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Primeiros humanos podem ter aprendido a andar sobre os dois pés ainda nas copas das árvores, sugere um novo estudo

Traduzido por Julio Batista
Original de Rebecca Dyer para o ScienceAlert

O bipedalismo – andar ereto sobre duas pernas – é uma característica definidora dos humanos, que se acredita ter se desenvolvido em nossos parentes antigos quando eles se afastaram das florestas para aproveitar os espaços abertos.

Um novo estudo explorando o comportamento de chimpanzés selvagens sugere que a evolução do bipedalismo pode ter sido, de fato, uma estratégia que surgiu pela primeira vez enquanto ainda nos moviamos nos galhos das árvores.

Os pesquisadores há anos se perguntam se uma mudança no habitat levou nossos ancestrais ao bipedalismo, ou se eles desenvolveram a capacidade de andar sobre os dois pés para procurar alimentos nas florestas que habitavam há muito tempo, uma habilidade que mais tarde se tornou útil ao atravessar as extensões dos campos abertos.

“Até hoje, as inúmeras hipóteses para a evolução do bipedalismo compartilham a ideia de que os hominídeos (ancestrais humanos) desceram das árvores e caminharam eretos no chão, especialmente em habitats mais áridos e abertos, sem cobertura arbórea”, disse a antropóloga biológica Fiona Stewart, da Colégio Universitário de Londres (UCL), coautora do estudo.

“Nossos dados não suportam isso de forma alguma.”

Usando evidências preservadas em estruturas ósseas, os pesquisadores podem deduzir como os primeiros hominídeos se moviam em ambientes específicos. O que os ossos não podem dizer é como um ambiente pode ter influenciado diretamente o movimento, ou como um meio de locomoção pode ter levado a uma mudança de cenário.

Junto com os bonobos (Pan paniscus), os chimpanzés são nossos parentes vivos mais próximos. Compreender como seu comportamento varia em relação ao habitat fornece uma nova e empolgante visão sobre os fatores ecológicos do bipedalismo que, de outra forma, só podem ser inferidos a partir de registros fósseis.

Stewart e seus colegas afirmam que este é o “primeiro teste em um primata vivo da hipótese de que os habitats de savana arborizada foram um catalisador para o bipedalismo terrestre”.

O estudo documentou os comportamentos de chimpanzés-orientais (Pan troglodytes schweinfurthii) no Vale do Issa, no oeste da Tanzânia. O Vale do Issa é uma região de mosaico de salva e savana no Vale do Rifte da África Oriental, semelhante ao habitat onde os primeiros hominídeos vagavam.

Os chimpanzés que vivem em habitats semelhantes aos de nossos primeiros ancestrais humanos dão aos cientistas a oportunidade de investigar os fatores ecológicos do bipedalismo. Os movimentos e posturas dos chimpanzés do vale do Issa foram comparados com dados de estudos anteriores sobre chimpanzés que vivem em densas áreas florestais da África.

Ao comparar o comportamento observado nos chimpanzés do vale do Issa com o de chimpanzés que vivem inteiramente na floresta em outras partes da África, os pesquisadores descobriram que, apesar de seu habitat em mosaicos de savana e selva, os chimpanzés de Issa não eram mais terrestres. Eles passavam a mesma quantidade de tempo nas árvores que os chimpanzés que viviam em florestas densas.

Para analisar as variações nos grupos de chimpanzés, os pesquisadores observaram o comportamento posicional de 13 adultos (6 fêmeas e 7 machos), no Vale do Issa. Isso incluiu quase 2.850 observações de atividades de escalada, caminhada e suspensão ao longo de 15 meses, bem como milhares de registros sobre postura. Eles coletaram dados a cada 2 minutos durante cada período de observação de uma hora.

Para cada observação de bipedalismo, a localização relativa do chimpanzé foi registrada.

Mais de 85% dos eventos de bipedalismo observados entre os chimpanzés do Vale do Issa ocorreram em árvores, principalmente quando os chimpanzés estavam procurando comida. Os autores observaram que esta é uma descoberta surpreendente, pois acredita-se que grande parte da pressão evolutiva para o bipedalismo esteja associada a atividades terrestres, como carregar objetos ou olhar sobre a grama alta.

“Nosso estudo sugere que o recuo das florestas no final do MiocenoPlioceno foi há cerca de cinco milhões de anos atrás e os habitats de savana mais abertos não foram, de fato, um catalisador para a evolução do bipedalismo”, disse o coautor e antropólogo biológico do UCL Alex Piel.

“Em vez disso, as árvores provavelmente permaneceram essenciais para sua evolução – com a busca por árvores produtoras de alimentos um provável impulsionador dessa característica”.

Se nossos próprios ancestrais se comportaram de maneira semelhante e como uma caminhada sobre os pés pelos galhos evoluiu para um passeio pela savana serão coisas que exigirão mais pesquisas.

Mas, a julgar por nossos primos chimpanzés, nossos ancestrais poderiam estar preparados para começar a andar sobre dois pés quando chegou a hora de deixar as árvores.

Esta pesquisa foi publicada na Science Advances.