Publicado na Universidade de Tübingen
Ao medir sinais cerebrais, um grupo de pesquisa em neurociência da Universidade de Tübingen demonstrou pela primeira vez que os pássaros canoros possuem experiências subjetivas. O registro simultâneo do comportamento e da atividade cerebral permitiu ao grupo liderado pelo professor Andreas Nieder mostrar que os corvos são capazes de perceber conscientemente as entradas sensoriais. Até agora, esse tipo de consciência só havia sido observado em humanos e outros primatas, que têm estruturas cerebrais completamente diferentes das dos pássaros. “Os resultados do nosso estudo abrem uma nova maneira de olhar para a evolução da consciência e suas limitações neurobiológicas”, diz Nieder. O estudo foi publicado na revista Science em 24 de setembro de 2020.
Para os humanos e nossos parentes mais próximos no reino animal, os primatas não humanos, nossa capacidade de perceber as coisas conscientemente está localizada no córtex cerebral. Ao longo de muitos anos, pesquisas têm discutido se os animais com cérebros estruturados de forma completamente diferente, sem um córtex cerebral, também são dotados de percepção consciente. Até agora, porém, não havia dados neurológicos experimentais para apoiar tal afirmação.
Para rastrear processos conscientes em pássaros, os cientistas de Tübingen treinaram dois corvos: eles deveriam usar a cabeça para indicar se viram um estímulo em uma tela ou não. A maioria dos estímulos era perceptualmente inequívoca: diferentes testes apresentavam figuras brilhantes ou nenhum estímulo, e os corvos sinalizavam de forma confiável a presença ou ausência desses estímulos, respectivamente. No entanto, alguns estímulos eram tão fracos que estavam no limiar da percepção: para o mesmo estímulo fraco, os corvos, às vezes, indicavam que o tinham visto, enquanto em outros casos mostravam que não havia estímulo. Aqui, a percepção subjetiva dos corvos entrou em jogo.
Enquanto os corvos respondiam aos estímulos visuais, os pesquisadores registravam simultaneamente a atividade de células nervosas individuais no cérebro. Quando os corvos mostravam ter visto algo, as células nervosas estavam ativas no período entre a apresentação do estímulo e a resposta comportamental. Se não percebessem um estímulo, as células nervosas permaneciam inativas. Surpreendentemente, foi possível predizer a experiência subjetiva dos corvos em relação ao estímulo com base na atividade das células nervosas. “Espera-se que as células nervosas que representam a entrada visual sem componentes subjetivos respondam da mesma maneira a um estímulo visual de intensidade constante”, explica Nieder, “Nossos resultados, no entanto, mostram conclusivamente que as células nervosas em níveis de processamento mais elevados do cérebro do corvo são influenciados pela experiência subjetiva, ou mais precisamente, produzem experiências subjetivas”.
Isso significa que, em termos de história evolutiva, as origens da consciência podem ser muito mais antigas e mais difundidas no reino animal do que se pensava anteriormente. “Os últimos ancestrais comuns de humanos e corvos viveram 320 milhões de anos atrás”, diz Nieder. “É possível que a consciência da percepção tenha surgido naquela época e tenha sido transmitida desde então”. Um cenário alternativo é que a consciência da percepção se desenvolveu de forma totalmente independente nessas espécies distantemente aparentadas, explica o neurobiologista: “Em qualquer caso, a capacidade da experiência consciente pode ser realizada em cérebros estruturados de forma diferente e independentemente do córtex cerebral”.