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Humanos na Índia podem ter sobrevivido à supererupção há 74.000 anos

Por Michael Price
Publicado na Science

Quando o monte em Toba entrou em erupção na ilha indonésia de Sumatra, há 74.000 anos, cinzas caíram como neve no subcontinente indiano, inclusive onde viviam humanos que produziam ferramentas a partir da lapidação de lascas de pedra em instrumentos de corte afiados. O debate sobre a identidade desses artesãos – e se um “inverno vulcânico” catastrófico os exterminou – dura décadas, porque resulta em implicações de quando nossa espécie saiu da África. Um novo estudo sobre essas ferramentas, porém, sugere que os humanos não apenas sobreviveram à erupção, mas prosperaram por outros 50.000 anos. Outros, no entanto, dizem que não há evidências suficientes de que essas ferramentas foram feitas pelos Homo sapiens.

Os pesquisadores podem ter encontrado “uma onda migratória inicial dos humanos modernos… ou de outro tipo de humano primitivo”, diz Martin Richards, arqueogeneticista da Universidade de Huddersfield, Queensgate (Inglaterra), que não esteve envolvido no trabalho.

Alguns cientistas argumentavam que a enorme nuvem de cinzas da erupção do monte em Toba teria parcialmente apagado o Sol, provocando uma queda nas temperaturas globais e ameaçando a sobrevivência de inúmeras espécies, inclusive a nossa.

Em 2007, porém, antropólogos encontraram evidências de ferramentas de pedra no sul da Índia que datavam de antes e depois da erupção, sugerindo que o evento pode não ter sido tão devastador quanto se pensava anteriormente. Mas os críticos disseram que não está claro se as ferramentas foram feitas por nossa espécie ou por outro humano arcaico, como neandertais ou denisovanos.

No novo estudo, a equipe de 2007 retornou ao subcontinente, a um local conhecido como Dhaba, no centro da Índia, nas margens do rio Son. Os pesquisadores descobriram milhares de ferramentas de lascas de pedra usadas para cortar e raspar.

A maioria das ferramentas nas camadas inferiores de sedimentos é consistente com um método de produção específico conhecido como técnica Levallois, que foi usada por humanos modernos e neandertais durante meados da Idade da Pedra, cerca de 250.000 a 25.000 anos atrás. Nas camadas superiores, no entanto, as ferramentas mudam para lâminas de pedra menores e mais complexas que são inquestionavelmente feitas por nossa própria espécie, argumentam os pesquisadores.

Usando uma técnica chamada luminescência opticamente estimulada, que mede elétrons para inferir quando as camadas de sedimentos foram expostas pela última vez à luz, os pesquisadores dataram o local como uma ocupação contínua que se estendeu de 80.000 a 25.000 anos atrás. As datas, combinadas com a fabricação ininterrupta de ferramentas cada vez mais complexas, sugerem que os humanos modernos não só estavam presentes na região quando o vulcão de Toba explodiu, mas também sobreviveram por muitos milhares de anos, relatam os pesquisadores dia 25 de fevereiro na Nature Communications.

As descobertas reforçam argumentos de alguns cientistas, incluindo geocronóloga Kira Westaway, da Universidade Macquarie (Austrália), de que alguns H. sapiens chegaram ao norte da Austrália há cerca de 65.000 anos – embora esses primeiros migrantes aparentemente tenham desaparecido sem deixar vestígios em pessoas vivas. “Este artigo finalmente liga os pontos entre a Índia, o sudeste da Ásia e a Austrália da dispersão humana moderna”, diz Westaway.

O líder da equipe, Michael Petraglia, antropólogo do Instituto Max Planck para a Ciência da História Humana (Munique, Alemanha), sugere que a erupção não foi tão devastadora. “O impacto da erupção de Toba no clima foi superestimado”, concorda Chad Yost, geocientista da Arizona State University, Tempe (Estados Unidos), que não esteve envolvido no trabalho.

Stanley Ambrose, um antropólogo da Universidade de Illinois, na região de Champaign-Urbana (Estados Unidos), e um crítico feroz do estudo de 2007 da equipe, ainda não está convencido. Ele diz que é impossível dizer quais espécies fizeram as ferramentas com base nas evidências apresentadas. Além disso, ele questiona as datas porque a equipe não encontrou uma camada bem definida de cinzas no sedimento, o que teria revelado mais conclusivamente se os fabricantes de ferramentas ocuparam o local durante a erupção.

Richards não duvida das datas da equipe, mas diz que identificar esses fabricantes de ferramentas exigirá fósseis humanos. “Sem eles, não podemos realmente estar confiantes de que estamos falando de humanos modernos [ou] de algum outro hominino arcaico”.

Julio Batista

Julio Batista

Sou Julio Batista, de Praia Grande, São Paulo, nascido em Santos. Professor de História no Ensino Fundamental II. Auxiliar na tradução de artigos científicos para o português brasileiro e colaboro com a divulgação do site e da página no Facebook. Sou formado em História pela Universidade Católica de Santos e em roteiro especializado em Cinema, TV e WebTV e videoclipes pela TecnoPonta. Autodidata e livre pensador, amante das ciências, da filosofia e das artes.