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Existem canais de comunicação óptica em nossos cérebros?

Créditos: 123rf.

Por Emerging Technology from the arXiv
Publicado no MIT Technology Review

Uma questão interessante: existem canais de comunicação óptica no cérebro? Isso poderia ser uma insinuação radical, mas uma insinuação com mais do que pequenas evidências e que vale a pena seguirmos a partir delas.

Muitos organismos produzem luz para se comunicar, atrair companheiros e assim por diante. Há vinte anos, os biólogos descobriram que os cérebros de ratos também produzem fótons em certas circunstâncias. A luz é fraca e difícil de detectar, mas os neurocientistas ficaram surpresos ao encontrá-la.

Desde então, o número de evidências cresceu. Os chamados biofótons parecem ser produzidos naturalmente no cérebro e em outros lugares pela decomposição de certas espécies moleculares agitadas eletronicamente. Os cérebros de mamíferos produzem biofótons com um comprimento de onda entre 200 e 1.300 nanômetros, ou seja, do próximo do infravermelho ao ultravioleta.

Se as células do cérebro naturalmente produzem biofótons, é natural perguntar se a natureza pode ter aproveitado esse processo para transmitir informações. Para que isso aconteça, os fótons devem ser transmitidos de um lugar para outro, e isso requer algum tipo de guia de ondas, como uma fibra óptica. Então, que estrutura biológica poderia desempenhar essa função?

Hoje, obtemos uma resposta do tipo graças ao trabalho de Parisa Zarkeshian na Universidade de Calgary no Canadá e alguns colegas. Eles estudaram as características ópticas dos axônios, as partes longas de células nervosas, e concluíram que a transmissão de fótons em distâncias de centímetros parece ser totalmente possível dentro do cérebro.

O trabalho é uma revisão de experimentos anteriores e estudos sobre axônios. A equipe primeiro analisou um estudo que calculou as propriedades ópticas dos axônios mielinizados ao resolver as famosas equações eletromagnéticas de Maxwell em três dimensões para determinar as propriedades ópticas da célula.

Este estudo sugere que o revestimento externo do axônio – sua bainha de mielina – pode agir como um guia de ondas para canalizar os biofótons. Mas também sugere que uma ampla gama de fatores podem influenciar esse fenômeno pela dispersão ou absorção da luz.

Esses fatores incluem como a transmissão de luz é afetada por curvas no axônio, por mudanças no raio da bainha, por cortes transversais não-circulares, e assim por diante.

Zarkeshian e sua equipe concluíram que axônios com comprimentos de cerca de 2 milímetros – o mesmo comprimento dos axônios no cérebro – poderiam transmitir entre 46% e 96% dos biofótons que entram nele. “Vale a pena notar que os fótons podem se propagar em ambas as direções: do terminal axônico até a protuberância do axônio ou na direção oposta, ao longo do axônio.”

A equipe continua calculando o nível de comunicação de dados que isso permite. Os biólogos avaliaram os biofótons produzidos por cérebros de ratos em uma taxa de um fóton por neurônio por minuto. Embora isso não pareça muito, existem 10¹¹ neurônios em um cérebro humano, o que sugere que poderia produzir mais de um bilhão de fótons por segundo.

“Este mecanismo parece ser suficiente para facilitar a transmissão de um grande número de informações, ou mesmo permitir a criação de uma grande quantidade de emaranhamento quântico”, diz Zarkeshian e sua equipe.

Claro, existem inúmeras incertezas nesses cálculos. Ninguém conhece as propriedades ópticas precisas das bainhas de mielina, por exemplo, porque nunca foram medidas.

A melhor maneira de descobrir mais é testar as propriedades de transmissão óptica do tecido cerebral. Zarkeshian e sua equipe sugerem uma série de experiências diretas que traria progresso para essa área. “Uma maneira é iluminar uma extremidade de uma fatia de cérebro fino e procurar os pontos brilhantes relacionados às extremidades abertas dos axônios mielinizados na outra extremidade”, disseram. Existem várias outras abordagens também. Isso é algo que um neurocientista com tempo em suas mãos poderia trabalhar.

Tudo isso aponta para um enigma maior. Se nossos cérebros possuírem canais de comunicação óptica, para que servem? Esta é uma questão que está amadurecendo para uma especulação mais ousada.

Uma linha de pensamento baseia-se no fato de que os fótons são bons portadores da informação quântica. Muitas pessoas teorizaram que os processos quânticos podem estar por trás de alguns dos sistemas mais misteriosos do cérebro, entre os quais a própria consciência em questão. Zarkeshian e sua equipe estão claramente intrigados com essa ideia.

Mas isso não passa de especulações apressadas. A comunicação quântica requer significativamente mais do que os canais de comunicação óptica. Também devem haver mecanismos que possam codificar, receber e processar informações quânticas. É possível que moléculas sensíveis à luz existam no cérebro, mas há pouca evidência para isso e ainda menos de que elas servem como processadores quânticos.

Ainda assim, esse tipo de pensamento é eletrizante e vale a pena perseguir em um nível básico. Se a natureza produz biofótons, a evolução pode ter encontrado uma maneira de explorá-los. A questão é “como?”.

Referência: arxiv.org/abs/1708.08887: “Are There Optical Communication Channels in the Brain?”

Julio Batista

Julio Batista

Sou Julio Batista, de Praia Grande, São Paulo, nascido em Santos. Professor de História no Ensino Fundamental II. Auxiliar na tradução de artigos científicos para o português brasileiro e colaboro com a divulgação do site e da página no Facebook. Sou formado em História pela Universidade Católica de Santos e em roteiro especializado em Cinema, TV e WebTV e videoclipes pela TecnoPonta. Autodidata e livre pensador, amante das ciências, da filosofia e das artes.