Traduzido por Julio Batista
Original de Matt Williams para o Universe Today
Não é exagero dizer que o estudo dos planetas extrasolares decolou nas últimas décadas. Até o momento, 4.375 exoplanetas foram confirmados em 3.247 sistemas, com outros 5.856 candidatos aguardando confirmação.
Nos últimos anos, os estudos de exoplanetas começaram a transição do processo de descoberta para o de caracterização.
Espera-se que esse processo acelere assim que os telescópios da próxima geração estiverem operacionais.
Como resultado, os astrobiólogos estão trabalhando para criar listas abrangentes de potenciais “bioassinaturas”, ou seja, compostos e processos químicos associados à vida (oxigênio, dióxido de carbono, água, etc.)
Mas de acordo com uma nova pesquisa feita por uma equipe do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), outra bioassinatura potencial que devemos estar atentos é um hidrocarboneto chamado isopreno (C5H8).
O estudo que descreve suas descobertas, “Assessment of Isoprene as a Possible Biosignature Gas in Exoplanets with Anoxic Atmospheres” (tradução livre: Avaliação do isopreno como possível gás de bioassinatura em exoplanetas com atmosfera anóxica), apareceu recentemente online e foi aceito para publicação na revista Astrobiology.
Para seu estudo, a equipe do MIT analisou a lista crescente de possíveis bioassinaturas que os astrônomos estarão procurando nos próximos anos.
Até o momento, a grande maioria dos exoplanetas foi detectada e confirmada usando métodos indiretos.
Na maior parte, os astrônomos têm contado com o Método de Trânsito (Fotometria de Trânsito) e o Método de Velocidade Radial (Espectroscopia Doppler), sozinhos ou combinados. Apenas alguns foram detectados usando Imagem Direta, o que torna muito difícil caracterizar atmosferas e superfícies de exoplanetas.
Apenas em raras ocasiões os astrônomos foram capazes de obter espectros que lhes permitiram determinar a composição química da atmosfera de um determinado exoplaneta. Isso foi o resultado da luz passando pela atmosfera de um exoplaneta conforme ele transitava na frente de sua estrela ou foi devido aos poucos casos em que a Imagem Direta ocorreu e a luz refletida da atmosfera do exoplaneta pôde ser estudada.
Muito disso tem a ver com os limites de nossos telescópios atuais, que não têm a resolução necessária para observar planetas rochosos menores que orbitam mais perto de sua estrela.
Astrônomos e astrobiólogos acreditam que esses planetas têm maior probabilidade de serem habitáveis, mas qualquer luz refletida de suas superfícies e atmosferas é superada pela luz proveniente de suas estrelas.
No entanto, isso mudará em breve, à medida que instrumentos de próxima geração como o Telescópio Espacial James Webb (JWST) forem para o espaço. Sara Seager, professora da classe de 1941 de Física e Ciências Planetárias no MIT, lidera o grupo de pesquisa responsável (também conhecido como Grupo Seager) e foi coautora do paper.
Como ela disse ao Universe Today por e-mail, “com o lançamento do Telescópio Espacial James Webb em outubro de 2021, teremos nossa primeira capacidade de pesquisar gases de bioassinatura – mas será difícil porque os sinais atmosféricos de pequenos planetas rochosos são muito fracos. Com o JWST no horizonte, o número de pessoas trabalhando no campo cresceu tremendamente. Estudos como este apresentam novos gases de bioassinatura em potencial, já outros trabalhos mostram potenciais falsos positivos até mesmo para gases como o oxigênio.”
Uma vez implantado e operacional, o JWST será capaz de observar nosso Universo em comprimentos de onda mais longos (na faixa do infravermelho próximo e médio) e com sensibilidade bastante aprimorada.
O telescópio também vai contar com uma série de espectrógrafos para obter dados de composição, bem como coronógrafos para bloquear a luz obscurecida das estrelas-mãe. Esta tecnologia permitirá aos astrônomos caracterizar a atmosfera de planetas rochosos menores.
Por sua vez, esses dados permitirão que os cientistas coloquem restrições muito mais rígidas na habitabilidade de um exoplaneta e podem até mesmo levar à detecção de bioassinaturas conhecidas (e/ou potenciais).
Conforme observado, essas “bioassinaturas” incluem as indicações químicas associadas à vida e ao processo biológico, sem mencionar os tipos de condições que são favoráveis a ela.
Isso inclui o gás oxigênio (O2), que é essencial para a maioria das formas de vida na Terra e é produzido por organismos fotossintéticos (plantas, árvores, cianobactérias etc.). Esses mesmos organismos metabolizam o dióxido de carbono (CO2), que a vida que metaboliza o oxigênio emite como um produto residual. Há também água (H2O), que é essencial para toda a vida como a conhecemos, e metano (CH4), que é emitido pela matéria orgânica em decomposição.
Uma vez que se acredita que a atividade vulcânica desempenha um papel importante na habitabilidade planetária, os subprodutos químicos associados ao vulcanismo – sulfeto de hidrogênio (H2S), dióxido de enxofre (SO2), monóxido de carbono (CO), gás hidrogênio (H2), etc. – também são consideradas bioassinaturas.
A esta lista, Zhan, Seager e seus colegas desejaram adicionar outra possível bioassinatura – o isopreno.
Como Zhan explicou à Universe Today por e-mail: “Nosso grupo de pesquisa no MIT se concentra no uso de uma abordagem holística para explorar todos os gases possíveis como potenciais gás de bioassinatura. Nosso trabalho anterior levou à criação do banco de dados de todas as moléculas pequenas. Prosseguimos para filtrar o banco de dados da ASM para identificar os candidatos a gás de bioassinatura mais plausíveis, um dos quais é o isopreno, usando aprendizado de máquina e abordagens baseadas em dados.”
Como seu primo metano, o isopreno é uma molécula de hidrocarboneto orgânico produzida como metabólito secundário por várias espécies aqui na Terra. Além das árvores decíduas, o isopreno também é produzido por uma ampla variedade de organismos bastante separados nos ramos da evolução – como bactérias, plantas e animais.
Como Seager explicou, isso o torna promissor como uma bioassinatura potencial. “O isopreno é promissor porque é produzido em vastas qualidades pela vida na Terra – tanto quanto a produção de metano! Além disso, uma grande variedade de formas de vida (de bactérias a plantas e animais), aquelas que são distantes evolutivamente entre si, produzem isopreno, sugerindo que pode ser algum tipo de bloco de construção fundamental que a vida em outro lugar também pode produzir.”
Enquanto o isopreno é tão abundante quanto o metano aqui na Terra, o isopreno é destruído pela interação com o oxigênio e os radicais que contêm oxigênio. Por esse motivo, Zhang, Seager e sua equipe optaram por se concentrar em atmosferas anóxicas. Esses são ambientes predominantemente compostos de H2, CO2 e gás nitrogênio (N2), que é semelhante ao que a atmosfera primordial da Terra era composta.
De acordo com suas descobertas, um planeta primordial (onde a vida está começando a surgir) teria isopreno abundante em sua atmosfera.
Esse teria sido o caso na Terra entre 4 e 2,5 bilhões de anos atrás, quando organismos unicelulares eram a única forma de vida e as cianobactérias fotossintéticas estavam lentamente convertendo a atmosfera da Terra em uma atmosfera rica em oxigênio.
Por volta de 2,5 bilhões de anos atrás, isso culminou no “Grande Evento de Oxigenação” (GEO), que se mostrou tóxico para muitos organismos (e metabólitos como o isopreno).
Foi também nessa época que formas de vida complexas (eucariontes e organismos multicelulares) começaram a emergir. A este respeito, o isopreno poderia ser usado para caracterizar planetas que estão no meio de uma grande mudança evolutiva e estabelecendo as bases para futuros filos animais.
Mas, como Zhang observou, revelar essa bioassinatura em potencial será um desafio, mesmo para o JWST.
“Os cuidados com o isopreno como bioassinatura são: 1. 10x-100x da taxa de produção de isopreno da Terra é necessária para a detecção. 2. A detecção de características espectrais de isopreno no infravermelho próximo pode ser prejudicada pela presença de metano ou outros hidrocarbonetos. A detecção de isopreno será um desafio com o JWST, já que muitas moléculas de hidrocarbonetos compartilham características de espectros semelhantes em comprimentos de onda do infravermelho próximo. Mas os futuros telescópios que focam no comprimento de onda do infravermelho médio serão capazes de detectar características espectrais de isopreno com exclusividade.
Além do JWST, o Telescópio Espacial Nancy Grace Roman (sucessor da missão Hubble) também será levado ao espaço em 2025. Este observatório terá o poder de “cem telescópios Hubbles” e seus filtros infravermelhos recentemente desenvolvidos permitirão caracterizar exoplanetas por conta própria e por meio de colaborações com o JWST e outros “grandes observatórios”.
Existem também vários telescópios terrestres sendo construídos atualmente aqui na Terra, que contarão com sofisticados espectrômetros, coronógrafos e óptica adaptativa (OAs). Estes incluem o Telescópio Extremamente Grande (ELT), o Telescópio Gigante de Magalhães (GMT), o Telescópio de Trinta Metros (TMT). Esses telescópios também serão capazes de conduzir estudos de imagem direta de exoplanetas, e os resultados devem ser inovadores.
Entre instrumentos aprimorados, técnicas e análises de dados em rápido desenvolvimento e melhorias em nossa metodologia, espera-se que o estudo de exoplanetas decole ainda mais.
Além de ter dezenas de milhares de outros disponíveis para estudo (muitos dos quais serão rochosos e “semelhantes à Terra”), as visões sem precedentes que teremos deles nos permitirão ver quantos mundos habitáveis existem lá fora.
Resta saber se isso resultará ou não na descoberta de vida extraterrestre em nosso século.
Mas uma coisa é clara. Nos próximos anos, quando os astrônomos começarem a vasculhar todos os novos dados que terão sobre as atmosferas de exoplanetas, eles terão uma lista abrangente de bioassinaturas para guiá-los.
O trabalho anterior de Seager e Zhan inclui um conceito para uma estufa marciana que poderia fornecer toda a comida necessária para uma tripulação de quatro astronautas por até dois anos. Esta estufa, conhecida como Biosphere Engineered Architecture for Viable Extraterrestrial Residence (BEAVER), ficou em segundo lugar no NASA BIG Idea Challenge 2019. Você pode ler mais sobre isso aqui.