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Bastam poucos defensores da antivacinação para triplicar as taxas anuais de doenças, diz novo estudo

Basta uma pequena queda nos níveis de vacinação contra sarampo para produzir efeitos negativos desproporcionais na saúde pública e na economia, diz nova pesquisa. Um time de pesquisador da Universidade de Stanford e do Baylor College de Medicina olharam para a saúde pública e o impacto na saúde da recusa à vacinação, “definida como uma demora ou recusa de aceitar a vacinação baseado em crenças pessoais, apesar da disponibilidade [da vacina]”.

Em outras palavras, eles rodaram os números sobre o quanto um punhado de defensores do movimento antivacinação podem custar ao público e os números não são agradáveis.

Usando os casos da vacina combinada contra sarampo, caxumba e rubéola (MMR) e o vírus do sarampo como exemplo de caso, os pesquisadores construíram um modelo de computador para estimar milhares de cenários de crescente recusa à vacinação e como eles afetariam surtos hipotéticos de sarampo.

“Nós focamos no sarampo como exemplo de caso dos efeitos da diminuição na cobertura da vacinação por ser uma doença altamente infecciosa”, diz o pesquisador Nathan Lo da Universidade de Stanford.

“[O Sarampo] provavelmente será a primeira doença infecciosa causando surtos se a vacinação cair”.

Os dados da equipe indicam que uma queda de apenas 5% na cobertura da vacina MMR de crianças entre 2 e 11 anos triplicariam os casos de sarampo nessa faixa de idade. Nos Estados Unidos, isso significaria passar de 48 casos por ano para 150 casos por ano.

Isso pode não parecer muitas crianças doentes, mas o sarampo é uma doença grave, insanamente contagiosa que pode causar complicações sérias ou mesmo fatais. Ainda é uma das causas líderes do mundo em morte de crianças, em sua maioria em países em desenvolvimento sem a adequada cobertura de vacinação.

Antes que tivéssemos um jeito de prevenir o sarampo com vacinação, milhões de crianças morriam todos os anos, um número devastador que tem caído de forma contínua.

“Durante os anos 2000-2015, estima-se que a vacinação contra o sarampo preveniu 20,3 milhões de mortes”, reporta a Organização Mundial de Saúde.

A razão pela qual os níveis gerais de cobertura da vacinação são tão importantes deve-se à forma que as vacinas previnem doenças. Sempre há uma pequena parte da população que não pode ser vacinada por razões médicas (por exemplo, crianças com um sistema imune comprometido), ou são jovens demais (bebês podem ter a primeira dose da vacina MMR apenas quando eles completam um ano de vida). Todos eles são super super vulneráveis à vírus.

Hoje em dia nos Estados Unidos a maioria dos casos de sarampo ocorrem quando as pessoas estão viajando para o exterior e sem querer acabam trazendo a doença de volta. Uma pessoa infectada então se torna o vetor da doença, espalhando-a para quem não está protegido.

Em uma situação ideal, 90-95% da população deveria ser vacinada, e o vírus é incapaz de tomar conta. O que faz aquele pequeno grupo que não pode ser vacinado totalmente dependente das pessoas em volta deles, um princípio chamado de “imunidade coletiva“.

É por isso que é tão crucial que as pessoas não optem por abandonar a vacinação – elas não estão fazendo apenas uma escolha pessoal, elas estão afetando a comunidade delas como um todo. E porque pais hesitantes em vacinar tendem a viver em nódulos, isto é, próximos uns dos outros, isso faz com que o potencial de grandes surtos seja ainda mais provável.

Apenas esse ano, a comunidade de Somália-Americana em Minnesota vivenciou um surto da doença letal que superou todos os casos de sarampo do ano passado dos Estados Unidos, somados.

E não é apenas um argumento de saúde pública. O time liderado pela Universidade de Stanford também rodou alguns números sobre como uma queda na taxa de vacinação MMR custaria em termos monetários.

Em uma estimativa conservadora, os mesmos 5% de queda na vacinação poderiam causar despesas adicionais de U$2,1 milhões para a saúde pública. E os pesquisadores notam que isso não inclui custos pessoais às famílias, perda de produtividade aos pais, custos de hospitalização e outros possíveis impactos econômicos.

“Penso que nosso estudo é um alerta para o que nós podemos esperar nos próximos meses e anos conforme a cobertura da vacinação continua a cair nos 18 estados que agora permitem exceções não-médicas ou de crenças filosóficas”, diz o pesquisador sênior Peter Hotez do Baylor College de Medicina.

O time espera que seus achados cumpram um papel na condução de políticas ao redor dos EUA.

“Esses achados deveriam ter um papel chave em qualquer política adotada por governos estaduais ou nacionais que podem se relacionar com a vacinação na infância”, escrevem eles no artigo.

A pesquisa está disponível em acesso aberto no JAMA Pediatrics. Este texto para a Universo Racionalista é uma tradução, com adaptações e acréscimos, do texto de divulgação da ScienceAlert de 25 de julho de 2017.

Referência

  • LO, N. C.; HOTEZ, P. J. Public Health and Economic Consequences of Vaccine Hesitancy for Measles in the United States. JAMA Pediatrics, 24 jul. 2017. DOI: 10.1001/jamapediatrics.2017.1695
Thomas Conti

Thomas Conti

28 anos, mestre em economia, professor assistente no Insper, docente na Especialização em Direito e Economia (Law & Economics) da Unicamp, consultor, pesquisador, programador em R e doutorando em economia pela Unicamp. Faço hora extra como divulgador científico e defendendo políticas públicas baseadas em evidências.