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O extremismo dentro dos movimentos políticos e sociais

Muito se discute sobre os problemas dos movimentos políticos e sociais, como por exemplo, o feminismo misândrico, que está mais preocupado em pregar ódio aos homens, do que promover um consenso, os grupos de ultraconservadores que colocam opiniões pessoais sobre temas como sexualidade, acima da liberdade do próximo, ou qualquer outra área onde encontramos visões extremistas e distorcidas que colocam as pessoas em grupos estereotipados, onde na maioria das vezes terminam se odiando.

As características comuns nesses grupos de ideias engessadas, são os problemas com liberdade de expressão a qualquer ideia que se diferencie da pregada, prejulgamento da pessoa que expõe essa ideia, criação dos estereótipos para os indivíduos pertencentes ao outro grupo, e um discurso ódio que nunca é reconhecido por quem pratica. Vimos muito isso nas últimas eleições presidenciais, quando eleitores do PT e PSDB especularam sobre a capacidade intelectual dos adversários, criaram apelidos pejorativos, e trocaram acusações sobre a autoria dos discursos de ódio.

Militantes do PT e do PSDB em confronto no centro de SP. Foto: Michel Filho/Agência O Globo.
Militantes do PT e do PSDB em confronto no centro de SP. Foto: Michel Filho/Agência O Globo.

É interessante ressaltar que os grupos que se encaixam com as características dos descritos acima, se diferenciam de movimentos políticos e sociais que realmente têm um diálogo aberto, e que com muita coerência e embasamento procuram mudar a sociedade para melhor, como o movimento feminista, o movimento negro, os grupos de esquerda, direita e centro que se abrem para o diálogo.

Acredito que os principais ingredientes que faltam para essas pessoas que caem de cabeça em grupos extremistas são a empatia (que pode ser exercitada através do diálogo, uma ótima reflexão e/ou a experiência de vivenciar a realidade do outro) e o aprofundamento teórico em bons livros e fontes neutras que se esforçaram no estudo desses problemas, independente dos resultados destas pesquisas.

A questão da fundamentação teórica mal feita é resultado principalmente da nossa fraca cultura de leitura e do déficit do sistema de ensino que não forma bons leitores, críticos e formadores de opinião. Por isso é mais fácil seguir “gurus”, que na maioria das vezes são pessoas despreparadas e sem embasamento, mas com um bom discurso que espalha senso comum e opiniões pessoais como uma verdade universal. Não faltam youtubers que se enquadram nessa definição, como Olavo de Carvalho e Nando Moura.

A empatia e a evolução

Homens pré históricos usando artefatos em pedra lascada para a caça.
Homens pré históricos usando artefatos em pedra lascada para a caça.

Já a solução para a falta de empatia é algo mais complexo, pois ela deve ser exercitada diariamente, visto que evolutivamente temos em nossos genes traços de individualismo, pois sempre tivemos situações onde ser individualista nos ajudou na sobrevivência nas savanas, desde antes da época de caçadores-coletores.

O Gene Egoísta (1976) de Richard Dawkins.
O Gene Egoísta (1976) de Richard Dawkins.

O primata que nascia com uma carga genética que lhe deixava mais propenso a dividir o pouco que conquistava na caça com outras famílias, não garantia a sobrevivência de seus genes, tendo em vista a dificuldade da caça naqueles tempos. Os que apenas dividiam com a família, tinham nos filhos saudáveis a garantia da continuação de seus genes. Essa característica de ser mais empático com os parentes sanguíneos garantia que a carga genética dos filhos, que têm metade dos genes dos pais e metade das mães, passassem adiante. Os homens que sempre se uniram em grupos, se organizavam para melhorar a caça e outras características de sobrevivência, sendo assim dentro desse meio se socializavam de maneira cooperativa, porém sua limitação territorial os levava a ter rivalidade com outros grupos. Essa rivalidade era a chave da sobrevivência, e os grupos mais “individualistas” sobreviveram por não dividir esses territórios, enquanto grupos mais pacíficos se extinguiram.*

É bom deixar claro que a necessidade de “rivalidade de grupos” foi essencial para a sobrevivência de nossos antepassados, e pode refletir atualmente nas atitudes tomadas em grupos. Isso não significa que esse “individualismo” ou “rivalidade” é algo presente em todas as interações humanas. Dawkins esclarece que o “egoísmo” dos genes também pode desenvolver características altruístas e cooperativas nos seres humanos, desde que essas características auxiliem direta ou indiretamente na propagação dos genes pelas gerações.

Esse tipo de atitude foi importante em muitas etapas da evolução humana, afinal são milhares de anos de carga genética de “rivalidade de grupos” para serem derrubadas por apenas poucas centenas de anos de acesso a conhecimento para as massas desde a invenção da prensa de Gutemberg em 1439 e da consolidação do capitalismo, um sistema mais complexo que exige a cooperação de todos, que surgiu após a revolução industrial. Que fique claro que o conhecimento já era grande antes desta época, mas estava nas mãos de poucos afortunados.

Os extremistas mal sabem que apenas reproduzem o que existe de mais animal e instintivo em nossa espécie. Por isso, apenas a racionalidade pode nos tirar desse piloto automático evolutivo e nos levar para uma forma de agir mais moderna e que condiz com a realidade de nossa sociedade atual, já que os avanços do conhecimento, da sociedade e das tecnologias é algo exponencial e não linear, pois quanto mais conhecimento acumulado, mais rápido nos desenvolvemos.

É muito mais fácil ser irracional e pensar só em si, como por exemplo, um homem, branco e heterossexual que vive tranquilamente numa sociedade com uma moral religiosa conservadora e luta contra mudanças progressistas, que abalam esses costumes, sem pensar nos malefícios que essa moral faz às pessoas que nasceram ou fizeram escolhas diferentes, mesmo que essas melhorias não interfiram diretamente na vida deste homem e muito menos nas suas liberdades. Ou pensar como uma mulher que sofreu muito com o machismo de diversos homens e agora além de lutar por direitos, o que resolveria o problema, acaba generalizando e pregando ódio a todos os homens, os tachando como opressores e os afastando da simpatia da causa feminista.

“Temos o poder de desafiar os genes egoístas de nosso nascimento e, se necessário, os memes* egoístas de nossa doutrinação.”
– Richard Dawkins

Então devemos, como dizem os budistas, seguir o caminho do meio, um dos princípios básicos do budismo que pode ser entendido como o ato de agir de forma não extremista, e reconhecer as ilusórias dualidades do mundo, e esse caminho ao meu ver só é alcançado com a racionalidade, conhecimento e empatia. Os grupos políticos e de lutas sociais devem buscar uma forma de conquistarem seus direitos, mas de um modo que seja bom para todos, que ouça todos, que não cause mais desigualdades, independente de que lado a balança vai cair, porque se não chegarmos a este cenário, viveremos sempre uma “guerra santa” de lutas infindáveis e que causam mais danos que melhorias.

Quanto a extremismos, sempre irão existir, nem que seja em menor escala, até porque como todos nós sabemos, é da nossa natureza.

*Para saber mais sobre evolução genética aconselho a leitura do “O gene egoísta, de Richard Dawkins”.

*Meme é um termo definido por Richard Dawkins em O Gene Egoísta e é uma analogia de memórias que se comportam como genes, ou seja, é uma unidade cultural que se autopropaga numa evolução cultural.

OBSERVAÇÃO: Deixo claro que esse texto é opinativo, e que o fato de citar “O Gene Egoísta” não significa que essa ideia relacionada a grupos políticos e sociais consta nesta obra. Também é bom salientar que há visões diferentes da divulgada por Dawkins na biologia e que posso estar equivocado e por isso estou aberto a opiniões distintas.

Lucas Francisco Gonçalves

Lucas Francisco Gonçalves

Graduado em Ciência da Computação pela UNISUL, com honras de melhor aluno. “O que mais me abriu a mente foi o bom exercício da lógica e todas as questões abertas no campo da Inteligência Artificial”. Lucas não tem dificuldades com números, mas ama a área da música, arte e filosofia. “Gosto de bons filmes, Stanley Kubrick, Stephen King, livros de mitologia nórdica, ficção cientifica e demais ficções. Tolkien, Douglas Adams e Isaac Asimov são exemplos de autores que amo. Tenho um gosto musical diversificado, vou do hardrock ao metal, passando pelo grunge, porém também amo música country e clássica”.