Por Simon Kolstoe
Publicado no The Conversation
A muita aguardada fase 3 do teste da vacina contra o coronavírus da Universidade de Oxford foi interrompida após uma suspeita de reação adversa em um de seus participantes.
Como o desenvolvimento de uma vacina bem-sucedida tem sido amplamente apontado como uma forma de acabar com a pandemia, isso parecerá um golpe para muitas pessoas desesperadas para voltar à vida normal.
Mas quão preocupados devemos estar? A suspensão deste estudo é um grande revés no esforço de pesquisa para encontrar uma solução?
Nesta fase, é difícil dizer. O que isso mostra é que o teste está cumprindo um de seus principais objetivos – testar rigorosamente a segurança da vacina em um grande número de pessoas.
Como funciona o teste de vacina
Durante o desenvolvimento, uma vacina passa por várias etapas de testes em humanos, conhecidas como fases. Um ensaio clínico de fase 1 é realizado com pequenos grupos de participantes para mostrar que a vacina é geralmente segura para administrar às pessoas. Um ensaio clínico de fase 2 testa a vacina em grupos maiores de pessoas, para ver se ela estimula uma resposta imunológica e, portanto, pode beneficiar os pacientes.
Mas é o estudo de fase 3 que dá as respostas que todos realmente queremos saber – se a vacina funcionará na população que se interessa proteger de doenças, quais efeitos colaterais terá se for administrada a muitas pessoas, e se, em última análise, a vacina deve ser licenciada para uso clínico.
Existem várias maneiras possíveis de realizar um ensaio clínico de fase 3, mas geralmente é usado um projeto de ensaio clínico randomizado (ECR).
Isso separa os participantes aleatoriamente em dois grupos: o grupo ativo, que recebe a vacina em teste, e o grupo de controle, que recebe uma vacina inativa chamada placebo. O objetivo é mostrar estatisticamente que a vacina ativa é mais benéfica que o placebo.
Essa randomização também costuma utilizar um método “duplo-cego” (dupla ocultação), o que significa que nem os participantes nem os pesquisadores sabem em qual grupo cada participante está.
Isso evita que os pesquisadores, intencionalmente ou não, enviesem seus resultados com o otimismo de que sua nova vacina funcionará. ECRs cegos são considerados o padrão de excelência para testar qualquer vacina ou medicamento.
No entanto, como a maioria dos ECRs são cegos – incluindo o estudo de fase 3 de Oxford – os pesquisadores não podem determinar facilmente se os eventos médicos adversos sofridos pelos participantes são devido à vacina sendo testada ou se foi alguma outra causa.
Isso ocorre porque eles não sabem quais participantes receberam a vacina e quais estão no grupo placebo.
Monitoramento de segurança
Para contornar esse problema, estudos cegos quase sempre têm um comitê de monitoramento de segurança de dados (CMSD) independente e não cego. Seu trabalho é monitorar todos os participantes para ver se aqueles no grupo ativo estão tendo mais complicações médicas do que aqueles no grupo placebo.
Todas as complicações médicas causadas por qualquer meio – incluindo acidentes – são relatadas ao CMSD, que então considera se os “eventos adversos” estão relacionados à vacina.
Às vezes, isso não está claro e, portanto, o CMSD pode solicitar que o teste seja interrompido enquanto um evento é investigado. Isso é o que parece ter acontecido com o teste da vacina de Oxford.
Muitas vezes, os eventos adversos não estão relacionados à vacina que está sendo testada. Em vez disso, podem ser causados por problemas de saúde, doenças ou infecções não relacionadas.
Alternativamente, as complicações podem estar relacionadas à vacina, mas ocorrem tão raramente que o CMSD pode não considerá-las um risco significativo para os outros participantes do estudo.
Sem muitos detalhes, é muito difícil avaliar a importância do evento adverso que foi detectado no estudo de Oxford.
Mas é importante observar que interromper as tentativas por esse motivo é bastante comum. Na verdade, mostra que o estudo está fazendo exatamente o que deve – monitorar de perto os participantes para garantir que todos e quaisquer eventos adversos sejam detectados e investigados.
Todos nós provavelmente esperamos que, após investigação, o CMSD independente descubra que este evento adverso é algo possível de lidar e, portanto, que o estudo possa reiniciar em breve. Porém, mesmo que não seja o caso, é importante lembrar que quaisquer lições aprendidas com este ensaio serão levadas para o desenvolvimento futuro de vacinas.
Também é importante lembrar que a vacina de Oxford é apenas uma das nove vacinas COVID-19 atualmente em testes de fase 3, e que seis em cada dez vacinas submetidas a testes não tem sucesso.
Mesmo que, na pior das hipóteses – ou seja, esse evento adverso significar que o desenvolvimento da vacina de Oxford tenha de parar –, ainda há motivos para ser otimista de que uma vacina bem-sucedida será desenvolvida em breve.