Traduzido por Julio Batista
Original de Lee Sandberg para IAS
Imagine pegar uma estrela com o dobro da massa do Sol e esmagá-la até o tamanho de Manhattan. O resultado seria uma estrela de nêutrons – um dos objetos mais densos encontrados em qualquer lugar do universo, excedendo a densidade de qualquer material encontrado naturalmente na Terra por um fator de dezenas de trilhões. As estrelas de nêutrons são objetos astrofísicos extraordinários por si só, mas suas densidades extremas também podem permitir que funcionem como laboratórios para estudar questões fundamentais da física nuclear, sob condições que nunca poderiam ser reproduzidas na Terra.
Por causa dessas condições exóticas, os cientistas ainda não entendem do que exatamente são feitas as próprias estrelas de nêutrons, isto é, sua chamada “equação de estado” (EoS). Determinar isso é um dos principais objetivos da pesquisa em astrofísica moderna. Uma nova peça do quebra-cabeça, limitando o leque de possibilidades, foi descoberta por um par de estudiosos da IAS: Carolyn Raithel, bolsista John N. Bahcall Fellow na Faculdade de Ciências Naturais; e Elias Most, membro da Faculdade e bolsista John A. Wheeler Fellow na Universidade de Princeton (EUA). Seu trabalho foi publicado recentemente no The Astrophysical Journal Letters.
Idealmente, os cientistas gostariam de espiar dentro desses objetos exóticos, mas eles são muito pequenos e distantes para serem fotografados com telescópios padrão. Os cientistas confiam em propriedades indiretas que podem medir – como a massa e o raio de uma estrela de nêutrons – para calcular a EoS, da mesma forma que se pode usar o comprimento de dois lados de um triângulo retângulo para calcular sua hipotenusa. No entanto, o raio de uma estrela de nêutrons é muito difícil de medir com precisão. Uma alternativa promissora para observações futuras é usar uma medida chamada “frequência espectral de pico” (ou f2) em seu lugar.
Mas como se mede f2? As colisões entre estrelas de nêutrons, que são regidas pelas leis da Teoria da Relatividade de Einstein, levam a fortes explosões de emissão de ondas gravitacionais. Em 2017, os cientistas mediram diretamente essas emissões pela primeira vez. “Pelo menos em princípio, a frequência espectral de pico pode ser calculada a partir do sinal de onda gravitacional emitido pelo remanescente oscilante de duas estrelas de nêutrons fundidas”, disse Most.
Anteriormente, esperava-se que f2 fosse um indicativo razoável para o raio, uma vez que – até agora – os pesquisadores acreditavam que existia uma correspondência direta, ou “quase-universal”, entre eles. No entanto, Raithel e Most demonstraram que isso nem sempre é verdade. Eles mostraram que determinar a EoS não é como resolver um simples problema de hipotenusa. Em vez disso, é mais parecido com o cálculo do lado mais longo de um triângulo irregular, onde também se precisa de uma terceira informação: o ângulo entre os dois lados mais curtos. Para Raithel e Most, essa terceira informação é a “inclinação da relação massa-raio”, que codifica informações sobre a EoS em densidades mais altas (e, portanto, em condições mais extremas) do que o raio sozinho.
Essa nova descoberta permitirá que pesquisadores que trabalham com a próxima geração de observatórios de ondas gravitacionais (os sucessores do LIGO atualmente em operação) utilizem melhor os dados obtidos após fusões de estrelas de nêutrons. De acordo com Raithel, esses dados podem revelar os constituintes fundamentais da matéria das estrelas de nêutrons. “Algumas previsões teóricas sugerem que dentro dos núcleos de estrelas de nêutrons, as transições de fase podem estar dissolvendo os nêutrons em partículas subatômicas chamadas quarks”, afirmou Raithel. “Isso significaria que as estrelas contêm um mar de matéria de quarks livre em seu interior. Nosso trabalho pode ajudar os pesquisadores de amanhã a determinar se tais transições de fase realmente ocorrem.”