A maior lua de Júpiter, Ganimedes, possui um campo magnético surpreendentemente intenso para o seu tamanho. Efeitos de maré de Júpiter esticam e comprimem continuamente a lua, mantendo seu núcleo aquecido e alimentando o campo magnético. Contudo, os processos geológicos exatos que ocorrem dentro do núcleo ainda não são completamente compreendidos.
Agora, um novo estudo experimental testou um dos principais modelos de dinâmica do núcleo: a formação da “neve de ferro” cristalizada.
A teoria da neve de ferro é como um modelo geológico-meteorológico para um núcleo planetário: ela descreve como o ferro esfria e cristaliza perto da borda superior do núcleo (onde se encontra com o manto), caindo em seguida para o centro líquido do planeta e derretendo novamente.
O núcleo de Ganimedes, portanto, é um globo de neve metálico em fusão, agitado pela gravidade de Júpiter.
Esse ciclo de subida e descida do ferro “gera movimentos no núcleo líquido e fornece energia para a geração de um campo magnético”, escrevem os pesquisadores responsáveis pelo estudo. “No entanto, aspectos-chave desta dinâmica permanecem amplamente desconhecidos.”
Assim, eles desenvolveram um experimento para testar alguns desses aspectos.
Claro, os cientistas não podem simplesmente observar o interior de um núcleo planetário, então a equipe utilizou gelo de água como análogo aos cristais de neve de ferro em laboratório.
O experimento consistiu em um tanque de água resfriado de baixo para cima. Uma camada salgada de água no fundo do tanque representava o manto planetário (e, na prática, evitava que os cristais de gelo grudassem no fundo). Sobre a salmoura, havia uma camada de água doce, representando o núcleo líquido do planeta. Cristais de gelo se formaram perto do fundo do tanque, onde a água salgada e doce se misturavam, subindo em seguida e derretendo no líquido mais quente acima.
Ou seja, o experimento foi uma simulação invertida da neve de ferro, com os flocos de neve subindo ao invés de descer.
Essa configuração permitiu à equipe testar o comportamento dos cristais e seu efeito sobre o sistema como um todo.
Os resultados foram surpreendentes. Em vez de um fluxo contínuo de cristalização, ascensão e derretimento, houve surtos esporádicos de atividade intensa, seguidos por períodos de inatividade.
Por quê?
Parece que, para iniciar o processo de cristalização, o líquido precisa atingir um estado super-resfriado, abaixo da temperatura na qual normalmente se esperaria a solidificação do gelo.
Uma vez alcançada essa temperatura super-resfriada, uma avalanche de flocos de neve é liberada, pausando até que a temperatura fique novamente baixa o suficiente para desencadear uma nova onda de cristais.
Esse processo esporádico e cíclico tem implicações significativas para os campos magnéticos de um planeta. A neve de ferro em Ganimedes ocorreria de forma intermitente e em diferentes locais do núcleo. O resultado seria um campo magnético flutuante e dinâmico, que se fortalece, enfraquece e muda de forma ao longo do tempo.
Ganimedes não é o único lugar do Sistema Solar onde a neve de ferro domina o comportamento dos núcleos planetários. É uma descrição plausível do comportamento do núcleo em todos os pequenos corpos planetários, incluindo a nossa própria Lua, Mercúrio, bem como Marte e grandes asteroides metálicos.
Nos casos em que campos magnéticos são conhecidos por existir (como em Mercúrio e Ganimedes), isso nos aproxima um passo da compreensão das dinâmicas desses sistemas.
Se estiver se perguntando, acredita-se que o núcleo da Terra não é dominado pela neve de ferro. A intensa pressão gravitacional no coração do nosso planeta, juntamente com uma composição diferente de materiais, faz com que os metais no núcleo da Terra tendam a solidificar no centro e depois derretam à medida que se movem para fora, ao invés de “nevar” a partir do manto (embora ambos os processos possam ocorrer em alguma medida, conforme indicam pesquisas recentes).
O artigo foi publicado originalmente por Alan Johnston no Universe Today.