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Buracos Negros

Por Ali Sundermier
Publicado na Symmetry Magazine

Imagine, em algum lugar da galáxia, o cadáver de uma estrela tão densa que perfura o tecido do espaço-tempo. Tão denso que devora qualquer matéria circundante que fique muito perto, puxando-a com uma quantidade de gravidade da qual nada, nem mesmo a luz, pode escapar.

E uma vez que a matéria cruza o ponto sem retorno, o horizonte de eventos, ela espirala sem esperanças em direção a um ponto quase infinitamente pequeno, um ponto em que o espaço-tempo é tão curvado que todas as nossas teorias se quebram: a singularidade. Ninguém sai vivo.

Buracos negros soam muito estranhos para serem reais. Mas eles são bastante comuns no espaço. Há dezenas conhecidos e provavelmente outros milhões na Via Láctea e um bilhão de vezes mais universo a fora. Os cientistas também acreditam que pode haver um buraco negro supermassivo no centro de quase todas as galáxias, inclusive da nossa. Os ingredientes e as dinâmicas dessas aberrações monstruosas do espaço-tempo têm confundido cientistas há séculos.

Arte por Sandbox Studio, Chicago, com Ana Kova.

A história dos buracos negros

Tudo começou na Inglaterra em 1665, quando uma maçã soltou do ramo de uma árvore e caiu no chão. Assistindo de seu jardim em Woolsthorpe Manor, Isaac Newton começou a pensar na queda da maçã: uma linha de pensamento que, duas décadas depois, terminou com sua conclusão de que deveria haver algum tipo de força universal regendo o movimento de maçãs, balas de canhão e até corpos planetários. Ele a chamou de gravidade.

Newton percebeu que qualquer objeto com massa teria uma atração gravitacional. Ele descobriu que, à medida que a massa aumenta, a gravidade aumenta. Para escapar da gravidade de um objeto, você precisaria alcançar sua velocidade de escape. Para escapar da gravidade da Terra, você precisa viajar a uma velocidade de aproximadamente 11 quilômetros por segundo.

Foi a descoberta de Newton das leis da gravidade e do movimento que, 100 anos depois, levaram o Reverendo John Michell, um polêmico britânico, à conclusão de que, se houvesse uma estrela muito mais massiva ou muito mais compacta que o Sol, sua velocidade de escape poderia superar até mesmo a velocidade da luz. Ele chamou esses objetos de “estrelas escuras”. Doze anos depois, o cientista francês e matemático Pierre Simon de Laplace chegou à mesma conclusão e ofereceu provas matemáticas para a existência do que agora conhecemos como buracos negros.

Em 1915, Albert Einstein estabeleceu a teoria revolucionária da relatividade geral, que considerava espaço e tempo como um objeto curvado de quatro dimensões. Ao invés de ver a gravidade como uma força, Einstein viu isso como uma distorção do espaço-tempo em si. Um objeto massivo, como o Sol, criaria um entalhe no espaço-tempo, um poço gravitacional, fazendo com que qualquer objeto circundante, como os planetas em nosso sistema solar, seguisse um caminho curvo ao redor.

Um mês depois que Einstein publicou essa teoria, o físico alemão Karl Schwarzschild descobriu algo fascinante nas equações de Einstein. Schwarzschild encontrou uma solução que levou os cientistas a concluir que uma região do espaço poderia ficar tão distorcida que criaria um poço gravitacional que nenhum objeto poderia escapar.

Até 1967, essas misteriosas regiões do espaço-tempo não receberam um título universal. Os cientistas lançaram termos como “colapsar” ou “estrela congelada” ao discutir as tramas escuras da gravidade inescapável. Em uma conferência em Nova York, o físico John Wheeler popularizou o termo “buraco negro”.

Arte por Sandbox Studio, Chicago, com Ana Kova.

Como encontrar um buraco negro

Durante a formação da estrela, a gravidade comprime a matéria até ser interrompida pela pressão interna da estrela. Se a pressão interna não interromper a compressão, isso pode resultar na formação de um buraco negro.

Alguns buracos negros são formados quando as estrelas massivas colapsam. Outros, acreditam os cientistas, foram formados muito cedo no universo, um bilhão de anos depois do Big Bang.

Não há limites para o quão imenso pode ser um buraco negro, às vezes mais de bilhões de vezes a massa do Sol. De acordo com a relatividade geral, também não há limite para o quão pequeno eles podem ser (embora a mecânica quântica sugira o contrário). Os buracos negros crescem em massa enquanto continuam a devorar a matéria circundante. Pequenos buracos negros roubam a matéria de uma estrela companheira enquanto os maiores se alimentam de qualquer matéria que esteja muito próxima.

Os buracos negros contêm um horizonte de eventos, além do qual nem mesmo a luz pode escapar. Pelo fato de nenhuma luz conseguir sair, é impossível ver além dessa superfície de um buraco negro. Mas só porque você não pode ver um buraco negro, não significa que você não possa detectar um.

Os cientistas podem detectar buracos negros observando o movimento de estrelas e gás nas proximidades, bem como a matéria acrescida dos arredores. Esta matéria gira em torno do buraco negro, criando um disco plano chamado disco de acreção. A matéria que gira perde energia e libera a radiação sob a forma de raios-X e outras radiações eletromagnéticas antes de passar pelo horizonte de eventos.

É assim que os astrônomos identificaram Cygnus X-1 em 1971. Cygnus X-1 foi encontrado como parte de um sistema de estrela binária em que uma estrela extremamente quente e brilhante chamada supergigante azul formou um disco de acreção em torno de um objeto invisível. O sistema de estrela binária estava emitindo raios-X, que geralmente não são produzidos por supergigantes azuis. Ao calcular quão longe e rápido a estrela visível se movia, os astrônomos conseguiram calcular a massa do objeto não visto. Embora tenha sido comprimido em um volume menor que a Terra, a massa do objeto era mais que seis vezes maior que a do nosso Sol.

Vários experimentos diferentes estudam buracos negros. O telescópio Event Horizon examinará os buracos negros no núcleo da nossa galáxia e uma galáxia próxima, M87. Sua resolução é alta o suficiente para gerar fluxo de imagem em torno do horizonte de eventos.

Os cientistas também podem fazer o mapeamento de reverberação, que usa telescópios de raios-X para procurar diferenças horárias entre as emissões de vários locais perto do buraco negro para entender as órbitas de gás e fótons ao redor dele.

O Laser Interferometer Gravitational-Wave Observatory, ou LIGO, procura identificar a fusão de dois buracos negros, que emitem radiação gravitacional, ou ondas gravitacionais, à medida que os dois buracos negros se fundem.

Além dos discos de acreção, os buracos negros também têm ventos e jatos incrivelmente brilhantes que irrompem deles ao longo de seu eixo de rotação, disparando matéria e radiação em quase a velocidade da luz. Os cientistas ainda estão trabalhando para entender como esses jatos se formam.

Arte por Sandbox Studio, Chicago, com Ana Kova.

O que não sabemos

Os cientistas descobriram que os buracos negros não são tão negros como eles pensavam que eram. Algumas informações podem escapar deles. Em 1974, Stephen Hawking publicou resultados que mostraram que os buracos negros devem irradiar energia ou radiação Hawking.

Os pares de matéria-antimatéria são constantemente produzidos em todo o universo, mesmo fora do horizonte de eventos de um buraco negro. A teoria quântica prediz que uma partícula pode ser arrastada antes que o par tenha chance de a aniquilar, e a outra pode escapar sob a forma de radiação Hawking. Isso contradiz a imagem que a relatividade geral cria de um buraco negro de onde nada pode escapar.

Mas como um buraco negro irradia radiação Hawking, ele evapora lentamente até desaparecer. Então, o que acontece com todas as informações codificadas em seu horizonte? Ela desaparece, violando a mecânica quântica? Ou é preservada, como a mecânica quântica prevê? Uma das teorias é que a radiação Hawking contém toda essa informação. Quando o buraco negro evapora e desaparece, já preservou a informação de tudo o que caiu nele, irradiando-a para o universo.

Os buracos negros dão aos cientistas a oportunidade de testar a relatividade geral em campos gravitacionais muito extremos. Eles veem os buracos negros como uma oportunidade para responder a uma das maiores questões na teoria da física de partículas: por que não podemos unir a mecânica quântica com a relatividade geral?

Além do horizonte de eventos, os buracos negros se encaminham para um dos mistérios mais sombrios da física. Os cientistas não podem explicar o que acontece quando os objetos atravessam o horizonte de eventos e a espiralam em direção à singularidade. A relatividade geral e a mecânica quântica colidem e as equações de Einstein explodem no infinito. Os buracos negros podem até abrigar caminhos para outros universos chamados de buracos de minhoca e fontes violentas de energia e matéria chamadas buracos brancos, embora pareça muito improvável que a natureza permita que essas estruturas existam.

Às vezes, a realidade é mais estranha do que a ficção.

Jessica Nunes

Jessica Nunes

Um universo inteiro a ser descoberto por ele mesmo. Apaixonada por astronomia desde pequena e fascinada por exatas desde o berço.