Por Ann Gibbons
Publicado na Science
Os neandertais há muito tempo são vistos como brutamontes supermasculinos, pelo menos em comparação com seus primos humanos menos encorpados, com quem competiam por comida, território e companheiros. Mas um novo estudo descobriu que os homens Homo sapiens essencialmente emascularam seus irmãos musculosos quando se acasalaram com mulheres neandertais, há mais de 100 mil anos. Essas uniões fizeram com que os cromossomos Y modernos passassem para as futuras gerações de meninos Neandertais, eventualmente substituindo o cromossomo Y neandertal.
A nova descoberta pode resolver o mistério de uma década de por que os pesquisadores não conseguiram encontrar um cromossomo Y neandertal. Parte do problema era a falta de DNA dos homens: dos doze neandertais cujo DNA foi sequenciado até agora, a maioria é de mulheres, já que o DNA nos fósseis de homens neandertais estava mal preservado ou contaminado com bactérias. “Começamos a nos perguntar se havia algum homem de Neandertal”, brinca Janet Kelso, bióloga computacional do Instituto Max Planck de Antropologia Evolucionária e autora sênior do novo estudo.
Mas em um progresso técnico, o estudante de graduação do Max Planck, Martin Petr, projetou um conjunto de sondas que usam a sequência de DNA de pequenos pedaços dos cromossomos Y dos homens modernos para “pescar” informações e fazer uma vinculação ao DNA dos cromossomos Y dos homens arcaicos. O novo método funciona porque os cromossomos de neandertais e humanos modernos são bem semelhantes; as sondas de DNA também “pescam” informações sobre os poucos pares de bases que ambos diferem.
Os pesquisadores investigaram os cromossomos Y fragmentários de três homens neandertais da Bélgica, Espanha e Rússia que viveram cerca de 38.000 a 53.000 anos atrás, e dois Denisovanos do sexo masculino, primos próximos dos Neandertais que viveram na Caverna Denisova da Sibéria cerca de 46.000 a 130.000 atrás. Quando os pesquisadores sequenciaram o DNA, eles tiveram uma surpresa: o cromossomo Y neandertal “parecia mais com os de humanos modernos ‘do que com os de denisovanos’”, diz Kelso.
Este foi um “quebra-cabeça”, diz Petr, já que estudos anteriores mostraram que o resto do genoma nuclear de Neandertal é uma combinação mais próxima com a dos denisovanos. Isso sugere que os dois grupos divergiram dos humanos modernos há cerca de 600.000 anos. Mas o aparecimento do incomum cromossomo Y é paralelo a outra aquisição genética: restos de neandertais datando de 38.000 a 100.000 anos atrás contêm o DNA mitocondrial herdado pelas mães (mtDNA) advindos da mulher humana moderna, em vez do antigo mtDNA Neandertal encontrado em fósseis anteriores. Nesse caso, uma das primeiras mulheres H. sapiens provavelmente cruzou com um homem de Neandertal há mais de 220.000 anos e seus descendentes carregavam o mtDNA moderno.
O melhor cenário para explicar esse padrão Y é que os primeiros homens modernos acasalaram com mulheres de Neandertal há mais de 100.000 anos, mas menos de 370.000 anos atrás, de acordo com os modelos computacionais da equipe. Seus filhos carregariam o cromossomo Y humano moderno, que é herdado pelo pai. O Y moderno então se espalhou rapidamente através de seus descendentes para as pequenas populações de neandertais na Europa e na Ásia, substituindo o Y neandertal, como relatado pelos pesquisadores hoje na Science. Curiosamente, os companheiros humanos modernos deles não eram ancestrais do H. sapiens de hoje – mas provavelmente eram parte de uma população que migrou cedo para fora da África e depois foi extinta. Traços de DNA Neandertal em humanos vivos foram herdados de um evento separado de miscigenação entre 50.000 e 70.000 anos atrás.
Os pesquisadores não sabem exatamente porquê a substituição aconteceu. A seleção natural pode ter favorecido o cromossomo Y do H. sapiens, porque os neandertais tinham mais mutações deletérias em seus genomas, diz Kelso. Os neandertais tinham populações menores do que os modernos, e populações pequenas tendem a acumular mutações deletérias, especialmente nos cromossomos sexuais X e Y. Os humanos modernos, com suas populações ancestrais maiores e geneticamente diversificadas, podem ter tido uma vantagem genética. Outra possibilidade é que, uma vez que os neandertais herdaram o mtDNA humano moderno, suas células podem ter favorecido a interação com o Y humano moderno, diz o biólogo computacional Adam Siepel, do Laboratório Cold Spring Harbor (EUA), que não fez parte do estudo.
A melhor maneira de testar esse cenário é obter DNA dos primeiros Neandertais para ver se seu cromossomo Y se parecia mais com o de Denisovanos. Enquanto isso, o estudo mostra que a mistura entre humanos modernos e neandertais foi “uma característica definidora da história dos hominídeos”, diz o geneticista populacional Josh Akey, da Universidade de Princeton (EUA), que não fez parte do estudo. Não apenas deu aos humanos modernos o DNA dos neandertais, mas também mudou os neandertais de maneiras fundamentais.