Um novo estudo na Physical Review Letters esclarece os detalhes das trocas de energia em sistemas quânticos bipartidos, proporcionando percepções profundas sobre coerência quântica, efeitos de desfasamento puro e o impacto potencial nas futuras tecnologias quânticas.
Nos sistemas quânticos, o comportamento das partículas e a transferência de energia são regidos por distribuições de probabilidade e funções de onda, adicionando camadas de complexidade à compreensão das trocas de energia.
Explorar as trocas de energia em sistemas quânticos envolve enfrentar as complexidades resultantes da decoerência quântica e as escalas em que os sistemas quânticos operam, o que introduz sensibilidade.
Apesar desses desafios, estudar as trocas de energia em sistemas quânticos é vital para o avanço das tecnologias quânticas e para entender os aspectos fundamentais da mecânica quântica.
Os pesquisadores buscam preencher a lacuna entre previsões teóricas e observações experimentais em óptica quântica e termodinâmica. Ao explorar as trocas de energia em sistemas quânticos bipartidos, o estudo procura fornecer uma estrutura abrangente para compreender a complexa dinâmica envolvida.
“Desde o meu doutorado e o início da minha jornada acadêmica, desenvolvi uma base em óptica quântica experimental, que mantive ao transitar para a teoria. Envolver-me com termodinâmica quântica há dez anos me permitiu trabalhar na interseção entre esses dois campos desde então. Estes resultados representam uma bela concretização desses esforços”, disse a Prof.ª Alexia Auffèves, professora pesquisadora visitante no Centro de Tecnologias Quânticas em Cingapura e coautora do estudo, em entrevista à Phys.org.
Energia unitária e de correlação
Sistemas bipartidos referem-se a sistemas quânticos compostos de duas entidades ou subsistemas distintos, muitas vezes exibindo emaranhamento e superposição quântica. As trocas de energia nesses sistemas, como as estudadas na pesquisa, fornecem percepções importantes sobre a dinâmica quântica.
Nas palavras da Prof.ª Auffèves, a teórica por trás do estudo: “Quando dois sistemas quânticos estão acoplados, mas isolados, podem trocar energia de duas formas: exercendo força um sobre o outro ou emaranhando-se. Nomeamos essas trocas de energia de ‘unitárias’ e de ‘correlação’, respectivamente.”
Essa distinção ressalta a natureza dual das interações energéticas em sistemas bipartidos, com a energia unitária envolvendo forças e a energia de correlação surgindo do emaranhamento.
Compreender a dinâmica desses sistemas é crucial para avançar na mecânica quântica e desenvolver aplicações como a computação quântica. Em particular, os sistemas bipartidos são componentes essenciais em portas quânticas e operações algorítmicas, formando a base para tecnologias quânticas emergentes.
A Prof.ª Auffèves detalha mais o foco da pesquisa: “Estudamos experimental e teoricamente essas trocas de energia, primeiro entre um qubit e um campo de luz e, depois, entre dois campos de luz acoplados por um divisor de feixes.”
Parte 1: emissão espontânea de um qubit
Na primeira parte do estudo, os pesquisadores concentraram-se na emissão espontânea de um qubit, representado por um ponto quântico. Pontos quânticos são semicondutores em escala nanométrica que exibem propriedades quânticas.
Muitas vezes são referidos como um átomo artificial, pois, assim como os átomos, possuem níveis de energia discretos. O ponto quântico foi colocado em um reservatório de modos eletromagnéticos vazios, significando que não havia perturbações ou interações com campos eletromagnéticos.
“Resultados teóricos anteriores obtidos pelo meu grupo preveem que a quantidade de energia unitária transferida para o campo do vácuo deve ser proporcional à coerência quântica inicial do qubit”, explicou a Prof.ª Auffèves.
Simplificando, quando o qubit é inicialmente preparado numa superposição equilibrada de estados fundamental e excitado, a transferência de energia unitária para o campo do vácuo é maximizada.
Nesse cenário, a energia unitária transferida é igual à metade da energia total liberada pelo qubit. Por outro lado, se o qubit está inicialmente invertido, somente a energia de correlação é transferida para o campo. Essa dependência do estado quântico inicial do qubit destaca a natureza complexa das transferências de energia em sistemas quânticos.
Os resultados da primeira parte foram exatamente o que os pesquisadores esperavam. Como destacou a Prof.ª Auffèves: “Os experimentos relatados no artigo correspondem perfeitamente às nossas expectativas. Eles envolvem um ponto quântico acoplado a uma microcavidade semicondutora com vazamentos, atuando como um qubit.”
“A energia unitária recebida pelo campo, isto é, a energia contida no componente coerente do campo emitido, é medida usando uma configuração homódina. O nível de controle experimental é tal que a energia unitária quase atinge o limite teórico, independentemente do estado inicial do ponto quântico.”
Isso significa que a equipe conseguiu medir e entender precisamente como o campo quântico troca energia durante esse processo.
Parte 2: acoplamento de dois campos de luz
Para a segunda parte, os pesquisadores examinaram as trocas de energia entre o campo de luz emitido e um campo coerente de referência. Ambos os campos foram acoplados usando um divisor de feixes, um dispositivo comum em óptica quântica para manipular trajetórias de feixes de luz.
O estudo envolveu um sistema quântico que remete à computação quântica fotônica linear, incorporando interferências de campos de luz através de divisores de feixe.
“Diferentemente do primeiro caso, este estudo foi um território inexplorado. Isso desencadeou um diálogo empolgante entre teoria e experimento para expandir nossos conceitos de energias unitária e de correlação para essa nova situação e estudar novos comportamentos e padrões”, disse a Prof.ª Auffèves.
A análise quantitativa revelou uma descoberta significativa: as transferências de energia unitária dependiam da pureza e coerência do campo emitido. Isso implica que as características do campo de luz, especialmente sua pureza e coerência, desempenham um papel crucial na determinação da natureza e magnitude das trocas de energia unitária.
“Em ambos os casos, descobrimos que a energia unitária (respectivamente, energia de correlação) recebida por um campo de luz é igual à mudança de energia do componente coerente (respectivamente, incoerente) desse campo”, explicou a Prof.ª Auffèves.
Aplicações quânticas e além
“A estrutura que começamos a construir neste artigo pode desempenhar um papel-chave nas futuras análises energéticas da computação quântica fotônica”, disse a Prof.ª Auffèves.
Compreender as trocas de energia e entropia é crucial para aprimorar processos como a geração de emaranhamento e portas quânticas. Gerenciar o desfasamento puro em temperaturas mais altas, conforme revelado no estudo, torna-se essencial para a troca eficiente de energia unitária, necessária para implementar portas quânticas.
Em relação a pesquisas futuras, a Prof.ª Auffèves quer se concentrar no lado fundamental das coisas, explorando a óptica quântica com ferramentas energéticas e entrópicas.
“Por exemplo, identificando assinaturas ópticas de irreversibilidade ou, inversamente, detectando a natureza quântica de um campo com critérios energéticos de mérito. Do ponto de vista prático, será importante avaliar se e como os conceitos de energia unitária e de correlação impactam o custo energético das tecnologias quânticas macroscópicas e integradas”, concluiu.
O artigo foi publicado originalmente por Tejasri Gururaj na Phys.org.