Por Paul Rincon
Publicado na BBC
Dois cientistas receberam o Prêmio Nobel de Química de 2021 por seu trabalho na construção de moléculas que são imagens espelhadas uma da outra.
O alemão Benjamin List e o escocês David MacMillan foram anunciados como os vencedores em um evento em Estocolmo.
Seu kit de ferramentas químicas foi usado para descobrir novos medicamentos e fazer moléculas que podem capturar luz em células solares.
Os vencedores dividirão o prêmio em dinheiro de 10 milhões de coroas (cerca de 6,1 milhões de reais).
Questionado sobre como se sentia ao vencer, o professor MacMillan, da Universidade de Princeton, nos EUA, disse: “Atordoado, confuso, exultante, orgulhoso, sentimental, choroso – você escolhe. Eu sinto todas essas coisas agora”.
O professor List estava de férias com sua família quando ouviu a notícia: “Não esperava essa grande surpresa”, acrescentando que “achou que era uma piada” quando recebeu o telefonema da Suécia.
O processo científico em questão, denominado organocatálise assimétrica, tornou muito mais fácil produzir moléculas assimétricas – substâncias químicas que existem em duas versões, em que uma é a imagem espelhada da outra.
Os químicos geralmente querem apenas uma dessas imagens espelhadas – especialmente quando estão produzindo medicamentos – mas tem sido difícil encontrar métodos eficientes para fazer isso.
Algumas moléculas com versões em espelho têm propriedades diferentes. Um exemplo é a substância química chamada carvona, que tem uma forma que cheira a hortelã e uma outra que cheira a erva, endro.
O professor Peter Somfai, membro do Comitê Nobel, argumentou que, se o corpo pode diferenciar entre duas imagens espelhadas, o mesmo pode ser verdadeiro para medicamentos usados para tratar doenças. Em outras palavras, versões diferentes da mesma molécula podem ter efeitos diferentes quando ingeridas.
“Então se torna importante ser capaz de fazer apenas a imagem espelhada de uma droga que tenha o efeito fisiológico desejado”, disse o professor Somfai, durante entrevista coletiva na Academia Real de Ciências da Suécia.
Um exemplo trágico desse princípio foi a droga talidomida, aprovada para o tratamento de enjoos matinais e outras doenças na década de 1950. Foi proibida quando foi descoberto que causava deficiências em bebês.
O medicamento talidomida continha duas versões espelhadas do mesmo composto químico misturadas. Uma dessas versões danificava o feto em desenvolvimento.
Um novo nível
David MacMillan, 53 anos, nasceu em Bellshill, North Lanarkshire, e é o Professor Distinto de Química da cátedra James S. McDonnell na Universidade de Princeton em Nova Jersey, nos EUA.
Benjamin List, também de 53 anos, é de Frankfurt, Alemanha. Ele é professor da Universidade de Colônia e do Instituto Max Planck de Pesquisa de Carvão.
Seu trabalho se concentrou em catalisadores, substâncias que podem acelerar reações químicas sem se tornarem parte do produto final.
Enquanto estava na Universidade Harvard no final dos anos 1990, MacMillan trabalhava com catalisadores de metal. Mas os tipos usados em sua pesquisa raramente eram adotados pela indústria. O problema era que, embora as condições sem oxigênio e sem umidade exigidas por alguns catalisadores de metal fossem possíveis de se obter em laboratório, isso era muito mais difícil em grandes escalas.
O químico escocês começou a projetar moléculas orgânicas simples (substâncias químicas que contêm carbono e hidrogênio unidos) que podiam fazer o mesmo trabalho que os metais, mas não eram destruídas pela umidade.
Enquanto isso, Benjamin List trabalhava para um objetivo semelhante. Ele foi capaz de mostrar que um aminoácido simples chamado prolina pode atuar como um catalisador altamente eficaz. Também era barato e ecológico.
O professor Somfai, que trabalha na Universidade de Lund da Suécia, disse que List e MacMillan “racionalizaram suas descobertas” de uma forma tão simples que foi imediatamente apreciada pela comunidade científica”.
Ele acrescentou: “Isso resultou em uma ‘corrida do ouro’ – ou um boom – nesta área… É fácil projetar coisas novas dada esta explicação fácil”.
O Comitê do Nobel disse que a técnica “levou a construção molecular a um nível inteiramente novo”.
O industrial sueco Alfred Nobel fundou os prêmios em seu testamento, escrito um ano antes de sua morte em 1896.
Um total de 187 indivíduos receberam o prêmio de química desde que foi concedido pela primeira vez em 1901.
Apenas sete desses laureados são mulheres. Uma pessoa, o bioquímico britânico Frederick Sanger, ganhou o prêmio duas vezes – em 1958 e 1980.
O país que mais ganhou prêmios em química são os Estados Unidos, com 72 vencedores. A Alemanha e o Reino Unido dividem o segundo lugar com 34 laureados cada.