As mulheres brasileiras estão liderando o ranking mundial de participação na ciência, superando o ranking dos Estados Unidos, Reino Unido e União Europeia. O estudo relatado em Gender in the Global Research Landscape, publicado pela Elsevier, identifica 12 países, dentre os quais estão os Estados Unidos, a União Europeia (contado como um), o Reino Unido, Portugal, Chile, México e Brasil. Utilizando parâmetros como o número de vezes que um artigo científico é citado para a proporção de mulheres entre os autores, o estudo traz novas perspectivas sobre a desigualdade de gênero – e progresso – na academia e nas ciências em geral.
No estudo, o Brasil se destaca pela redução da diferença entre gêneros nas últimas duas décadas. A proporção de mulheres que publicam artigos científicos – que é considerada a principal forma de avaliação da carreira acadêmica – subiu 11% no Brasil nos últimos 20 anos. Hoje, as mulheres brasileiras publicam quase metade dos artigos científicos do país, demonstrando uma igualdade de gênero em um dos campos que historicamente se mostrou fechado para as mulheres.
Entre todos os países estudados, Brasil e Portugal ocuparam o maior lugar na percentagem de mulheres autoras de artigos científicos, com 49% dos artigos científicos sendo escritos por mulheres nos dois países, contrastando com 40% dos Estados Unidos e no Reino Unido, no período de 2011 e 2015 e 41% da União Europeia. A classificação mais baixa no estudo foi do Japão, onde apenas 20% tinham mulheres como autoras.
No Brasil os resultados foram ainda mais robustos, considerando-se que em Portugal as mulheres publicaram 27.561 artigos científicos entre 2011 e 2015, no Brasil, durante o mesmo período, as mulheres foram autoras de quase cinco vezes esse número (153.967 artigos).
Ademais, o Brasil se destaca por ter um aumento significativo da participação das mulheres brasileiras nas ciências ao longo do tempo. No período de 1996 a 2000, apenas 38% dos artigos científicos publicados por brasileiros eram de autoria feminina. Ou seja, apenas a partir de 2000, as mulheres brasileiras alcançaram a igualdade na publicação de artigos junto aos homens.
O Brasil também possui indicadores positivos em relação a inventividade. A proporção de inventoras no Brasil aumentou de 11% para 17% entre 1996 e 2015. Hoje, a proporção de inventoras no Brasil é maior do que nos Estados Unidos (14%), no Reino Unido (12%) ou na União Européia (12%).
Os resultados são notáveis para as pessoas que acompanham o progresso das mulheres nas ciências nos EUA, Reino Unido e União Europeia, e até mesmo Japão. Mas em relação ao Brasil, os resultados são positivos, e até mesmo surpreendentes, para aqueles que se preocupam com a igualdade de gênero no país.
Normalmente, as notícias sobre mulheres no Brasil tendem ser negativas. Nos últimos anos, os movimentos sociais conservadores no Brasil, incluindo aqueles ligados à igreja evangélica, têm conquistado espaço na promoção de uma visão conservadora do que seria o “lugar de uma mulher” (aspas da tradutora). Esses posicionamentos provocaram reações de grupos feministas, como no caso do meme que circulou em resposta a um artigo sobre a “recatada” (e atual) Primeira Dama do Brasil.
Politicamente, nos últimos anos as mulheres perderam terreno no Brasil. A primeira mulher presidente do país sofreu impeachment em setembro. Seu sucessor, o atual presidente Michel Temer, convocou para compor seu gabinete apenas homens brancos, recebendo críticas dos defensores dos direitos das mulheres. Dos 513 representantes do Congresso no Brasil, apenas 53 são mulheres, colocando o Brasil em 115º no ranking global de representação política feminina. Além do mais, uma série de crimes violentos contra as mulheres chamou ainda mais atenção para o status atual das mulheres no país.
O relatório publicado no Gender in the Global Research Landscape oferece otimismo aos que acompanham os direitos das mulheres no Brasil, mas esse otimismo deve ser moderado. Em todos os países analisados, o estudo descobriu que, em comparação com os homens, as mulheres tendem, em média, a ter uma produção acadêmica menor. (Ou seja, em média, as pesquisadoras mulheres publicam menos trabalhos do que os homens).
E, embora em média as mulheres e os homens tendem a ter impactos de citações e downloads semelhantes, no Brasil, os artigos escritos por mulheres ainda são menos frequentemente citados do que os artigos escritos por seus colegas homens. Essa disparidade é semelhante em os outros países latinos – Portugal, Chile e México – presentes no estudo.
Apesar dos sucessos das mulheres brasileiras em publicar artigos científicos, como em outros países, a remuneração desigual ainda é uma questão persistente no Brasil. Em 2013, o Banco Mundial descobriu que no Brasil, a hora de trabalho de uma mulher ainda vale um quarto menos do que a de um homem. Tamara Naiz, presidente da Associação Nacional de Pós-Graduados do Brasil, comentou ao jornal brasileiro Folha de São Paulo: “O resultado deste estudo mostra que, mesmo proveniente de condições desiguais, uma mulher pode desenvolver uma pesquisa tão boa quanto a de um homem”, e acrescenta: “Se somos cientistas tão capazes como os homens, então por que isso não se reflete em igualdade de remuneração e oportunidades iguais?”
Traduzido por Palloma Porto, do site Forbes, artigo Surprising New Study: Brazil Now A Global Leader In Gender Equality In Science.