Por Marco Körner
Publicado na Universität Jena
Pesquisadores da Universidade de Jena e do Instituto Max Planck de Astronomia descobriram uma nova pista na busca para entender a origem da vida, mostrando que os peptídeos podem se formar em partículas de poeira sob certas condições semelhantes àquelas encontradas no espaço sideral. Estas moléculas, que são um dos blocos de construção fundamentais de toda a vida existente, dessa forma, podem não ter se originado no nosso planeta, mas em possíveis nuvens moleculares cósmicas.
Cadeias de aminoácidos
Todas as formas de vida existentes consistem na mesma forma de blocos de construção químicos. Estes blocos, por sua vez, incluem os peptídeos, que desempenham várias funções importantes no corpo – como os transportes de substâncias, catalisadores de reações químicas ou formação de estruturas estabilizantes nas células. Os peptídeos consistem em aminoácidos arranjados em uma ordem específica. A idiossincrasia da ordem determina as eventuais propriedades peptídicas.
Qual a origem dessas biomoléculas é uma das questões fundamentais acerca da origem da vida. Aminoácidos, bases nitrogenadas e outros tipos de açúcares encontrados em meteoroides, por exemplo, mostram que essa origem pode ser extraterrestre. No entanto, para um peptídeo ser formado de moléculas de aminoácidos individuais requer condições bem especiais que anteriormente eram consideradas mais prováveis de existir somente na Terra.
O primeiro passo requer água, enquanto o segundo passo não pode haver água
“A água desempenha um papel fundamental na forma convencional em que os peptídeos são formados”, disse o Dr. Serge Krasnokutski do Laboratório de Astrofísica e Grupo de Física de Clusters Computacionais do Instituto Max Planck de Astronomia na Universidade de Jena. Neste processo, aminoácidos individuais se combinam para formar uma cadeia. Quando isso acontece, uma molécula de água deve ser removida toda vez. “Nossos cálculos químico-quânticos mostram que o aminoácido da glicina pode ser formado através de um precursor químico – chamado de amino-ceteno – combinado com com uma molécula de água. De forma simplificada: neste caso, a água deve ser adicionada no primeiro passo da reação, e deve ser removida no segundo”.
Sabendo disso, a equipe liderada pelo físico Krasnokutski foi capaz de demonstrar um caminho para a reação que pode ocorrer em condições cósmicas com a ausência de água.
“Em vez de fazer a reação química convencional em que os aminoácidos são formados, nós queríamos saber se as moléculas de amino-ceteno poderiam ser formadas e se combinarem diretamente para formarem os peptídeos”, disse Krasnokutski, descrevendo a ideia básica por trás da pesquisa. Ele acrescenta: “E nós fizemos isso sob condições que prevalecem em nuvens moleculares cósmicas, ou seja, em partículas de poeira no vácuo, onde os elementos e produtos químicos correspondentes estão presentes de forma abundante: carbono, amônia e monóxido de carbono”.
Em uma câmara de vácuo ultra alto, substratos que servem como modelo para a superfície de partículas de poeira foram colocados juntos com carbono, amônia e monóxido de carbono a cerca de um quadrilionésimo da pressão normal do ar e menos 263 graus Celsius.
“As investigações mostram que, sob certas condições, o peptídeo de poliglicina foi formado de simples reagentes químicos” disse Krasnokutski. “Esses peptídeos, portanto, são formados de aminoácidos de glicina muito simples, e nós observamos diferentes tamanhos. A mais longa forma encontrada consistia de onze unidades de aminoácidos”.
Neste experimento, a equipe alemã também foi capaz de detectar o amino-ceteno que suspeitava estar lá. “O fato de que a reação pode se formar em temperaturas baixas é que as moléculas de amino-ceteno são extremamente reativas. Elas se combinam umas com as outras em uma polimerização efetiva. O produto é a poliglicina”.
O tunelamento quântico pode desempenhar um papel fundamental
“De todas as formas, foi surpreendente para nós que a polimerização do amino-aceno pudesse ocorrer tão facilmente sob tais condições”, disse Krasnokutski. “O motivo disso é que a barreira de energia precisa ser superada para isso ocorrer. No entanto, pode ser que nós tenhamos sido ajudados por um efeito especial da física quântica. Neste passo fundamental, um átomo de hidrogênio muda de lugar. Porém é tão pequeno que, como partícula quântica, não consegue superar a barreira, mas simplesmente atravessá-la, por assim dizer, através do efeito de tunelamento quântico”.
Agora que está claro que não somente aminoácidos, mas também cadeias peptídicas podem ser criadas sob certas condições cósmicas, nós podemos olhar não somente para a Terra, mas também para o espaço ao buscar entender a origem da vida.