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O desmatamento no Brasil está aumentando – 2020 será pior

Por Herton Escobar
Publicado na Science

A política de desenvolvimento, em grande parte ilegal, destruiu mais de 9700 quilômetros quadrados de floresta amazônica brasileira desde o início do ano até o final do mês de julho, de acordo com uma estimativa do governo divulgada na segunda-feira – um aumento de 30% em relação ao ano anterior e a maior taxa de desmatamento desde 2007-08.

O número é baseado na análise de imagens de satélite Landsat de alta resolução pelo Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia por Satélite (PRODES), administrado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais do Brasil. A estimativa confirma indícios de aumento da perda de floresta relatada no início deste ano por um sistema diferente, o Sistema de Detecção do Desmatamento em Tempo Real (DETER), que utiliza imagens de satélite de baixa resolução para monitoramento em tempo real de atividades ilegais na floresta.

Muitos cientistas e ambientalistas culpam o aumento do desmatamento pela adoção de políticas agressivas do presidente Jair Bolsonaro, que apoiam a mineração e a pecuária, e pelo desmonte das proteções ambientais. Porém, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, disse que o aumento do desmatamento segue uma tendência iniciada em 2012, antes da eleição de Bolsonaro. A Science perguntou a Philip Fearnside, cientista do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia em Manaus, quem está certo. Essa entrevista foi editada para maior clareza e objetividade.

P: O governo brasileiro argumenta que estamos olhando para a continuação de uma tendência crescente iniciada em 2012 – não um desvio que possa ser atribuído ao atual governo. Como você explica isso?

R: O aumento do desmatamento em 2019 pode ser definitivamente atribuído ao governo Bolsonaro, apesar do fato de que duas vezes desde 2012 [em 2013 e 2016], a taxa de desmatamento se aproximou da porcentagem de crescimento deste ano. É importante lembrar que os dados do PRODES abrangem apenas o início deste ano até 31 de julho. A taxa de desmatamento nos meses seguintes explodiu em níveis muito acima dos mesmos meses do ano anterior [segundo dados do DETER], atingindo 222% acima do valor de agosto de 2018. Essa parte do efeito Bolsonaro só será refletida nos números do PRODES, que serão lançados daqui a um ano.

P: Quais ações e/ou palavras específicas do governo Bolsonaro contribuíram mais para esse aumento do desmatamento, na sua opinião?

R: O aumento resulta da constante retórica antiambientalista e das ações concretas no desmantelamento das agências ambientais do país, incluindo a suspensão efetiva das multas por desmatamento ilegal. A retórica e os contratempos institucionais estão documentados em detalhes em um artigo recente em que fui coautor. O discurso do presidente e seu ministro do meio ambiente envia uma mensagem clara de que não haverá consequências pela violação das leis ambientais. Quando os ministros do meio ambiente e da agricultura visitaram uma plantação ilegal de soja em uma área indígena no Mato Grosso, posaram para fotografias com máquinas e elogiaram a operação. Aqueles que estão na fronteira do desmatamento não seguem a publicação de decretos e leis no diário oficial do governo e nem leem os detalhes das mudanças legais relatadas nos principais jornais. Em vez disso, suas informações vêm das mídias sociais que rapidamente divulgam as notícias de cada discurso do presidente e de seus ministros contra agências ambientais e ONGs [organizações não governamentais].

P: Por que o desmatamento está aumentando desde 2012? O que estava acontecendo antes de Bolsonaro aparecer?

R: O desmatamento aumentou desde 2012 devido ao aumento contínuo de forças que causam a perda de florestas, como mais estradas que dão acesso à floresta, uma população crescente e mais investimentos. O efeito indireto da expansão da soja, sem dúvida, desempenhou um papel importante, com os plantadores de soja comprando muitas fazendas de gado no Estado de Mato Grosso – não apenas na antiga floresta amazônica, mas também na área de savana do Cerrado. Esses fazendeiros utilizam o dinheiro das vendas de terras para comprar terras mais baratas na floresta amazônica mais ao norte, especialmente no Estado do Pará, onde derrubam florestas em larga escala para estabelecer novas fazendas. O Pará é o maior contribuidor do desmatamento desde 2006, quando superou o Mato Grosso.

P: Quais são suas perspectivas para 2020?

R: Elas são sombrias. Os dados do PRODES para o próximo ano incluirão o desmatamento ocorrido desde agosto, que agora totaliza pelo menos 3929 quilômetros quadrados, com base no sistema de monitoramento DETER. Nada mudou no discurso da administração presidencial e o desmantelamento das instituições ambientais do país continua. Várias estradas, barragens e outros projetos na Amazônia levarão a mais desmatamentos.