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Gravuras de 8.000 anos podem ser os exemplos mais antigos de planos de construção

Traduzido por Julio Batista
Original de Carly Cassella para o ScienceAlert

Arqueólogos descreveram o que poderiam ser os exemplos mais antigos de planos de construção na história da humanidade, esculpidos em pedras antigas na Jordânia e na Arábia Saudita entre 7.000 e 8.000 anos atrás.

Padrões geométricos gravados foram combinados com megaestruturas vizinhas do deserto construídas muito antes das pirâmides de Gizé, levando uma equipe internacional de pesquisadores a concluir que representam algum tipo de projeto inicial que orienta sua criação.

Do ponto de vista de um avião ou satélite que passa, as enormes e antigas construções de pedra formam formas discerníveis que utilizam partes da paisagem natural. Aquelas em forma de flecha são conhecidos como ‘pipas’, e os arqueólogos suspeitam que representem enormes armadilhas de caça, projetadas para afunilar rebanhos selvagens em recintos ou até mesmo em penhascos.

Exemplos de pipas do deserto encontrados no deserto da Arábia Saudita. (Créditos: KLDAP)

Graças a uma análise recente de antigas gravuras em pedra, agora temos uma compreensão mais clara do processo de design por trás dessas pipas.

“É notável a extrema precisão dessas gravuras, representando gigantescas estruturas de pedra neolíticas vizinhas, cujo desenho é impossível de capturar sem vê-lo do ar ou sem ser seu arquiteto (ou usuário, ou construtor)”, escreveu Rémy Crassard – um arqueólogo do Centro Nacional Francês de Pesquisa Científica (CNRS) – e seus colegas na Arábia Saudita e na Jordânia.

“Eles revelam uma atividade de grande trabalho mental amplamente subestimada da percepção do espaço, até então nunca observada com este nível de precisão em um contexto tão inicial”.

Os planos encontrados na Arábia Saudita em 2015 cobrem uma laje de pedra medindo pouco menos de 4 metros de comprimento e provavelmente foram esculpidos com picaretas há cerca de 8.000 anos. Eles retratam um par de pipas do deserto próximas separadas por 3,5 quilômetros.

As gravuras encontradas na Jordânia, por sua vez, foram esculpidas em um bloco de calcário de 80 centímetros de comprimento há cerca de 7.000 anos. Essas gravuras retratam uma pipa de forma semelhante às oito pipas do deserto encontradas na região próxima.

A pedra gravada da Jordânia. (Créditos: Crassard et al., PLOS ONE, 2023)

Apesar de seu tamanho enorme, as pipas do deserto só se tornaram conhecidas pelos acadêmicos modernos na década de 1920, quando os pilotos da força aérea britânica as avistaram enquanto voavam acima. Desde então, mais de 6.000 foram registradas, espalhando-se pelo Oriente Médio e partes da Ásia Central.

Essas vastas megaestruturas têm quase o dobro da idade das Grandes Pirâmides de Gizé e, no entanto, receberam apenas uma fração da atenção. As estruturas de pedra foram desenterradas em 2015 e, no entanto, os cientistas só agora as analisaram adequadamente.

“Até recentemente”, escreveram os pesquisadores, “quase nenhum estudo aprofundado havia sido realizado para melhorar nossa compreensão de sua função… ou por que elas eram tão difundidas em muitas regiões, desde a Arábia até o Uzbequistão”.

Ilustração das gravuras encontradas na rocha na Arábia Saudita. Tradução da imagem: gravuras legíveis (legible engraving), gravuras incertas/reconstituição (unclear engraving/reconstituition), rocha talhada (rock break), encosta talhada (slope break) e linhas isoladas de 5 mm (5mm isolines). (Créditos: Crassard et al., PLOS ONE, 2023)

Infelizmente, com pesquisas tão limitadas, seu papel na sociedade antiga ainda não está claro, embora haja uma forte hipótese principal que sugere que as pipas do deserto foram projetadas para capturar ou matar animais selvagens usando estratégias de caça em massa.

A mais antiga foi construída há pelo menos 9.000 anos. Naquela época, a Península Arábica era muito mais úmida e verde do que é hoje. Muitas pipas do ‘deserto’ ficavam no que antes eram pastagens, uma base útil para encurralar rebanhos pastando.

As sofisticadas megaestruturas também tendem a formar canais que conduzem a poços, penhascos ou currais.

A pedra gravada de pipas do deserto encontrada na Arábia Saudita. (Créditos: Crassard et al., PLOS ONE, 2023)

Encontrar plantas de construção gravadas para pipas do deserto, que são as primeiras megaestruturas construídas em pedra, é semelhante a encontrar plantas de construção para as pirâmides.

Os planos de construção da Jordânia são excepcionalmente precisos e claros de se ver. Eles são desenhados em escala, exceto pelos buracos nas pontas das pipas, que são exagerados em tamanho. Desenhar as fossas maiores pode ter facilitado sua observação, ou talvez elas tenham sido ampliadas para enfatizar seu importante papel nas operações de caça.

Modelo 3D (C) da gravura e desenho da pipa do deserto da Jordânia (D). (Créditos: Crassard et al., PLOS ONE, 2023)

“Planos de construção comparáveis, pelo menos destinados a serem em escala, só podem ser encontrados muito mais tarde, durante o terceiro e segundo milênios a.C., na Mesopotâmia”, escreveram Crassard e seus colegas.

Além do mais, esses exemplos de mapas antigos não são tão precisos quanto as gravuras de pipas encontradas na Arábia Saudita e na Jordânia.

Até mesmo o melhor topógrafo de hoje teria “dificuldades para produzir um esboço de uma pipa tão geometricamente confiável quanto as gravuras” sem ferramentas de mapeamento modernas, sugeriram os pesquisadores.

“Parece, portanto, que os caçadores de pipas do deserto sabiam usar uma técnica de levantamento, ainda desconhecida para nós, envolvendo noções de medição e até cálculo.”

Há ainda mais mistérios por trás das pipas do deserto do que pensávamos.

O estudo foi publicado no PLOS ONE.

Julio Batista

Julio Batista

Sou Julio Batista, de Praia Grande, São Paulo, nascido em Santos. Professor de História no Ensino Fundamental II. Auxiliar na tradução de artigos científicos para o português brasileiro e colaboro com a divulgação do site e da página no Facebook. Sou formado em História pela Universidade Católica de Santos e em roteiro especializado em Cinema, TV e WebTV e videoclipes pela TecnoPonta. Autodidata e livre pensador, amante das ciências, da filosofia e das artes.