Artigo traduzido de CERN. Autor: Harriet Jarlett.
Ouvir uma palestra de um teórico sobre o seu campo pode parecer ouvir um fã de futebol falando sobre seu time do coração.
Tenham eles se apaixonado pela teoria das cordas por causa da excitação de algo novo, como uma vitória da Copa do Mundo, ou perseguido obstinadamente a supersimetria apesar de várias perdas, os teóricos irão amar seus campos enquanto estiverem trabalhando neles, raramente mudando para outras teorias.
Esta busca quase obsessiva significa que os teóricos focam em conhecer os meandros de seu próprio campo.
“O nível de complexidade dos diferentes ramos da física teórica é tal que ninguém pode ser perito em tudo”, diz Gian Giudice, chefe do departamento de teoria, que trabalha na física de partículas e cosmologia.
Isso pode ser crucial para que entendam como os novos desenvolvimentos se encaixam com a história do campo, quem são os grandes jogadores e como eles podem influenciar o seu próprio trabalho.
“Nossas ideias evoluem constantemente à medida que somos confrontados com novos desenvolvimentos teóricos e novos resultados experimentais. É por isso que os físicos teóricos raramente passam toda a carreira trabalhando sobre o mesmo assunto, mas sempre buscam abrir novos caminhos”, explica Giudice.
Meu time é melhor do que o seu
Os mesmos fatores que influenciam o time de futebol que você escolhe apoiar, como onde você vive ou qual é o mais bem sucedido, também desempenham um papel enorme em influenciar os teóricos a seguirem seus campos.
“Assim que eu me mudei para Princeton, nos EUA, a teoria das supercordas explodiu. Como eu havia acabado de me mudar, então era natural que eu trabalhasse com ela, assim como todos em Princeton estavam fazendo”, diz Michelangelo Mangano sobre a forma como ele chegou na teoria das cordas.
Foi semelhante para Wolfgang Lerche, que se tornou um físico teórico em um momento semelhante ao de Mangano.
“Eu me tornei um bolsista no CERN no ano em que a teoria das cordas tornou-se o grande tema. Nós, bolsistas, estavamos sentados juntos, tentando entrar no campo, o auditório estava lotado, e não havia tanta excitação. Todos nós pensamos que seria assim, que iríamos resolver tudo dentro de alguns meses, no máximo um ano. Mas não foi assim que aconteceu”, explica.
Giudice concorda que novas teorias da moda definitivamente influenciam o campo que os teóricos mais jovens irão entrar.
“Sim, modas influenciam as pessoas na escolha do tema que querem trabalhar. Mas a excitação sobre um assunto persiste somente se um importante avanço conceitual for alcançado. Se não, as modas desaparecem. Outras pessoas preferem seguir caminhos que são perperdiculares às modas. Na maior parte do tempo eles atingem um beco sem saída, mas às vezes eles são os únicos que fazem as descobertas.” – Gian Giudice.
Mas Bryan Lynn – professor na Case Western Reserve University, EUA, que deixou a academia para uma carreira em Wall Street e em Londres, antes de retornar a ensinar física teórica – acredita que os mentores, supervisores de doutoramento e professores têm mais influência na moldagem dos jovens físicos, encorajando-os a prosseguir determinados campos e teorias. Ele experimentou a pressão de seu supervisor para não estudar a construção de um modelo, apesar de dizer que ele descreveu como um “belo trabalho de pesquisa”.
“O artigo tinha alguma construção do modelo nele. Então eu fui para o meu supervisor e perguntei sobre isso. Ele disse: ‘Por que você está trabalhando nesse lixo?’ Em seguida, ele basicamente rasgou o meu artigo e jogou fora.”
Inevitavelmente, com tantos campos opostos em uma ciência tão competitiva, muitos teóricos menosprezam outras teorias por serem menos prováveis de serem comprovadas.
“Em uma extremidade do espectro estão as pessoas que especulam chegar a modelos, e isso pode tomar proporções extremas que começam na fronteira da maluquice”, ri Slava Rychkov, teórico do CERN. “Do outro lado, há as pessoas que dedicam suas vidas a cálculos tecnicamente muito difíceis para obter previsões de altíssima precisão.”
“A grande coisa sobre a ciência é que, eventualmente, você começa a alcançar respostas, ou existe um bóson de Higgs ou não existe, você sabe qual das teorias é a melhor. Mas antes de chegar nesse momento, você vai ter essas tribos – algumas pessoas chamam escolas de pensamento – que competem umas contra as outras”, explica John Ellis do Kings College, em Londres, que trabalha no CERN desde 1973.
Esta rivalidade significa que os jovens teóricos muitas vezes se sentem menosprezados por perseguir um campo em detrimento de outro, especialmente se não for moda.
Marcando gols
“Há uma corrida para publicar, especialmente neste campo, pois as pessoas são julgadas pela quantidade e peso de suas publicações de pesquisa”, diz Lerche. “Ter uma ideia realmente boa, ou ter vários delas, é um fator chave para o alcançar uma posição permanente em algum momento.”
Esta natureza competitiva, onde os pesquisadores iniciantes tentam bater uns aos outros para atingir seus objetivos, seja publicando sua ciência ou colocando seu nome em uma nova teoria, não é exclusivo da física teórica. Mas, num campo como este, onde os grupos são pequenos e isolados, pode parecer pessoal.
“Você vê alguns pesquisadores no início da carreira sendo o centro das atenções e contribuindo em pé de igualdade com pesquisadores seniores. Isso acontece mais em um ramo da teoria das cordas ou teorias fundamentais porque não há uma evolução acontecendo agora, há muitas novas técnicas emergentes para eles gravarem seus nomes”, explica Mangano.
Enquanto para alguns o sucesso vem no início de sua carreira, outros dedicam suas vidas ao desafio de desvendar uma teoria.
“Admiro alguns dos teóricos, como aqueles que trabalham com teoria de campo reticulado, eles se prenderam à ela por quarenta anos antes de descobrirem algo, assim como Darwin.”
“Darwin olhou para o quintal todo e mediu a terra. Ele fez medições da terra! E descobriu, quase no fim de sua vida, que minhocas alteram o solo. Isso é ciência, este olhar quase fanático na natureza”, descreve Lynn.