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Ferramentas de pedra mais antigas já encontradas não foram feitas pelo gênero Homo, sugere estudo

Traduzido por Julio Batista
Original de Clare Watson para o ScienceAlert

Arqueólogos revelaram o que poderiam ser as ferramentas de pedra mais antigas já encontradas, e eles acham que alguém que não seja nossos ancestrais Homo mais próximos pode tê-las feito.

Desenterradas em 2016 em Nyayanga, no Quênia, às margens do Lago Vitória, as antigas ferramentas se encaixam no design das ferramentas Olduvaienses, nome dado aos primeiros tipos de ferramentas de pedra feitas por mãos humanas.

De acordo com estimativas de datação, as ferramentas recém-descobertas foram feitas entre 2,6 e 3 milhões de anos atrás, antes de serem enterradas por eras em lodo e areia. No total, 330 artefatos foram encontrados entre 1.776 ossos de animais fossilizados que apresentavam sinais de abate.

Antes disso, as mais antigas ferramentas Olduvaienses conhecidas datavam de 2,6 milhões de anos atrás.

Embora a idade das ferramentas recém-descobertas possa ser ainda mais refinada, sua criação coincide com uma época em que os ancestrais do Homo sapiens vagavam ao lado de outros ancestrais humanos primitivos, sinalizando um enorme marco tecnológico para seus criadores – quem quer que tenham sido.

“Com essas ferramentas, você pode esmagar melhor do que o molar de um elefante e cortar melhor do que o canino de um leão”, disse Rick Potts, paleoantropólogo do Museu Nacional de História Natural do Instituto Smithsonian, que fez parte do estudo.

“A tecnologia Olduvaiense foi como desenvolver repentinamente um novo conjunto de dentes fora do corpo e  possibilitou uma nova variedade de alimentos na savana africana para nossos ancestrais.”

Pedras-de-martelo e lascas afiadas retiradas de núcleos de rochas foram escavadas junto com fragmentos de costelas, canelas e ossos escapulares de mamíferos ruminantes com cascos chamados bovídeos (como antílopes) e hipopótamos.

Três das lascas e núcleos de rocha encontrados no Quênia. (Créditos: Plummer et al., Science, 2023)

Como você pode ver nas imagens abaixo, os ossos têm marcas de cortes profundos onde os fabricantes de ferramentas cortaram a carne do osso. As evidências sugerem que eles até esmagaram alguns ossos para extrair a medula óssea e usaram as ferramentas para triturar material vegetal.

Essas ferramentas eram tão eficazes que a tecnologia se espalharia pela África ao longo dos milênios. Sítios Olduvaienses mais recentes, datados de 2 milhões de anos, foram encontrados do norte ao sul da África, tanto em habitats gramados quanto arborizados.

Fragmentos de tíbia de hipopótamo (A), costela (B) e ossos bovídeos (C,D) mostrando marcas de corte. (Créditos: Plummer et al., Science, 2023)

Mas até agora, os primeiros Sítios Olduvaienses estavam confinados ao Triângulo de Afar, na Etiópia, em duas localidades distantes em cerca de 50 quilômetros.

O sítio de Nyayanga expande o alcance geográfico conhecido das primeiras ferramentas Olduvaienses em mais de 1.300 quilômetros a sudoeste. Também empurra seu surgimento para cerca de 2,9 milhões de anos atrás no tempo, um resultado que os pesquisadores produziram depois de reduzir suas estimativas de idade usando uma combinação de técnicas de datação.

“O que é realmente interessante é que aqui neste local você tem algumas das evidências mais antigas da matança da megafauna, mesmo antes do advento do uso do fogo”, disse Julien Louys, do Centro de Pesquisa Australiano para Evolução Humana da Universidade Griffith.

Isso não é tudo. Junto com os ossos e ferramentas, a equipe, liderada pelo antropólogo Thomas Plummer, da Universidade da Cidade de Nova York, EUA, encontrou dois dentes – um molar superior e inferior esquerdo, um fraturado ao meio, o outro quase completo – que os pesquisadores identificaram como Paranthropus, um primo distante dos humanos.

A análise de isótopos de carbono do esmalte do dente molar sugeriu que os primeiros ancestrais humanos de onde eles vieram comiam muitos alimentos vegetais, além de devorar carne retirada de carcaças de animais.

Um dos dentes foi encontrado em estreita associação com os artefatos Olduvaienses, levando os pesquisadores a sugerir que talvez esses hominídeos tenham feito ou pelo menos estivessem usando as ferramentas de pedra, não nossos ancestrais mais diretos do gênero Homo.

Os dois dentes molares. (Créditos: Plummer et al., Science, 2023)

As ferramentas Olduvaienses são frequentemente atribuídas ao gênero Homo, mas a existência sobreposta de outros hominídeos, como Paranthropus e agora esses dois dentes, sugere que o Homo não foi o único a dominar a fabricação de ferramentas que os ajudaram a expandir suas dietas.

Claro, os verdadeiros fabricantes dessas ferramentas nunca serão conhecidos, com quaisquer reivindicações sobre a identidade de seus criadores provavelmente estando sob intenso debate alimentado por outros cientistas ou novas descobertas.

“A suposição entre os pesquisadores há muito tempo é que apenas o gênero Homo, ao qual pertencem os humanos, era capaz de fazer ferramentas de pedra”, disse Potts. “Mas encontrar Paranthropus ao lado dessas ferramentas de pedra abre um mistério fascinante.”

A pesquisa foi publicada na Science.

Julio Batista

Julio Batista

Sou Julio Batista, de Praia Grande, São Paulo, nascido em Santos. Professor de História no Ensino Fundamental II. Auxiliar na tradução de artigos científicos para o português brasileiro e colaboro com a divulgação do site e da página no Facebook. Sou formado em História pela Universidade Católica de Santos e em roteiro especializado em Cinema, TV e WebTV e videoclipes pela TecnoPonta. Autodidata e livre pensador, amante das ciências, da filosofia e das artes.