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Como se eles já não fossem estranhos, ratos-toupeiras-pelados têm dialetos baseados na cultura

Por Tessa Koumondouros
Publicado na ScienceAlert

Estamos extremamente felizes em receber os sacos de pele enrugada conhecidos como ratos-toupeira-pelados no grupo de animais com dialetos vocais confirmados. Seus barulhinhos variam de acordo com a origem – assim como falamos com sotaques diferentes.

“Este é um feito surpreendente para um roedor e está em total contraste com a maioria das vocalizações de mamíferos, que são inatas, imutáveis ​​e geneticamente herdadas”, escreveu Rochelle Buffenstein para a Science Magazine.

Outros membros desse grupo de vocalistas altamente qualificados incluem cetáceosmorcegospássaros canoros e, é claro, primatas.

Mas como em tudo em relação a estes ratos-toupeiras-pelados (Heterocephalus glaber) – que tem longa vida, são resistentes a dor e são sequestradores –, a aquisição do dialeto é algo um pouco diferente, dada a sua estrutura social estranhamente semelhante a de insetos. Seu sotaque é coordenado pela rainha de sua colônia.

Os ratos-toupeira-pelados são altamente cooperativos, vivendo em colônias multigeracionais de até 300 indivíduos. A maioria deles são trabalhadores e soldados estéreis, e estão todos sob o controle de uma única rainha reprodutora.

“Essa é uma tarefa enorme para a rainha quando você pensa que ela deve controlar 300 indivíduos”, disse a neurocientista Alison Barker do Centro Max-Delbrück de Medicina Molecular (MDC) em Berlim. “Então eu acho que ter um dialeto comum realmente ajuda nisso.”

Os ratos-toupeira são tagarelas, balbuciando constantemente em voz alta com pelo menos 17 versões distintas de guinchos, chiados e grunhidos. Sua chamada mais comum é um chilreio suave que eles usam como uma saudação. É o que os pesquisadores descrevem como antifonal – o que significa que a chamada convida a uma resposta.

https://youtu.be/qwcEZm19YcA

Barker e seus colegas analisaram mais de 36.000 ligações de 166 animais em sete colônias situadas na Alemanha e na África do Sul. A equipe então treinou um algoritmo para aprender padrões de grunhidos, levando-o a identificar com segurança os indivíduos dentro de qualquer colônia apenas com seus chamados.

Reproduzindo as chamadas de resposta dos ratos-toupeiras-pelados individuais, os pesquisadores testemunharam taxas de resposta muito mais altas às chamadas de sua própria colônia do que as de outras – demonstrando a singularidade do chamado de cada colônia em termos comportamentais.

Os pesquisadores não encontraram características distintivas nas chamadas para indicar a posição, idade ou sexo do rato-toupeira-pelado, mas seu tom parecia depender do tamanho do corpo.

Barker e a equipe, então, criaram filhotes entre as colônias para ver se a chamada específica é mantida através das gerações. Os filhotes desenvolveram vocalizações adultas aos três meses de idade e adotaram com sucesso os vocais de sua colônia atual.

Durante os dois anos de estudo, uma das colônias perdeu duas rainhas. Isso permitiu aos pesquisadores registrar as mudanças dos chamados da colônia durante a transição entre governantes.

“Mostramos que quando a rainha é perdida, o dialeto da colônia se desintegra, então parece que ela é importante não apenas para manter o controle da colônia, mas também manter algumas dos sinais que são necessários para manter a adesão à colônia”, explicou Barker.

Quando um novo governante ascendeu à colônia, seus súditos logo se adaptaram à sua versão do chamado de saudação. Isso mostra que, mesmo quando adultos, os ratos-toupeiras-pelados são capazes de aprender novas versões de vocalizações – demonstrando que sua linguagem é cultural, não genética.

Cada rato-toupeira-pelado tem sua própria voz distinta. (Créditos: Felix Petermann/MDC)

Esses peladões são extremamente territoriais e seu sistema de chamada e resposta de saudação permitiria que reconhecessem invasores instantaneamente, a quem não hesitariam em atacar e matar.

No entanto, independentemente da colônia de onde vieram as chamadas, quando pode escolher, o indivíduo prefere ficar uma sala onde possa ouvir os outros do que ficar sozinho.

Este é o primeiro exemplo de comunicação de informações sociais por meio do som em roedores – criaturas bastante diferentes de outros animais conhecidos por fazer isso.

Tal sugestão de evolução convergente (onde a evolução encontra a mesma solução para um problema entre espécies não diretamente relacionadas) adiciona evidências crescentes de que vocalizações complexas estão altamente interligadas com a complexidade social.

“Esta é uma nova ordem de animais que mostra uma cultura vocal”, disse o neurocientista Gary Lewin, do MDC, explicando que os cérebros de ratos-toupeiras-pelados são muito semelhantes aos cérebros de camundongos bem estudados.

No entanto, algo diferente permite que os ratos-toupeiras-pelados levem sua socialização a um nível diferente. Ele está ansioso para descobrir a fisiologia por trás dessa característica especial.

“Acreditamos que se pudermos descobrir o que torna um cérebro social em um rato-toupeira-pelado, isso nos dará uma visão muito profunda do que torna os humanos sociais”, disse Lewin.

E não seria legal se desvendar os mecanismos biológicos por trás desse bicho pelado pudesse um dia nos permitir entender melhor outras espécies sociais também?

Esta pesquisa foi publicada na Science.

Julio Batista

Julio Batista

Sou Julio Batista, de Praia Grande, São Paulo, nascido em Santos. Professor de História no Ensino Fundamental II. Auxiliar na tradução de artigos científicos para o português brasileiro e colaboro com a divulgação do site e da página no Facebook. Sou formado em História pela Universidade Católica de Santos e em roteiro especializado em Cinema, TV e WebTV e videoclipes pela TecnoPonta. Autodidata e livre pensador, amante das ciências, da filosofia e das artes.