Por Jennifer Chu
Publicado no MIT News
À medida que novos e mais poderosos telescópios piscarem nos próximos anos, os astrônomos poderão apontá-los para exoplanetas próximos, investigando suas atmosferas para decifrar sua composição e buscar sinais de vida extraterrestre. Mas imagine se, em nossa busca, encontramos organismos alienígenas, mas falharmos em reconhecê-los como vida.
Esse é um problema que os astrônomos esperam evitar. Seager, professora de Ciências Planetárias do MIT, está olhando para além de uma visão “terracêntrica” da vida e lançando uma rede mais ampla para entender quais tipos de ambientes além do nosso possam realmente serem habitáveis.
Em um artigo publicado na revista Nature Astronomy, ela e seus colegas observaram em estudos de laboratório que os micróbios podem sobreviver e prosperar em atmosferas dominadas pelo hidrogênio – um ambiente muito diferente da atmosfera rica em nitrogênio e oxigênio da Terra.
O hidrogênio é um gás muito mais leve que o nitrogênio ou o oxigênio, e uma atmosfera rica em hidrogênio se estenderia muito mais longe de um planeta rochoso. Poderia, portanto, ser mais facilmente descoberto e estudado por telescópios poderosos, em comparação com planetas com atmosferas mais compactas e semelhantes à Terra.
Os resultados de Seager mostram que formas simples de vida podem habitar planetas com atmosferas ricas em hidrogênio, sugerindo que, uma vez que telescópios da próxima geração como o James Webb Space Telescope da NASA entrem em operação, os astrônomos podem querer procurar primeiro por exoplanetas dominados por hidrogênio em busca de sinais de vida.
“Existe uma diversidade de mundos habitáveis por aí, e confirmamos que a vida como a da Terra pode sobreviver em atmosferas ricas em hidrogênio”, diz Seager. “Devemos, definitivamente, adicionar esses tipos de planetas ao menu de opções ao pensar na vida em outros mundos e realmente tentar encontrá-la”.
Atmosfera em evolução
No início da Terra, há bilhões de anos, a atmosfera parecia bem diferente do ar que respiramos hoje. O jovem planeta ainda não possuía oxigênio e era composto por uma sopa de gases, incluindo dióxido de carbono, metano e uma fração muito pequena de hidrogênio. O gás de hidrogênio permaneceu na atmosfera por possivelmente bilhões de anos, até o que é conhecido como o grande evento de oxidação e o acúmulo gradual de oxigênio.
A pequena quantidade de hidrogênio que resta hoje é consumida por certas linhas antigas de microrganismos, incluindo metanogênicos – organismos que vivem em climas extremos, como no fundo do gelo ou no solo do deserto, e devoram hidrogênio, juntamente com dióxido de carbono, para produzir metano.
Os cientistas estudam rotineiramente a atividade de metanogênicos cultivados em laboratório com 80% de hidrogênio. Mas existem muito poucos estudos que exploram a tolerância de outros micróbios a ambientes ricos em hidrogênio.
“Queríamos demonstrar que a vida sobrevive e pode crescer em uma atmosfera de hidrogênio”, diz Seager.
Um espaço livre de hidrogênio
A equipe estudou em laboratório a viabilidade de dois tipos de micróbios em um ambiente com 100% de hidrogênio. Os organismos que eles escolheram foram a bactéria Escherichia coli, uma simples procariota e a levedura, uma eucariota mais complexa, que não havia sido estudada em ambientes dominados por hidrogênio.
Ambos os micróbios são organismos-modelo padrão que os cientistas estudam e caracterizam há muito tempo, o que ajudou os pesquisadores a projetar seu experimento e entender seus resultados. Além disso, a E. coli e a levedura podem sobreviver com e sem oxigênio – um benefício para os pesquisadores, pois eles poderiam preparar seus experimentos com qualquer organismo ao ar livre antes de transferi-los para um ambiente rico em hidrogênio.
Em seus experimentos, eles cultivaram separadamente culturas de levedura e E. coli, e depois injetaram as culturas com os micróbios em recipientes separados, preenchidos com um “caldo” ou cultura rica em nutrientes dos quais os micróbios poderiam se alimentar. Eles, então, expeliram o ar rico em oxigênio nos recipientes e encheram o “espaço superior” restante com um certo gás de interesse, como um gás de 100% de hidrogênio. Então, eles colocaram os recipientes em uma incubadora, onde foram agitados suave e continuamente para promover a mistura entre os micróbios e os nutrientes.
A cada hora, um membro da equipe coletava amostras de cada frasco e contava os micróbios vivos. Eles continuaram a contar as amostras por 80 horas. Seus resultados representaram uma curva de crescimento clássica: no início da contagem, os micróbios cresceram rapidamente em número, alimentando os nutrientes e povoando a cultura. Eventualmente, o número de micróbios diminuiu. A população, ainda próspera, permaneceu estável, à medida que novos micróbios continuaram crescendo, substituindo os que morreram.
Seager reconhece que os biólogos não consideram os resultados surpreendentes. Afinal, o hidrogênio é um gás inócuo e, como tal, não é inerentemente tóxico para os organismos.
“Não é como se tivéssemos enchido o espaço com um veneno”, diz Seager. “Mas é preciso ver para acreditar, certo? Se alguém nunca os estudou, especialmente os eucariotas, em um ambiente dominado por hidrogênio, você desejaria fazer o experimento para acreditar”.
Ela também deixa claro que o experimento não foi projetado para mostrar se os micróbios podem depender do hidrogênio como fonte de energia. Em vez disso, o objetivo era demonstrar que uma atmosfera com 100% de hidrogênio não prejudicaria ou mataria certas formas de vida.
“Eu não acho que ocorreu aos astrônomos que poderia haver vida em um ambiente de hidrogênio”, diz Seager, que espera que o estudo incentive uma conversa cruzada entre astrônomos e biólogos, particularmente como a busca por planetas habitáveis e vida extraterrestre.
Um mundo de hidrogênio
Os astrônomos não são capazes de estudar a atmosfera de pequenos exoplanetas rochosos com as ferramentas disponíveis hoje. Os poucos planetas rochosos próximos que eles examinaram não possuem atmosfera ou podem ser simplesmente pequenos demais para serem detectados nos telescópios atualmente disponíveis. E enquanto os cientistas levantam a hipótese de que os planetas poderiam abrigar atmosferas ricas em hidrogênio, nenhum telescópio operacional tem a resolução necessária para identificá-las.
No entanto, se os observatórios da próxima geração forem direcionados para a observação de mundos terrestres dominados por hidrogênio, os resultados de Seager, pelo menos, justificarão a chance de que haja vida prosperando lá dentro.
Quanto à aparência de um planeta rochoso e rico em hidrogênio, ela faz uma comparação com o pico mais alto da Terra, o Monte Everest. Os caminhantes que tentam caminhar até o pico ficam sem ar, devido ao fato de que a densidade de todas as atmosferas diminui exponencialmente com a altura e com base na distância de queda da nossa atmosfera dominada por nitrogênio e oxigênio. Se uma alpinista estivesse escalando o Everest em uma atmosfera dominada por hidrogênio – um gás 14 vezes mais leve que o nitrogênio -, ela seria capaz de subir 14 vezes mais antes de ficar sem ar.
“É meio difícil de entender, mas esse gás leve apenas torna a atmosfera mais expansiva”, explica Seager. “E para os telescópios, quanto maior a atmosfera for comparada ao pano de fundo da estrela de um planeta, mais fácil será detectar”.
Se os cientistas tiverem a chance de pesquisar um planeta tão rico em hidrogênio, Seager imagina que eles possam descobrir uma superfície diferente, mas não irreconhecível da nossa.
“Estamos imaginando que, se você se aprofundar na superfície, provavelmente encontraria minerais ricos em hidrogênio, em vez do que chamamos de oxidados, e também oceanos, pois pensamos que toda a vida precisa de algum tipo de líquido, e você, provavelmente, ainda poderá ver um céu azul”, diz Seager. “Ainda não pensamos em todo o ecossistema. Mas não precisa necessariamente ser um mundo diferente”.