Por John Rennie
Publicado na Scientific American
Quando Charles Darwin introduziu a teoria da evolução através da seleção natural 158 anos atrás, os cientistas da época a debateram ferozmente, mas o acúmulo de evidências advindas da paleontologia, genética, zoologia, biologia molecular e outros campos gradualmente estabeleceu o fato da evolução além de qualquer dúvida razoável. Hoje, a batalha foi vencida em todos os lugares – exceto no imaginário popular.
Embaraçosamente, no século XXI, na nação mais cientificamente desenvolvida que o mundo já viu (NT: Naturalmente o autor se refere aos EUA, mas o quadro é pouco diferente no Brasil), criacionistas ainda persuadem políticos, juízes e cidadãos comuns à acreditar que a evolução é falha, uma fantasia pouco sustentada. O lobby para as ideias criacionistas como o “design inteligente” serem ensinadas como alternativas à evolução em aulas de ciência. Enquanto este artigo segue para impressão, o Ohio Board of Education está debatendo se devem delegar esta mudança. Alguns antievolucionistas, como Philip E. Johnson, um professor de direito na University of California at Berkley e autor de Darwin on Trial (“Darwin sob julgamento”), admitem que eles esperam usar a teoria do Design Inteligente como uma “cunha” para reabrir a discussão sobre Deus em aulas de ciência.
Pesquisadores sob cerco podem se ver de forma crescente em uma posição onde precisam defender a evolução e refutar o criacionismo. Os argumentos que criacionistas usam são tipicamente ilusórios e baseados em equívocos (ou mentiras) sobre evolução, mas o número e diversidade das objeções podem colocar até mesmo pessoas bem informadas em desvantagem.
Para ajudar a respondê-las, a lista abaixo refuta alguns dos mais comuns argumentos “científicos” levantados contra a evolução. Também direciona leitores para outras fontes para mais informações e explica porque a “ciência da criação” não tem espaço na sala de aula.
1. Evolução é apenas uma teoria. Não é um fato ou lei científica.
Muitos aprenderam no ensino fundamental que uma teoria fica no meio de uma hierarquia de certeza – acima de uma mera hipótese mas abaixo de uma lei. Porém, cientistas não usam os termos dessa forma. De acordo com a Academia Nacional de Ciências (NAS), uma teoria científica é “uma explicação fortemente sustentada de algum aspecto do mundo natural que pode incorporar fatos, leis, inferências e hipóteses testadas”. Nenhuma quantidade de validação transforma uma teoria em lei, que é uma generalização descritiva sobre a natureza. Enquanto, quando cientistas falam sobre a teoria da evolução – ou a teoria atômica ou a teoria da relatividade – eles não estão expressando nenhuma preservação sobre sua verdade.
Em adição à teoria da evolução, que é a ideia de descendência com modificação, pode-se também falar do fato da evolução. A NAS define um fato como “uma observação que foi repetidamente comprovada e para todos os propósitos é aceita como ‘verdadeira'”. O registro fóssil e outras abundantes evidências testificam que organismos evoluíram com o tempo. Apesar de ninguém ter observado essas transformações, as evidências indiretas são claras, inequívocas e convincentes.
Todas as ciências frequentemente dependem de evidências indiretas. Físicos não podem ver partículas subatômicas diretamente, por exemplo, então eles verificam sua existência ao observar os rastros que deixam em Câmaras de Wilson. A ausência de observações diretas não faz das conclusões dos físicos menos seguras.
2. Seleção Natural é baseada em lógica circular: os mais aptos sobrevivem, e os sobreviventes são considerados mais aptos
“Sobrevivência do mais apto” é uma maneira conversacional de descrever a seleção natural, mas uma descrição mais técnica envolve taxas diferenciais de sobrevivência e reprodução. Ou seja, invés de descrever uma espécie como mais ou menos apta, pode-se descrever quantos descendentes ela deverá deixar em uma dada circunstância. Coloque um par de tentilhões de rápida reprodução e bicos curtos e um par de lenta reprodução de bicos longos em uma ilha cheia de sementes. Em poucas gerações os tendilhões de rápida reprodução controlarão mais recursos. Mas se os de bico longo conseguem romper as sementes com mais facilidade, a vantagem irá favorecer os de reprodução mais lenta. Em um estudo pioneiro nas lhas Galápagos, Peter R. Grant da Princenton University observaram esse tipo de mudanças populacionais vistas na natureza. (Veja o artigo “Natural Selection and Darwin’s Finches”; Scientific American, October 1991.)
A chave é que aptidão adaptativa pode ser definida sem referência à sobrevivência: bicos longos são mais adaptados para quebrar sementes, independentemente de se essa característica tem valor de sobrevivência nessas circunstâncias.
3. Evolução não é científica, porque não é testável ou falseável. Faz observações sobre eventos que não foram observados e não podem ser reproduzidos.
Essa rejeição genérica da evolução ignora distinções importantes que dividem o campo da evolução em duas grandes áreas: microevolução e macroevolução. Microevolução observa mudanças que ocorrem dentro das espécies ao longo do tempo – mudanças que podem ser o prelúdio de especiação, o processo de origem de novas espécies. Macroevolução estuda como grupos taxonômicos acima do nível de espécie mudam. Suas evidências frequentemente são apoiadas no registro fóssil e comparações de DNA para reconstruir como vários organismos podem ser relacionados entre si.
Hoje em dia mesmo a maioria dos criacionistas reconhece que microevolução é sustentada por testes em laboratório (como estudos em células, plantas e moscas) e no campo (Como nos estudos de Grant sobre a evolução de formatos de bicos de tentilhões nas ilhas galápagos). Seleção natural e outros mecanismos – como mudanças cromossomais, simbiose e hibridização – podem efetuar profundas mudanças populacionais ao longo do tempo.
A natureza histórica do estudo macroevolutivo envolve inferências de fósseis e DNA ao invés de observação direta. Porém nas ciências históricas (que incluem astronomia, geologia e arqueologia, além da biologia evolutiva), hipóteses ainda podem ser testadas ao verificar se elas estão de acordo com as evidências físicas e se elas levam à predições verificáveis sobre descobertas futuras. Por exemplo, a evolução implica que entre os mais antigos ancestrais do homem (com uma idade de 5 milhões de anos) e a aparição de humanos anatomicamente modernos (cerca de 100 mil anos atrás), deveríamos encontrar uma sucessão de criaturas hominídeas com características progressivamente menos símias e mais humanas, que é exatamente o que o registro fóssil mostra. Não deveríamos encontrar – e não encontramos – fósseis de humanos modernos em estratos do período jurássico (144 milhões de anos atrás). Biologia evolutiva rotineiramente faz previsões mais refinadas do que essas, e pesquisadores as testam constantemente.
A evolução poderia ser dissuadida de outras maneiras, também. Se nos pudéssemos documentar a geração espontânea de apenas uma forma de vida complexa a partir de matéria inanimada, então pelo menos algumas formas de vida observadas no registro fóssil poderiam ter surgido desta forma. Se alienígenas superinteligentes aparecessem e assumissem crédito pela criação da vida na Terra (ou mesmo de espécies particulares), a explicação puramente evolutiva estaria em dúvida. Mas ninguém foi capaz de produzir tal evidência.
É importante notar que a ideia de falsificacionismo como característica definidora da ciência se originou no filósofo Karl Popper nos anos 1930. Elaborações mais recentes deste pensamento expandiram as interpretações mais restritivas deste princípio exatamente porque ela eliminaria muitos ramos de empenho claramente científico.
4. Cada vez mais cientistas estão duvidando da verdade da evolução.
Nenhuma evidência sugere que a evolução tem perdido adeptos. Pegue qualquer edição de um periódico biológico revisado por pares e você encontrará artigos que suportam e estendem estudos evolutivos ou que abraçam evolução como um conceito fundamental.
Inversamente, publicações científicas sérias que rompem com a evolução são inexistentes. Na metade dos anos 90, George W. Gilchrist da University of Washington pesquisou milhares de periódicos na literatura primária, procurando artigos de design inteligente ou ciência da criação. Em meio a esses centenas de milhares de artigos e relatórios científicos, ele não achou nenhum. Nos últimos dois anos, pesquisas realizadas independentemente por Barbara Forrest da Sourtheast Louisiana University e Lawrence M. Krauss da Case Western Reserve University também não obtiveram resultados.
Criacionistas respondem que a comunidade científica de mente fechada rejeita as suas evidências. Porém, de acordo com os editores da Nature, Science e outros periódicos de destaque, pouquíssimos manuscritos antievolutivos sequer são submetidos. Alguns autores antievolução publicaram artigos em periódicos sérios. Estes artigos, porém, raramente atacam a evolução diretamente ou avançam argumentos criacionistas; no máximo, eles identificam problemas evolutivos como não resolvidos e difíceis (O que ninguém discorda). Em resumo, criacionistas não dão ao mundo científico boa razão para serem levados a sério.
5. As discordâncias entre cientistas evolutivos mostram o quão pouca ciência sólida sustenta a evolução.
Biólogos evolutivos debatem passionalmente diversos tópicos: como especiação ocorre, as taxas de mudanças evolutivas, as relações ancestrais entre pássaros e dinossauros, se os Neandertais eram uma espécie separada dos humanos modernos, e muitas outras. Essas disputas são como as encontradas em qualquer outro campo da ciência. A aceitação da evolução como uma ocorrência factual e um princípio guiador é não obstante universal na biologia.
Infelizmente, criacionistas desonestos mostraram uma disposição para pegar comentários de cientistas fora de contexto para exagerar e distorcer as discordâncias. Qualquer um familiar com os trabalhos do paleontologista Stephen Jay Gould da Harvard University sabe que em além de coautorar o modelo do equilíbrio pontuado, Gould era um dos mais eloquentes defensores e articuladores da evolução. (O equilíbrio pontuado explica padrões no registro fóssil ao sugerir que a maioria das mudanças evolutivas ocorrem em intervalos geologicamente breves – que ainda assim podem representar milhares de gerações). Ainda assim, criacionistas se deleitam em dissecar frases da prosa volumosa de Gould para fazer parecer como se ele tivesse duvidado da evolução, e apresentam o equilíbrio pontuado como se ele permitisse que espécies novas se materializassem de um dia pro outro, ou que pássaros surgissem de ovos de répteis.
Quando confrontado com uma citação de uma autoridade científica que pareça questionar a evolução, insista em ver o contexto da declaração. Quase sempre, o ataque à evolução se provará ilusório.
6. Se humanos descendem dos macacos, por que ainda existem macacos?
Este argumento surpreendentemente comum reflete vários níveis de ignorância sobre evolução. O primeiro erro é que a evolução não diz que humanos descendem dos macacos; ela afirma que ambos possuem um ancestral comum.
O erro mais profundo é que essa objeção é similar à pergunta “Se crianças descendem de adultos, porque ainda existem adultos?”. Novas espécies evoluem ao se desprender das estabelecidas, quando populações de organismos são isoladas do ramo principal de sua família e adquirem diferenças suficientes para se tornarem definitivamente distintas. A espécie parental pode sobreviver indefinitivamente após o ocorrido, ou pode ser extinta.
7. A Evolução não pode explicar como a vida surgiu inicialmente na Terra.
A origem da vida permanece um mistério, mas bioquímicos aprenderam como ácidos nucleicos primitivos, aminoácidos e outros blocos de construção da vida podem ter se formado e se organizado em unidades autorreplicativas, autossustentáveis, fornecendo a fundação para a bioquímica celular. Análises astroquímicas apontam que quantidades dessas substâncias podem ter se originado no espaço e caído na terra através de cometas, um cenário que pode resolver o problema de como estes constituintes surgiram sob as condições que prevaleciam quando nosso planeta era jovem.
Criacionistas às vezes tentam invalidar toda a evolução apontando para a atual inabilidade da ciência em explicar a origem da vida. Mas mesmo se a vida na terra não tivesse uma origem não evolucionária (por exemplo, se alienígenas introduziram as primeiras células bilhões de anos atrás), a evolução desde então teria sido robustamente confirmada através de incontáveis estudos microevolucionários e macroevolucionários.
8. Matematicamente, é inconcebível que algo tão complexo como uma proteína, muito menos uma célula ou humano, poderia surgir por acaso.
O acaso tem um papel na evolução (Por exemplo, nas mutações aleatórias que causam o surgimento de novas características), mas a evolução não depende do acaso para criar organismos, proteínas ou outras entidades. Pelo contrário: A seleção natural, o principal mecanismo conhecido da evolução, leva à mudança não aleatória ao preservar características “desejáveis” (adaptativas) e eliminando características “indesejáveis” (não-adaptativas). Enquanto as forças de seleção permanecerem constantes, a seleção natural pode empurrar a evolução em uma direção e produzir estruturas sofisticadas em tempos surpreendentemente curtos.
Como analogia, considere a sequência de 13 letras “TOBEORNOTTOBE.” Os milhões de macacos hipotéticos, cada um pescando uma frase por segundo, poderiam levar até 78.800 anos para encontrá-la em meio às 26¹³ sequências deste tamanho. Mas nos anos 80, Richard Hardison do Glendale College escreveu um programa computacional que gerava frases aleatórias enquanto preservava as letras individuais que por acaso estavam na posição correta (de fato, selecionando as frases de forma similar à Hamlet). Em média, o programa re-criou a frase em apenas 366 tentativas, menos de 90 segundos. De forma ainda mais incrível, o programa reconstruiu toda a peça de Shakespeare em apenas 4 dias e meio.
9. A segunda lei da termodinâmica diz que sistemas devem ficar mais desordenados com o tempo. Células vivas portanto não poderiam ter evoluído de substâncias químicas inanimadas, e a vida multicelular não poderia ter evoluído dos protozoários.
Esse argumento deriva de uma má compreensão da Segunda Lei. Se fosse válido, cristais minerais e flocos de neve também seriam impossíveis porque eles, também, são estruturas complexas que se formam espontaneamente de partes desordenadas.
A Segunda Lei na verdade afirma que a entropia total de um sistema fechado (Onde nenhuma energia ou matéria entra ou sai) não pode reduzir. Entropia é um conceito físico normalmente descrito casualmente como desordem, mas difere significativamente do uso convencional da palavra.
Mais importante, porém, é que a Segunda Lei permite que partes de um sistema reduzam em entropia enquanto outras partes experimentarão um aumento. Assim, nosso planeta como um todo pode se tornar mais complexo porque o sol despeja luz e calor sobre ele, e a maior entropia associada com a fusão nuclear do sol restaura o equilíbrio. Organismos simples podem alimentar sua ascensão rumo à complexidade ao consumir outras formas de vida e materiais não-vivos.
10. Mutações são essenciais para a teoria evolutiva, mas mutações só podem eliminar funções. Elas não podem produzir novas características.
Ao contrário, a biologia já catalogou muitas características produzidas por mutações pontuais (mudanças em posições precisas do DNA do organismo) – a resistência bacteriana a antibióticos, por exemplo.
Mutações que surgem na família homeobox (Hox) de genes de regulação do desenvolvimento também podem ter efeitos complexos. Genes Hox determinam onde patas, asas, antenas e segmentos corporais devem crescer. Em moscas, por exemplo, a mutação conhecida como antennapedia faz com que pernas cresçam onde as antenas deveriam estar. Esses membros extras não são funcionais, mas sua existência demonstra que erros genéticos podem produzir estruturas complexas, as quais a seleção natural pode então testar para usos possíveis.
Além disso, a biologia molecular descobriu mecanismos para alterações genéticas que vão além de mutações pontuais, e estas expandem as maneiras pelas quais novas características podem surgir. Moléculas funcionais dentro de genes podem ser emendadas em formas novas. Genes inteiros podem ser duplicados no DNA de novos organismos, e as duplicatas são livres para mutar em genes com características novas e complexas. Comparações do DNA com uma grande variedade de organismos indica que foi assim que evoluíram a família de proteínas sanguíneas das Globinas ao longo de milhares de anos.
11. A seleção natural pode explicar a microevolução, mas não pode explicar a origem de novas espécies e ordens mais altas.
Biólogos evolucionistas escreveram extensamente sobre como a seleção natural pode produzir novas espécies. Por exemplo, no modelo alopátrico, desenvolvido por Ernst Mayr da Havard University, se uma população de organismos for isolada do restante de sua espécie por limites geográficos, ela pode ser submetida à pressões seletivas diferentes. Mudanças acumulariam na população isolada. Se essas mudanças se tornarem tão significantes que o grupo isolado não puder ou não se quiser se reproduzir com os indivíduos originais, então o grupo separado estaria reprodutivelmente isolado e a caminho de se tornar uma nova espécie.
Seleção Natural é o mais bem estudado dos mecanismos evolutivos, mas biólogos estão abertos a outras possibilidades. Biólogos estão avaliando o tempo todo o potencial de mecanismos genéticos incomuns em causar especiação ou produzir características complexas em organismos. Lynn Margulis da University of Massachusetts at Amhrest e outros argumentaram que algumas organelas celulares, como as mitocôndrias geradoras de energia, evoluíram através da junção simbiótica com organismos ancestrais. Assim, a ciência é receptiva à possibilidade de evolução resultante de forças além da seleção natural. Porém essas forças precisam ser naturais; elas não podem ser atribuídas às ações de inteligências criativas misteriosas cuja existência, em termos científicos, não foi provada.
12. Ninguém nunca viu uma nova espécie evoluir.
Especiação é provavelmente bastante rara e pode levar séculos. Além disso, reconhecer novas espécies durante o processo formativo pode ser difícil, porque biólogos às vezes discordam sobre como definir uma espécie. A definição mais utilizada, o Conceito das Espécies Biológicas de Mayr, reconhece espécies como comunidades distintas de populações reprodutivamente isoladas – grupos que normalmente não reproduzem ou não podem reproduzir-se fora de sua comunidade. Na prática, esse padrão pode ser difícil de aplicar à organismos isolados por distância ou terreno ou à plantas (e, naturalmente, fósseis não se reproduzem). Biólogos portanto normalmente usam as características físicas e comportamentais dos organismos como pistas de sua espécie.
Mesmo assim, a literatura científica contém sim relatos de aparentes eventos de especiação em plantas, insetos e minhocas. Na maioria destes experimentos, pesquisadores submeteram organismos a vários tipos de seleção – por diferenças anatômicas, comportamento reprodutivo, preferências de habitat e outras – e descobriu que eles haviam criado populações de organismos que não se reproduziam com estrangeiros (ao grupo). Por exemplo, William R. Rice da University of New Mexico e George W. Salt da University of California at Davis demonstraram que se eles classificassem grupos de moscas por suas preferências por certos ambientes e cruzassem essas moscas separadamente ao longo de 35 gerações, as moscas resultantes se recusariam a se acasalar com aquelas de um ambiente muito diferente.
13. Evolucionistas não conseguem demonstrar nenhum fóssil transicional – criaturas que são metade réptil e metade pássaro, por exemplo.
Na verdade, paleontologistas sabem de muitos exemplos detalhados de fósseis de formas intermediárias entre vários grupos taxonômicos. Um dos fósseis mais famosos de todos os tempos é o Archaeopteryx, que combina penas e características esqueléticas de pássaros com características de dinossauros. Um rebanho inteiro de outras espécies fósseis com penas, algumas mais aviárias e algumas menos, também já foram encontrados. Uma sequência de fósseis abrange a evolução de cavalos modernos dos pequenos Eohippus. Baleias tinham ancestrais quadrúpedes que andavam na terra, e criaturas conhecidas como Ambulocetus e Rodhocetus ajudaram a fazer essa transição (Ver “”The Mammals That Conquered the Seas”, por Kate Wong, Scientific American, Maio). Conchas fossilizadas rastreiam a evolução de vários moluscos ao longo de milhões de anos. Talvez 20 ou mais hominídeos (Nem todos nossos ancestrais) preenchem a lacuna entre Lucy, a “australophiteca”, e o homem moderno.
Criacionistas, porém, recusam esses estudos fósseis. Eles argumentam que o Archaeopteryx não é o elo perdido entre pássaros e répteis – é só um pássaro extinto com características reptilianas. Eles querem que evolucionistas produzam uma criatura estranha, quimérica, que não possa ser classificada como pertencente a nenhum grupo. Mesmo se um criacionista aceitar um fóssil como uma transição entre duas espécies, ele ou ela costumam então insistir em ver um intermediário entre ele e os outros dois. O pedido frustrante pode prosseguir ad infinitum e colocam um fardo não razoável sobre o sempre incompleto registro fóssil.
Mesmo assim, evolucionistas podem citar ainda mais evidências ao seu favor advindas da biologia molecular. Todos os organismos compartilham a maioria dos mesmos genes, mas como a evolução prediz, a estrutura desses genes e seus produtos divergem entre as espécies, de acordo com suas relações evolutivas. Geneticistas falam do “relógio molecular” que registra a passagem do tempo. Esses dados moleculares também mostram como vários organismos são transicionais dentro da evolução.
14. Seres vivos possuem características fantasticamente complexas – em nível anatômico, celular e molecular – que não poderiam funcionar se fossem menos complexas ou sofisticadas. A única conclusão prudente é que eles são produtos do design inteligente e não da evolução.
Esse “argumento da criação” é a espinha dorsal dos ataques mais recentes à evolução, mas também é um dos mais velhos. Em 1802 o teólogo William Paley escreveu que se alguém encontrasse um relógio de bolso no meio da natureza, a conclusão mais razoável é que alguém o derrubou lá, não que forças naturais o criaram ali. Por analogia, Paley argumentava, as estruturas complexas dos seres vivos devem ser ação de intervenção divina direta. Darwin escreveu em Origem das Espécies uma resposta à Paley: Ele explicou como forças naturais de seleção, agindo sobre caracteres herdados, podiam gradualmente moldar a evolução de estruturas orgânicas complexas.
Gerações de criacionistas tentaram responder Darwin citando o exemplo do olho como uma estrutura que nunca poderia ter evoluído. A capacidade ocular de formar imagens depende da perfeita disposição de suas partes, dizem esses críticos. A seleção natural portanto jamais favoreceria as formas transicionais necessárias durante a evolução dos olhos – afinal, pra que serve meio olho? Antecipando essa crítica, Darwin sugeriu que mesmo olhos “incompletos” podem trazer benefícios (como ajudar uma criatura a se orientar na direção da luz) e portanto promover a sobrevivência para continuar o aperfeiçoamento evolutivo da estrutura. A biologia reivindicou Darwin: pesquisadores identificaram olhos primitivos e órgãos sensíveis à luz ao longo do reino animal e conseguiram até rastrear a historia evolutiva dos olhos através da genética comparativa. (Agora parece que, em várias famílias de organismos, os olhos evoluíram de maneira independente.)
Os atuais defensores do Design Inteligente são mais sofisticados que seus antecessores, mas seus argumentos e objetivos não são fundamentalmente diferentes. Eles criticam a evolução tentando demonstrar que ela não pode explicar a vida como conhecemos e então insistem que a única alternativa sustentável é que a vida foi desenhada por uma inteligência não-identificada.
15. Descobertas recentes provam que mesmo a nível microscópico, a vida tem uma característica de complexidade que não poderia ter surgido pela evolução.
“Complexidade Irredutível” é o grito de guerra de Michael J. Behe da Leigh University, autor do Darwin’s Black Box: The Biochemical Challenge to Evolution. Como um exemplo doméstico de complexidade irredutível, Behe escolhe a ratoeira – uma máquina que não funcionaria se qualquer uma de suas peças estivessem em falta e que as peças não tem valor exceto como partes do todo. O que é verdade para a ratoeira, ele diz, é ainda mais real para o flagelo bacteriano, uma estrutura celular similar à um chicote utilizada para propulsão que opera como um motor de popa. As proteínas que compõem o flagelo são estranhamente arranjadas como componentes de motor, uma articulação comum e outras estruturas como aquelas que um engenheiro humano poderia especificar. A possibilidade que esse mecanismo intrincado possa ter surgido através de modificação evolutiva é basicamente nula, argumenta Behe, e evidenciariam um design inteligente. Ele faz afirmações similares sobre o mecanismo de coagulação humana e outros sistemas moleculares.
Entretanto, biólogos evolucionistas possuem uma resposta à essas objeções. Primeiro, existem flagelos com formas mais simples que as que Behe cita, então não é necessário que todos esses componentes estejam presentes para o flagelo funcionar. Todos os componentes sofisticados do flagelo possuem precedentes na natureza, como descrito por Kenneth R. Miller da Brown University e outros. De fato, toda a montagem do flagelo é extremamente similar à uma organela que o Yersinia pestis, a bactéria responsável pela peste bubônica, usa para injetar toxinas na célula.
A chave é que as estruturas componentes do flagelo, que Behe sugere não possuírem valor além de sua função de propulsão, podem servir múltiplas funções que podem ter ajudado sua evolução. A evolução final do flagelo pode ter envolvido apenas uma nova recombinação de partes sofisticadas que originalmente inicialmente evoluíram com outro propósito. De forma similar, o sistema de coagulação sanguínea parece envolver a modificação e elaboração de proteínas que eram originalmente utilizadas na digestão, de acordo com estudos de Russel F. Doolittle da University of California at San Diego. Logo alguma da complexidade que Behe diz ser prova de um design inteligente não é nem um pouco irredutível.
Complexidade de um tipo diferente – “complexidade especificada” – é o pilar dos argumentos de Design Inteligente de William A. Dembski da Baylor University em seus livros The Design Inference e No Free Lunch. Essencialmente seu argumento é que seres vivos são complexos de uma maneira que processos aleatórios, não-direcionados nunca poderiam produzir. A única conclusão lógica, Dembski afirma, ecoando Paley 200 anos atrás, é que alguma inteligência superhumana criou e moldou a vida.
O argumento de Dembski possui diversos buracos. É errado insinuar que o campo de explicações consiste apenas de processos aleatórios ou designs inteligentes. Pesquisadores em sistemas não-lineares e autômatos celulares na Santa Fe Institute e em outros lugares demonstraram que processos simples, não-direcionados podem gerar padrões extraordinariamente complexos. Alguma da complexidade observada em organismos pode portanto emergir através de fenômenos naturais que nós por hora mal compreendemos. Mas isso é muito diferente de afirmar que a complexidade não poderia ter surgido naturalmente.
“Ciência da criação” é uma contradição de termos. Um princípio central da ciência moderna é o materialismo metodológico – ela procura explicar o universo puramente em termos de mecanismos naturais observados ou testados. Assim, a física descreve o núcleo atômico com conceitos específicos governando matéria e energia, e testa essas descrições experimentalmente. Físicos introduzem novas partículas, como quarks, para expandir teorias apenas quando os dados não podem explicar adequadamente fenômenos observados. As novas partículas não tem propriedades arbitrárias, tampouco – suas definições são fortemente contidas, porque novas partículas precisam se adequar à estrutura vigente da Física.
Em contraste, teóricos do Design Inteligente invocam entidades obscuras que convenientemente possuem quaisquer habilidades necessárias para resolver o mistério em mãos. Invés de expandir a investigação científica, estas perguntas a encerram. (Como alguém refuta a existência de onipotências inteligentes?)
O Design Inteligente oferece poucas respostas. Por exemplo, quando e como um designer inteligente interviu na história da vida? Ao criar o primeiro DNA? Primeira célula? Primeiro humano? Todas as espécies foram “desenhadas”, ou só as iniciais? Proponentes do Design Inteligente frequentemente recusam-se a confrontar estes pontos. Eles nem mesmo fazem tentativas reais de reconciliar as suas ideias disparatas sobre o design inteligente. Invés disso eles argumentam por exclusão – ou seja, eles menosprezam explicações evolutivas como extravagantes e incompletas, e então implicam que só resta uma alternativa baseada no design.
Logicamente, isso é enganador: Mesmo se uma explicação naturalística for falha, não significa que todas sejam. Além disso, não faz uma teoria de design inteligente mais razoável do que outra. Ouvintes são basicamente deixados para preencher as lacunas por conta própria, e alguns indubitavelmente o farão substituindo suas crenças religiosas por ideias científicas.
Repetidas vezes, a ciência mostrou que o naturalismo metodológico pode fazer recuar a ignorância, encontrando respostas cada vez mais detalhadas e informativas para mistérios que antes pareciam impenetráveis: A natureza da luz, as causas de doenças, como o cérebro funciona. A evolução está fazendo a mesma coisa com a charada de como as coisas vivas tomaram suas formas. Criacionismo, sob qualquer nome, não adiciona nenhum valor intelectual ao empenho.