Traduzido por Julio Batista
Original de Matt Williams para o Universe Today
A primeira detecção de ondas gravitacionais por pesquisadores do Observatório de Ondas Gravitacionais por Interferômetro Laser (LIGO, na sigla em inglês) em 2015 desencadeou uma revolução na astronomia. Esse fenômeno consiste em ondulações no espaço-tempo causadas pela fusão de objetos massivos e foi previsto um século antes pela teoria da relatividade geral de Einstein.
Nos próximos anos, esse campo florescente avançará consideravelmente graças à introdução de observatórios de última geração, como a Antena Espacial de Interferômetro Laser (LISA, na sigla em inglês).
Com maior sensibilidade, os astrônomos serão capazes de rastrear eventos de ondas gravitacionais de volta à sua fonte e usá-los para sondar o interior de objetos exóticos e as leis da física. Como parte do ciclo de planejamento da Voyage 2050, a Agência Espacial Europeia (ESA) está considerando temas de missão que poderiam estar prontos até 2050 – incluindo a astronomia de ondas gravitacionais.
Em um paper recente, pesquisadores da Seção de Análise de Missão da ESA e da Universidade de Glasgow, na Escócia, apresentaram um novo conceito que se basearia no LISA – conhecido como LISAmax. Como eles relatam, este observatório poderia potencialmente melhorar a sensibilidade para ondas gravitacionais em duas ordens de magnitude.
A pesquisa foi conduzida pelo físico teórico Dr. Waldemar Martens, analista de Missão do Centro Europeu de Operações Espaciais da ESA (ESOC) em Darmstadt, Alemanha. Ele foi acompanhado pelo engenheiro aeroespacial e astrofísico Michael Khan, também Analista de Missões no ESOC, e pelo astrofísico Dr. Jean-Baptiste Bayle, pesquisador em astronomia e astrofísica da Universidade de Glasgow.
O paper que descreve suas descobertas apareceu online recentemente e está sendo revisado para publicação pela revista Classical and Quantum Gravity.
Desde que foram detectadas pela primeira vez pelos cientistas do LIGO em 2015, os pesquisadores deste e de outros observatórios em todo o mundo refinaram os tipos de eventos de ondas gravitacionais que podem detectar. Isso inclui o Observatório Virgo na Itália (perto de Pisa) e o Detector de Ondas Gravitacionais Kamioka (KAGRA) em Hida, Japão. Desde então, esses observatórios fizeram parceria com o LIGO, formando a Colaboração Ligo-Virgo-KAGRA (LVK).
Os esforços desses e de outros observatórios, além de atualizações que forneceram maior sensibilidade, multiplicaram o número de eventos detectados e até rastrearam alguns de volta às suas fontes.
Como o Dr. Martens disse ao Universe Today por e-mail, esse trabalho pioneiro foi inestimável. Mas, como todas as formas de astronomia, o progresso futuro depende em parte de ter observatórios no espaço:
“Agora que não há dúvida de que as ondas gravitacionais podem ser medidas, os astrônomos querem usá-las como uma fonte adicional de informação onde anteriormente apenas as ondas eletromagnéticas estavam disponíveis.
Detectores terrestres, como LIGO/Virgo/Kagra, são sensíveis na faixa de frequência de dezenas de Hertz a vários quilo-Hertz. Isso os torna sensíveis a fontes como fusões de buracos negros de algumas dezenas de massas solares.
“No entanto, sabe-se que objetos muito maiores, como buracos negros supermassivos (> 10^6 massas solares), existem no centro das galáxias. Fusões desses objetos produzem ondas gravitacionais muito abaixo da FAIXA sensível dos detectores baseados na Terra.
Para vê-las, temos que ir ao espaço e construir um observatório, como o LISA, que teria uma amplitude de 2,5 milhões de quilômetros.”
Até agora, astrônomos detectaram eventos de ondas gravitacionais causados por buracos negros binários ou estrelas de nêutrons binárias (eventos de quilonovas), onde os corpos co-orbitantes eventualmente se fundiram. Também é teorizado que existem muitas outras fontes potenciais, e estudar esses eventos pode avançar nossa compreensão do Universo.
“Entre elas estão as ondas gravitacionais primordiais que foram produzidas durante processos uma fração de segundo após o Big Bang”, disse o Dr. Martens. “Esperamos que a LISA possa detectá-las, mas ainda não está claro. Essa é uma das razões pelas quais detectores com maior sensibilidade e/ou diferentes bandas de frequência são considerados para a Voyage 2050.”
A Voyage 2050 é o mais recente ciclo de planejamento a fazer parte do programa científico da agência, sendo o principal “programa obrigatório” da Agência Espacial Europeia. Todos os Estados membros devem contribuir, e as metas, propostas e financiamento da ciência são selecionados por decisão unânime.
Estes ciclos visam estabelecer um horizonte de financiamento a longo prazo que permita aos Estados membros planejar as suas prioridades com bastante antecedência e dotar a comunidade científica europeia de uma visão clara sobre quais as áreas de investigação que merecem investimento e desenvolvimento.
Desde a década de 1980, o programa é planejado com ciclos de aproximadamente 20 anos, condizentes com o tempo necessário para preparar missões espaciais ambiciosas.
O primeiro ciclo de planejamento (Horizon 2000) foi estabelecido em 1984 e consistiu em decisões que levaram às missões do Observatório Solar e Heliosférico (SOHO), Cluster, Rosetta, XMM-Newton e Herschel de meados da década de 1990 até o início do século XXI. Em 2005, um novo ciclo de planejamento (Cosmic Vision) foi lançado, incluindo propostas de missões que seriam realizadas entre 2015 e 2025.
Isso preparou o caminho para missões como o recém-lançado JUpiter ICy moons Explorer (JUICE) e o observatório de raios-X do Telescópio Avançado para Astrofísica de Alta Energia (ATHENA) e as missões da LISA programadas para serem lançadas na década de 2030.
O ciclo mais recente, Voyage 2050, foi iniciado pela Diretora de Ciência da ESA, Carole Mundell, para selecionar propriedades científicas para acompanhar as missões ATHENA e LISA.
Embora essas missões sejam revolucionárias, especialmente em colaboração, o Dr. Martens e seus colegas propõem maneiras pelas quais a missão LISA pode ser aprimorada ainda mais.
Como ele explicou:
“A ideia básica da LISAmax é detectar ondas gravitacionais em frequências ainda mais baixas do que a LISA conseguiria. Para ser sensível a essas frequências, é preciso aumentar a amplitude do laser do detector.
Amplitudes maiores significam comprimentos de onda maiores e, portanto, frequências mais baixas. As três espaçonaves LISAmax são colocadas perto dos pontos triangulares de Lagrange no sistema Sol-Terra, o que dá ao detector um comprimento de amplitude de 259 milhões de km.
Para efeito de comparação, a amplitude da LISA têm um comprimento de 2,5 milhões de km. Isso torna a LISAmax sensível a ondas gravitacionais na faixa de micro-Hertz e abre uma nova janela para a astronomia de ondas gravitacionais.
“De um modo geral, qualquer fonte que possa ser medida por LISA abaixo de 1 mHz, pode ser medida com LISAmax em uma relação sinal-ruído que é cerca de duas ordens de magnitude melhor.
Um exemplo discutido no paper é a fase inspiral de buracos negros supermassivos binários. Embora q LISA só consiga ver essas fontes pouco antes do evento final da fusão, q LISAmax pode observar esses objetos milhares de anos antes, permitindo assim uma medição muito melhor de certos parâmetros.”
A comunidade científica está investigando esse conceito, que pode ter implicações drásticas para o futuro da astronomia de ondas gravitacionais. Além de expandir a gama de eventos de ondas gravitacionais que podem ser detectados, os observatórios de ondas gravitacionais de próxima geração podem rastrear mais eventos de volta às suas fontes.
Além disso, os astrônomos antecipam que as ondas gravitacionais permitirão que eles explorem as leis da física, sondem o interior de objetos extremos e até ajudaria no estudo de planetas e satélites.
A proposta apresentada pelo Dr. Martens e seus colegas é um dos vários conceitos para ondas gravitacionais submetidos à ESA para o programa Voyage 2050. Esses conceitos incluem um interferômetro baseado no espaço que inspecionaria o céu em busca de ondas gravitacionais na faixa de frequência de milihertz a microhertz (mHz a µ Hz).
Outro propõe como os interferômetros sensíveis a ondas gravitacionais na faixa de mHz podem ser usados para aprender mais sobre a natureza dos buracos negros. Outros mostram como as observações na faixa de decihertz (dHz) podem fornecer o “elo perdido” para a astronomia de ondas gravitacionais, enquanto a astronomia de alto ângulo pode ajudar a rastrear ondas gravitacionais de volta à sua fonte.
A pesquisa sobre a física do Universo primitivo, que inclui o estudo das ondas gravitacionais primordiais, também é um tema importante do programa Voyage 2050 da ESA. Ao examinar as ondas gravitacionais criadas durante a época inflacionária, os cientistas finalmente seriam capazes de sondar a física e a microfísica desse período cósmico inicial.