Traduzido por Julio Batista
Original de Tessa Koumoundouros para ScienceAlert
Toda a vida como a conhecemos usa exatamente a mesma molécula transportadora de energia como uma espécie de ‘combustível celular universal’. Agora, a química antiga pode explicar como essa molécula tão importante acabou sendo a ATP (adenosina trifosfato), relatou um novo estudo.
A ATP é uma molécula orgânica, carregada pela fotossíntese ou pela respiração celular (a maneira como os organismos decompõem os alimentos) e usada em cada célula. Todos os dias, reciclamos nosso próprio peso corporal em ATP.
Em ambos os sistemas acima, uma molécula de fosfato é adicionada à ADP (adenosina difosfato) através de uma reação chamada fosforilação – resultando na ATP.
As reações que liberam esse mesmo fosfato (em outro processo chamado hidrólise) fornecem energia química que nossas células usam para inúmeros processos, desde a sinalização cerebral até o movimento e a reprodução.
Como a ATP ascendeu ao domínio metabólico, no lugar de muitos equivalentes possíveis, tem sido um mistério de longa data na biologia e o foco da pesquisa.
“Nossos resultados sugerem… que o surgimento do ATP como o combustível universal de energia da célula não foi o resultado de um ‘acidente isolado'”, mas surgiu de interações únicas de moléculas de fosforilação, explicou o bioquímico evolutivo Nick Lane, do Colégio Universitário de Londres (UCL).
O fato da ATP ser usada por todos os seres vivos sugere que ela existe desde o início da vida e mesmo antes, durante as condições prebióticas que precederam todos nós, matéria animada.
Mas os pesquisadores estão intrigados sobre como isso pode acontecer quando a ATP tem uma estrutura tão complicada que envolve seis reações de fosforilação diferentes e muita energia para criá-la do zero.
“Não há nada particularmente especial sobre as ligações de ‘alta energia’ [fósforo] na ATP”, disse a bioquímica Silvana Pinna, que estava na UCL na época, e colegas em seu paper.
Mas, como a ATP também ajuda a construir a informação genética de nossas células, ela pode ter sido usada para uso de energia por esse outro caminho, observaram.
Pinna e sua equipe suspeitam que algumas outras moléculas devem ter estado envolvidas inicialmente no complicado processo de fosforilação. Então, eles examinaram de perto outra molécula fosforilante, AcP, que ainda é usada por bactérias e arqueias em seu metabolismo de substâncias químicas, incluindo fosfato e tioéster – uma substância química que se acredita ter sido abundante no início da vida.
Na presença de íons de ferro (Fe3+), AcP pode fosforilar ADP em ATP na água. Ao testar a capacidade de outros íons e minerais de catalisar a formação de ATP na água, os pesquisadores não conseguiram replicar isso com outros metais substitutos ou moléculas fosforilantes.
“Foi muito surpreendente descobrir que a reação é tão seletiva – no íon metálico, doador de fosfato e substrato – com moléculas que a vida ainda usa”, disse Pinna.
“O fato disso acontecer melhor na água sob condições amenas e compatíveis com a vida é realmente bastante significativo para a origem da vida”.
Isso sugere que, com AcP, essas reações de armazenamento de energia poderiam ocorrer em condições prebióticas, antes que a vida biológica existisse para acumular e estimular o agora autoperpetuante ciclo de produção de ATP.
Além disso, os experimentos sugerem que a criação de ATP prebiótica provavelmente ocorreu em água doce, onde reações fotoquímicas e erupções vulcânicas, por exemplo, poderiam fornecer a mistura certa de ingredientes, explicou a equipe.
Embora isso não exclua completamente sua ocorrência no mar, sugere que a origem da vida pode ter exigido um forte vínculo com a terra, observaram.
“Nossos resultados sugerem que a ATP se estabeleceu como combustível universal de energia em um mundo prebiótico e monomérico, com base em sua química incomum na água”, escreveram Pinna e colegas.
Além disso, os gradientes de pH em sistemas hidrotermais podem ter criado uma proporção desigual de ATP para ADP, permitindo que a ATP conduza o trabalho mesmo no mundo prebiótico de pequenas moléculas.
“Com o tempo, com o surgimento de catalisadores adequados, a ATP poderia eventualmente substituir AcP como um doador de fosfato onipresente e promover a polimerização de aminoácidos e nucleotídeos para formar RNA, DNA e proteínas”, explicou Lane.
Esta pesquisa foi publicada na PLOS Biology.