Vencedor do Prêmio Nobel da Paz, Lech Walesa é uma das figuras icônicas do fim da Guerra Fria com uma vida repleta de ironias. Nasceu na Polônia ocupada pelos nazistas, que logo depois foi liberta pelo comunismo soviético. Comunismo esse que também não durou e, depois de algumas décadas, a libertação do país de seus libertadores levou Walesa à presidência.
Agora ele é o líder da revolução pacífica na Polônia. No entanto, o vencedor do Prêmio Nobel da Paz é vaiado em seu próprio país onde, no mesmo evento, Donald Trump é aplaudido como herói. Parte da razão dessa rejeição remonta a muito tempo: em 1995, como primeiro presidente da era pós-comunista definitiva, ele buscou a reeleição, perdeu e anunciou sua aposentadoria política. Ele se levantou novamente em 2000, mas sua aposentadoria foi firmemente respeitada por 99% dos eleitores que lhe deram as costas.
Você foi uma figura chave naquele momento crucial, a queda do Muro de Berlim e a dissolução do bloco comunista. De fato você acende para liderar a oposição ao comunismo polonês depois de mudar de lado. Como você vê a atual cena internacional, em que aqueles que criticavam o muro naquela época estão agora falando em construir novos muros?
– Em nossa geração, pensamos no nível de continentes inteiros, ou mesmo do mundo inteiro. E nós enfrentamos três grandes questões. Primeiro, qual é uma base comum aceitável para países com diferentes religiões, culturas e níveis de desenvolvimento?
Então, qual deve ser o sistema econômico na nova estrutura mundial? Certamente não o sistema comunista, porque não funcionou para nenhum país. Mas tampouco deveria ser o capitalismo feroz que vemos no mundo hoje, no qual 10% da população mundial controla 90% de sua riqueza. E assim nos deparamos com a alternativa de tirar essa riqueza deles ou concordar com eles sobre como fazer com que isso beneficie a todos.
E a terceira pergunta é: que forma de democracia devemos ter? Hoje as eleições estão sendo ganhas por populismo, mentiras e demagogia. Temos que melhorar a democracia.
Qual é a sua análise da ascensão da extrema-direita em vários países e como ela se compara aos poderes que ocuparam a Polônia quando você nasceu?
– Se não dermos soluções para as pessoas, os demônios do passado voltarão a despertar e as pessoas voltarão para o que os atraiu. A elite precisa se reunir em fóruns, encontrar soluções muito melhores do que as da extrema direita e convencer as pessoas. Se não fizermos isso a tempo, os extremistas farão.
Vamos falar sobre direitos humanos e sindicatos, duas de suas áreas de especialização. Há um paralelo curioso entre a sua carreira sindical e política, e a prisão, e a do ex-presidente Lula da Silva, que atualmente enfrenta processos judiciais que são questionáveis por causa de sua aparente motivação política. Ele não foi acusado de comportamento antissocial como você foi na Polônia, mas de corrupção. Como você analisa a situação no Brasil? Você vê semelhanças entre a sua situação e a de Lula, além das diferenças ideológicas entre vocês?
– Eu conheci o Lula em 1981, em Roma. Entendemos que estávamos falando sobre a mesma coisa, mas também que eu estava questionando o comunismo e o capitalismo. Nós nos encontramos novamente há dois anos. E nós concordamos que ambos estávamos certos. No entanto, ele está na prisão agora, eu não estou e não vou estar.
Com relação às acusações, não sabemos se elas são justificadas. Mas ele lutou contra os capitalistas e eles não vão esquecer isso. É possível que eles tenham colocado uma armadilha para ele. Minha situação foi mais fácil porque construí capitalismo. Eles não precisaram me atacar.
Precisa haver uma investigação completa. Devemos mostrar solidariedade a Lula, mas devemos ser honestos o tempo todo, sejam quais forem as consequências. Eu não acho que ele seja culpado por nenhum erro sério. Apesar das nossas diferenças, ele é meu amigo.