Publicado no CERN
Em um artigo publicado na Nature no dia 19 de dezembro desse ano, a colaboração ALPHA reportou pela primeira vez na história a medição no espectro ótico de um átomo de antimatéria. Esse feito apresenta desenvolvimentos tecnológicos que inauguram uma era completamente nova na pesquisa de antimatéria de alta precisão. Essa façanha foi o resultado de mais de 20 anos de trabalho pela comunidade de antimatéria do CERN.
“Usando um laser para observar a transição de anti-hidrogênio e o comparando ao hidrogênio para ver se eles obedeciam às mesmas leis da Física sempre foi o objetivo chave da pesquisa de antimatéria”, falou Jeffrey Hangst, porta-voz da colaboração ALPHA.
Os átomos consistem de elétrons orbitando um núcleo. Quando os elétrons se movem de uma órbita para outra eles absorvem ou emitem luz em comprimentos de onda específicos, formando o espectro atômico. Cada elemento tem um espectro único. Como resultado, a espectroscopia é a ferramenta comumente usada em várias áreas da Física, Astronomia e Química. Isso ajuda a caracterizar átomos e moléculas e seus estados internos. Por exemplo, na Astrofísica, analisar o espectro de luz de uma estrela remota permite que os cientistas determinem sua composição.
Com o seu único próton e seu único elétron, o hidrogênio é o mais abundante, o mais simples e o mais bem compreendido átomo do Universo. Seu espectro já foi medido na mais alta precisão. Os átomos de anti-hidrogênio, por outro lado, são muito pouco compreendidos. Porque o Universo aparenta consistir inteiramente de matéria, os constituintes do anti-hidrogênio – antiprótons e pósitrons – precisam ser produzidos e agregados em átomos antes que o espectro de anti-hidrogênio possa ser medido. É um processo cuidadoso, mas recompensador uma vez que qualquer diferença mensurável entre o espectro de hidrogênio e anti-hidrogênio quebraria os princípios básicos da Física e possivelmente ajudaria a entender o enigma do desequilíbrio da matéria-antimatéria no Universo.
O resultado da ALPHA do dia 19 é a primeira observação da linha espectral em um átomo de anti-hidrogênio, permitindo que o espectro de luz da matéria e antimatéria seja comparada pela primeira vez. Dentro dos limites experimentais, o resultado não mostra nenhuma diferença comparada à linha espectral equivalente ao hidrogênio. Isso é consistente com o Modelo Padrão da Física de Partículas, a teoria que melhor descreve as partículas e as forças que atuam entre elas, a qual prevê que o hidrogênio e o anti-hidrogênio devem tem características espectroscópicas idênticas.
A colaboração ALPHA espera melhorar a precisão de suas medições no futuro. Medir o espectro de anti-hidrogênio com alta precisão oferece uma nova e extraordinária ferramenta para testar se a matéria se comporta de modo diferente da antimatéria e assim, futuramente, testar o Modelo Padrão.
ALPHA é um experimento ímpar na instalação Antiproton Decelerator no CERN, capaz de produzir átomos anti-hidrogênio e os confinar em uma armadilha magnética, manipulando alguns anti-átomos por vez. Prender átomos de anti-hidrogênio permite que eles sejam estudados usando lasers ou alguma outra fonte de radiação.
“Mover e aprisionar antiprótons ou pósitrons é fácil porque eles são partículas carregadas, ” disse Hangst. “Mas quando você combina os dois obtém-se anti-hidrogênios neutros, os quais são muito mais difíceis de aprisionar, então nós desenhamos uma armadilha magnética muito especial que se apoia no fato do anti-hidrogênio ser um pouco mais magnético. ”
O anti-hidrogênio é feito através da mistura de plasmas de cerca de 90 mil antiprótons do Antiproton Decelerator com pósitrons, resultando em uma produção de cerca de 25 mil átomos de anti-hidrogênios por tentativa. Átomos de anti-hidrogênios podem ser aprisionados se eles estiverem se movendo lento o suficiente quando eles são criados. Usando uma nova técnica em que a colaboração empilha anti-átomos resultantes de dois ciclos de misturas sucessivas, é possível confinar uma média de 14 anti-átomos por tentativa, comparado aos somente 1,2 com os métodos prévios. Iluminando a armadilha de átomos com um feixe de laser em uma frequência precisamente sintonizada, cientistas podem observar a interação do feixe com os estados internos do anti-hidrogênio. As medições foram feitas observando as então chamadas transições 1S-2S. Os estados 2S nos átomos de hidrogênio tem vida longa, levando à uma estreita linha natural de largura, que é bem adequado para a medida de precisão.
O resultado atual, junto com o recente limite da relação da massa antipróton-elétron estabelecido pela colaboração ASACUSA, e a relação carga-massa do antipróton determinado pela colaboração BASE, demonstrou que os testes de simetrias fundamentais com a antimatéria no CERN estão amadurecendo rapidamente.