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Novo modelo evolutivo revela como a cooperação evolui

Por Emerging Technology from the arXiv
Publicado no MIT Technology Review

Uma das grandes questões sem respostas da biologia é a razão pela qual os organismos evoluíram para cooperar. Os benefícios a longo prazo da cooperação são evidentes – basta olhar, por exemplo, as estruturas extraordinárias que os cupins constroem ou a complexa sociedade que os seres humanos criaram.

Mas a evolução é um processo aleatório baseado em vantagens de curto prazo que emergem em cada geração. Claro, os indivíduos podem cooperar ou agir de forma egoísta, o que lhes permitem aumentar benefícios ou sofrer custos, dependendo das circunstâncias. Mas como essa conduta pode se propagar e levar ao surgimento a longo prazo da cooperação como um comportamento dominante é um enigma que prendeu os biólogos evolutivos por décadas.

Hoje, isso pode mudar graças ao trabalho de Christoph Adami e Arend Hintze da Michigan State University, em East Lansing, Estados Unidos. Eles criaram um modelo matemático simples usando princípios físicos bem compreendidos para mostrar como a cooperação surge durante a evolução.

O modelo sugere que o equilíbrio entre a cooperação e o comportamento egoísta, chamado de deserção, pode sofrer rápidas transições de fases, nas quais os indivíduos combinam seu comportamento com seus vizinhos. Além disso, um fator crucial para isso é o processo de punição. “A punição age como um campo magnético que traz um ‘alinhamento’ entre os jogadores, incentivando a cooperação”, diz Adami e Hintze.

Esta nova abordagem tem o potencial de mudar a forma como os biólogos evolucionistas, os economistas e os cientistas da computação pensam em relação a cooperação e o papel que a punição desempenha em encorajá-la.

Primeiro, uma contextualização. Uma grande variedade de fenômenos depende do comportamento em larga escala de muitos agentes individuais. Por exemplo: economia, a disseminação de doenças, evolução, movimento browniano, a magnetização, para citar apenas alguns.

Em alguns casos, os agentes são relativamente simples. Na magnetização, por exemplo, os agentes são átomos individuais com um spin que pode ser para cima ou para baixo e que interagem com seus vizinhos.

À primeira vista, a forma como um grande número de átomos interagem em um material magnético parece complexo e além da nossa imaginação. Mas existe um modelo matemático bastante simples, chamado de modelo Ising que explica intuitivamente como se formam os domínios magnéticos.

Neste modelo, os átomos apresentam um spin para cima ou para baixo e influenciam os vizinhos. No caso mais simples, os átomos em uma estrutura começam com spin em direções aleatórias. Mas eles podem alternar os spins de uma maneira que depende dos movimentos de seus vizinhos. Um campo magnético externo também pode fazer com que os spins sejam alinhados.

Usando este modelo, os físicos podem explorar as circunstâncias em que os domínios surgem onde todos os átomos compartilham o mesmo spin. Eles também podem explorar como isso influencia fatores ambientais, como a temperatura e um campo magnético externo.

A questão que Adami e Hintze investiga é se um modelo Ising pode lançar uma luz sobre a maneira que a cooperação evolui.

Para descobrir isso, eles criaram um modelo Ising em que cada “átomo” interage com seus vizinhos, cooperando ou desertando em um jogo de dilema do prisioneiro. Neste jogo entre dois átomos, cada jogador pode cooperar ou desertar e depois receber uma compensação que depende do comportamento do outro jogador.

Os jogadores recebem uma recompensa se ambos cooperarem, mas nada se ambos desertarem. No entanto, o dilema ocorre porque a recompensa mais alta é dada a um jogador que deserta enquanto o oponente coopera, sendo que este então não recebe nada.

No final do jogo, cada átomo pode mudar sua estratégia para a mesma de seu vizinho ou não, dependendo do sucesso deste mesmo.

A distribuição de estratégias é aleatória no começo. Mas ao longo do tempo, esse processo deve levar à disseminação de estratégias bem sucedidas em um processo análogo à formação e disseminação de domínios magnéticos.

O trabalho de Adami e Hintze é explorar a termodinâmica desse processo; as condições em que a cooperação se propaga.

Seus resultados possibilitam uma leitura fascinante. Acontece que as estratégias de cooperação e deserção estão em um delicado equílibrio, mas que, em algumas circunstâncias, ocorre uma transição de fase em que a cooperação se espalha rapidamente através da população. Na verdade, Adami e Hintze dizem que existe uma analogia de matemática formal com o magnetismo a este respeito.

Eles também generalizam o sistema para incluir mais “átomos” jogando o famoso jogo de bens públicos. Neste jogo, cada jogador tem um pote de dinheiro e tem que decidir o quanto colocar na conta pública, onde será multiplicada por algum número maior do que 1. Posteriormente, é redistribuído para todos os jogadores igualmente.

Obviamente, os jogadores têm mais a ganhar se todos eles colocaram todo o dinheiro na conta pública. Mas um único jogador pode ganhar mais, colocando nada e colhendo a recompensa.

Adami e Hintze também introduzem a punição. Portanto, os átomos que não contribuem podem ser colocadas para sofrer um prejuízo.

Neste caso, a punição tem um efeito profundo. “A punição age como um campo magnético que incentiva o alinhamento das rotações”, dizem os pesquisadores.

Esse é um resultado interessante. Isso implica que o comportamento pode ser manipulado em grande escala pela introdução de certos custos. Também implica que o resultado pode ser modelado usando uma física relativamente simples.

Curiosamente, os físicos desenvolveram uma ampla gama de técnicas para estudar esses tipos de sistemas de spins detalhadamente. O maior legado do trabalho de Adami e Hintze é que esse mecanismo matemático pode agora ser abordado no problema da cooperação.

Isso deve trazer mais insights em um futuro não muito distante. E poderia ter enormes implicações sobre a forma como sociólogos, economistas e formuladores de políticas pensam sobre a natureza da sociedade e como a mesma pode ser compreendida no futuro.

Julio Batista

Julio Batista

Sou Julio Batista, de Praia Grande, São Paulo, nascido em Santos. Professor de História no Ensino Fundamental II. Auxiliar na tradução de artigos científicos para o português brasileiro e colaboro com a divulgação do site e da página no Facebook. Sou formado em História pela Universidade Católica de Santos e em roteiro especializado em Cinema, TV e WebTV e videoclipes pela TecnoPonta. Autodidata e livre pensador, amante das ciências, da filosofia e das artes.