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Peso é realmente uma força?

Quando Isaac Newton publicou seu trabalho “Princípios Matemáticos da Filosofia Natural” — talvez a obra mais influente da história das ciências naturais —, o modo como encaramos a interação entre corpos mudou completamente. O maior triunfo desta quebra de paradigma foi a tão desejada unificação entre a mecânica terrestre e a mecânica celeste, explicando a interação gravitacional como simplesmente uma força de atração entre dois objetos dotados de massa. Isso implicaria que o que “prende” a Lua à Terra é o mesmo fenômeno físico que faz uma maçã cair ao chão (ou em sua cabeça). Claro, isso continua sendo consenso — e provavelmente sempre será. Mas, e quanto à natureza deste fenômeno? Como Newton teve certeza de que aquilo era realmente uma força?

A esta altura da leitura você já deve ter se perguntado o motivo de eu ter feito a pergunta do título, sendo que a atração gravitacional é colocada junto com as famosas quatro forças fundamentais da natureza. Bom, isso parece ser um problema do nosso idioma, pois em quase todas as outras línguas usa-se o termo interaçãograças ao poder de abstração do nosso mais famoso cérebro, com pedacinhos preservados até hoje: Albert Einstein.

O que Einstein propôs?

F = mtalvez seja uma velha conhecida sua. O primeiro erro conceitual ao se interpretar esta equação, conhecida como a Segunda Lei de Newton, é admitir que força é definida como massa vezes aceleração. Na verdade, o que temos do lado esquerdo da equação é uma causa, e no direito, a consequência.

  • A causa: Forças precisam ser medidas para que sua existência seja admitida, e isso é um postulado do método científico conhecido como experimentação. Como, então, medimos uma força? Podemos facilmente executar esta tarefa se definirmos em termos da deformação que uma mola sofre ao ser comprimida.
  • A consequência: A aceleração que determinada massa sofrerá ao ser exposta à nossa mola será, então, proporcional à força aplicada sobre ela.

Ok, então, e a balança não está medindo o peso? Não. A balança mede a força normal. A força que nos empurra para cima e que aparentemente é “cancelada” pelo nosso peso.

O argumento da Teoria da Relatividade Geral é que não podemos provar a existência do peso. Este seria, então, uma força fictícia. Não quero entrar no mérito de uma explicação que envolva o conceito de referencial inercial ou não-inercial para tornar a explicação mais didática. Vamos, então, por outro caminho:

Quando nosso carro faz uma curva, tem-se a impressão de que algo nos empurra em direção à porta. Esta é uma força fictícia. Parece que algo está te empurrando, mas na verdade é só o seu corpo seguindo sua trajetória de inércia, com velocidade constante, até que a porta mudando de direção aplica uma força e te faz seguir o mesmo caminho que ela. Einstein fez o seguinte questionamento: e se a nossa sensação de peso for, na verdade, a própria Terra nos empurrando para cima através da força normal, assim como a porta do carro, enquanto estamos apenas seguindo nosso caminho mais curto em um espaço curvo?

Nesta imagem temos uma analogia do que acontece no fenômeno de atração entre a Terra e o Sol. Para o nosso planeta, o caminho que ele está seguindo é uma reta e a nossa estrela o está perseguindo, tentando alcançá-lo. É o mesmo que a Terra faz conosco, apesar de ela já estar efetivamente nos tocando.

Esta interpretação de que a Terra está nos acelerando para cima devido à acentuada distorção do espaço-tempo em suas proximidades — e sendo aceleração a taxa de variação da taxa de variação do deslocamento no tempo, distorcendo este último temos, como consequência, corpos acelerados—, é, na minha opinião, uma das mais belas experiências de abstração da realidade através da física. Espero ajudá-los a atingir este mesmo prazer.

Continuando: se estivermos em um elevador caindo, de fato não há como detectar qualquer força agindo sobre nós. Entretanto, a interpretação da Lei da Gravitação Universal como uma força real é completamente válida matematicamente. Ou seja, está de acordo com o modelo de dados e possui preditibilidade verificada. Apenas, para Einstein, não é a melhor descrição da realidade.

Para quem quiser ir além:

O teleparalelismo é uma teoria equivalente à relatividade geral que interpreta a atração gravitacional como uma força, uma alternativa para a tentativa de unificar as interações fundamentais como sendo todas forças.

Referências

Daniel Marostica

Daniel Marostica

Graduando em Física na Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Futuro professor e divulgador científico. Pesquisa computacional em Astrofísica Extragaláctica.