Por Mike McRae
Publicado na ScienceAlert
Astrofísicos que se propuseram a mapear os blocos de construção da vida no espaço encontraram moléculas precursoras à espreita em nuvens de poeira destinadas a se tornarem futuros sistemas solares.
A descoberta sugere que a Terra pode não ser tão especial, afinal – muitos outros mundos lá fora podem ter o mesmo acesso a compostos formadores de vida que nós.
“O principal resultado deste trabalho mostra que os mesmos ingredientes necessários para semear a vida em nosso planeta também são encontrados ao redor de outras estrelas”, disse a astroquímica da Universidade de Leeds, no Reino Unido, Catherine Walsh, que trabalhou na pesquisa.
“É possível que as moléculas necessárias para dar início à vida nos planetas estejam prontamente disponíveis em todos os ambientes de formação de planetas”.
Apesar de toda a sua esplêndida diversidade, toda a vida na Terra é construída a partir da mesma receita de mistura de moléculas orgânicas e minerais em água morna.
Exatamente como essa sopa química baseada em carbono tomou forma a partir de um pequeno punhado de elementos que incluíam hidrogênio e nitrogênio é um quebra-cabeça que manteve os pesquisadores ocupados por mais de meio século.
Descobertas recentes sugerem que a bioquímica primordial da Terra poderia ter sido iniciada por processos interestelares, e inclusive além, tornando muito tentador prever que a vida deveria ser comum em toda a galáxia.
“No entanto, muitos dos ambientes onde encontramos essas moléculas orgânicas complexas estão bem distantes de onde e de quando pensamos que os planetas se formam”, disse John Ilee, astrofísico da Universidade de Leeds, no Reino Unido, que liderou a pesquisa.
“Queríamos entender mais sobre onde exatamente e em que quantidade essas moléculas estavam presentes nos locais de nascimento dos planetas – os discos protoplanetários”.
Ilee liderou uma equipe de astrofísicos de todo o mundo no mapeamento da localização de um punhado de precursores principais da bioquímica dentro de nuvens distantes de poeira e rocha que eventualmente se estabelecerão em sistemas solares totalmente novos.
É uma daquelas tarefas do tipo ‘mais fácil falar do que fazer’, que consiste em encontrar discos protoplanetários que não são apenas próximos o suficiente para serem analisados, mas angulados de tal forma que todo o seu disco de material giratório pode ser visto em todo o seu esplendor.
Usando o Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA) no deserto do Atacama, no norte do Chile, Ilee e sua equipe detectaram a luz de vários discos protoplanetários em busca das assinaturas espectrais de várias moléculas orgânicas.
Em um estudo, os pesquisadores estudaram a proporção de dois compostos orgânicos significativos, cianeto e cianeto de hidrogênio.
Ironicamente, para tal substância tóxica, o cianeto de hidrogênio é considerado uma fonte primordial de carbono e nitrogênio na química geradora de vida. Medir suas concentrações na nuvem de material ao redor de uma estrela recém-nascida pode ajudar os cientistas a ter uma ideia melhor das interações entre a radiação da estrela e a distribuição deste ingrediente potencialmente importante.
Subindo na cadeia de complexidade, os cientistas também mapearam as distribuições de três moléculas mais pesadas em cinco discos protoplanetários.
Esses compostos – cianoacetileno (HC3N), acetonitrila (CH₃CN) e ciclopropenilideno (c-C3H2) – foram encontrados em nosso Sistema Solar antes, bem como em discos formadores de planetas mais distantes.
O mapeamento de suas densidades e distribuições nos permite dizer com segurança que os reservatórios de matéria orgânica nos sistemas solares emergentes são mais ou menos como os do nosso.
As assinaturas espectrais dessas moléculas precursoras específicas (acima) sugerem que elas tendem a se concentrar nas regiões internas dos discos formadores de planetas. Além do mais, suas abundâncias são até 100 vezes maiores do que as previsões dos modelos atuais.
Colocando de outra forma, aquela mistura de poeira orgânica que criou a vida com apenas uma pitada de água na Terra não é tão especial.
Claro, é preciso mais do que solo fértil para que a vida floresça. Algum tipo de solvente fluido, como água, ajuda. Assim como a trégua da radiação violenta que sopra de uma estrela furiosa próxima.
Mas, considerando quantas estrelas existem somente em nossa galáxia que poderiam abrigar planetas com as condições favoráveis necessárias para promover a química em evolução, é reconfortante saber que sopa provavelmente tem todos os blocos de construção de que precisa para ter uma boa chance de começar a vida.
Esta pesquisa foi aceita para publicação na Astrophysical Journal Supplement Series e está disponível para revisão no servidor de pré-publicação arXiv.