Traduzido por Julio Batista
Original de Michelle Starr para o ScienceAlert
Quando você é apenas uma pequena corda retorcida e flexível de músculos, presas e ossos, suas opções podem ser ligeiramente limitadas quando você se mete em apuros.
É por isso que a cobra-anã (Pseudorabdion longiceps) desenvolveu o que parece ser uma forma única de fugir. Quando o perigo se aproxima, a pequena serpente do sul da Ásia se arremessa para frente rapidamente em um movimento bizarro que acelera sua fuga.
Um novo paper representa a primeira vez que esse comportamento, raramente visto em qualquer animal, foi documentado em cobras.
“Relatamos em detalhes a observação de um novo comportamento de fuga empregado por esta espécie – dar cambalhotas”, escreveu uma equipe de pesquisadores liderada pelo biólogo Evan Seng Huat Quah, da Universidade da Malásia em Sabá.
“Anteriormente, havia apenas relatos anedóticos desse comportamento e esta é a primeira vez que é documentado com imagens e uma descrição detalhada”.
Para um animal que é basicamente um bastão escamoso com uma mordida às vezes venenosa, as cobras têm várias estratégias para escapar da predação de outros animais maiores. Isso inclui camuflagem, fingir-se de morta, fuga, agressão e postura defensiva. Mas cobras menores são especialmente vulneráveis à predação.
A cobra-anã é um animal noturno elusivo que se esconde na serapilheira ou sob troncos durante o dia. Crescendo até 23 centímetros de comprimento, é um lanche perfeito para predadores que são conhecidos por incluir pássaros e outras cobras, por isso tem muito o que enfrentar enquanto faz suas atividades rastejantes.
Atravessando uma estrada montanhosa na Malásia em uma noite de agosto de 2019, os pesquisadores encontraram um desses espécimes. À medida que se aproximavam, a cobra assustada deu um pulo – literalmente – realizando uma série de piruetas enquanto se afastava.
“Ao se aproximar, a cobra se assustou e jogou as pontas de seu corpo em um loop e começou a rolar para tentar escapar. A cobra deu uma cambalhota de aproximadamente 1,5 metros em menos de 5 segundos na estrada. Descendo uma inclinação, a cobra foi capaz de ganhar velocidade e cobrir mais terreno rapidamente”, descreveram os pesquisadores.
Foi a vez dos humanos se assustarem, mas logo se recompuseram: pegaram a cobra, e a colocaram em um terreno plano, onde observaram a cobra repetir o comportamento várias vezes, mostrando que o animal o método de fuga do animal descontroladamente se debatendo não foi simplesmente o resultado de um susto e da gravidade. E eles documentaram, capturando em uma série de imagens que permitiram analisar exatamente como a cobra faz o que faz.
O movimento começa com a cobra puxando seu corpo em forma de S, então lança a metade frontal de seu corpo no ar empurrando sua cauda contra o chão. Todo o corpo da cobra fica no ar; quando a cabeça toca o solo, a cauda vira para a frente, enquanto a cabeça e o pescoço se enrolam para se lançar novamente. Toda a manobra se repete; basicamente, a cobra joga as pontas de seu corpo para a frente umas sobre as outras repetidamente.
Você pode observar esse comportamento em ação no vídeo abaixo, capturado pelos campistas; a fuga em piruetas começa por volta de 1h50.
Não é bem a temível Hoop Snake das lendas da América do Norte… mas ainda assim seria bastante assustador se você não estivesse esperando por isso.
Embora outros animais – incluindo a aranha-roda-dourada (Carparachne aureoflava) e algumas salamandras – rolem para escapar de predadores, sua ação é tipicamente passiva. O animal simplesmente se torna pequeno e roliço, e o ambiente e a gravidade fazem o resto.
A cobra-anã destaca-se por seu talento para o rolamento ativo, no qual o réptil gasta energia para rodar.
O comportamento estranho, disseram os pesquisadores, pode ter uma série de benefícios. Combinado com o rolamento passivo (ou seja, ao fugir descendo de uma colina), o movimento pode ajudar a cobra a se mover mais rapidamente. A súbita onda de movimento também pode servir para distrair e confundir os predadores, enquanto a cobra faz sua elegante fuga. E o contato reduzido do corpo da cobra com o solo pode resultar em uma trilha de cheiro irregular, o que confundiria os predadores noturnos que dependem mais do olfato do que da visão.
As cobras podem ser criaturas bastante enigmáticas, por isso não é inédito que elas tenham maneiras de se locomover que não foram documentadas. Não faz muito tempo que os cientistas registraram cobras usando um método peculiar de “laço” para subir em árvores. Portanto, é provável que esta espécie não seja a única cobra a dar cambalhotas para longe do perigo.
“Meus colegas e eu ficamos entusiasmados quando capturamos com sucesso imagens que documentavam o comportamento de dar cambalhotas nessa espécie”, disse Quah.
“Acreditamos que esse comportamento pode ser mais difundido em outras espécies de pequenas cobras, especialmente membros da subfamília Calamariinae, mas a falta de registros é provavelmente por conta dos desafios na detecção e observação dessas espécies elusivas”.
A pesquisa foi publicada na Biotropica.