que o dia se transforma em “noite”, disse Malville.
Mas nem todas.
Ele lembrou quando observou o eclipse no Quênia em 30 junho de 1972, acampado na margem oriental do Lago Turkana, no meio das tribos Turkana, Samburu e El Molo. Durante o eclipse, os El Molo entraram em suas cabanas, como fazem todas as noites, permanecendo lá até que a luz voltasse; Eles não pareciam influenciado pelo evento, disse ele. Mas as outras tribos chegaram ao acampamento para ver o eclipse.
Este evento em particular durou 7 minutos, um tempo anormalmente longo, e as pessoas lá tiveram a chance de ver a beleza da coroa durante a totalidade. Depois da observação, os tribais dançaram e agradeceram os astrônomos pela chance de observar aquele majestoso evento no céu.
“O brilho da coroa é como o brilho da lua cheia, por isso é facilmente visto a olho nu”, disse Malville. (Lembre-se, nunca olhe diretamente para o Sol ou um eclipse solar sem equipamentos de proteção especiais, mas você pode olhar para o eclipse sem óculos apenas durante os dois minutos de totalidade.)
Malville acredita que o eclipse de 1097 em Chaco Canyon pode ter mexido com o senso de admiração do povo Pueblo. Depois do ano 1100, a tribo construiu 10 casas grandes, chamadas de Grande Casas de Chaco, todas as quais estão em áreas que oferecem vistas espetaculares do nascer ou pôr do Sol nos solstícios de inverno ou verão, disse ele.
“Existe a possibilidade de que a glória dessa experiência para as pessoas que vivem no Chaco em 1097 foi transformada em um aumento da relevância e apreciação do Sol”, disse Malville.
Talvez tenha faltado, para as civilizações mais antigas, apenas um olhar mais profundo através da beleza escondida por trás de um eclipse solar total, ao invés de um olhar assustador. O povo de Chaco Canyon foi privilegiado em poder ter esse senso de admiração e perspectiva cósmica, em uma época de escassez científica.
Traduzido e adaptado de Space.