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A caça aos buracos negros

Por Gustavo Romero
Publicado na
Ciencia del Sur

Os buracos negros são os objetos mais extraordinários que existem no universo.

Originalmente preditos utilizando a teoria da relatividade geral, formulada por Albert Einstein, em 1915, a evidência sobre a sua existência tem aumentado dramaticamente nos últimos anos. Em questão de meses será possível obtermos a primeira imagem direta deles.

O que é um Buraco Negro?

São regiões onde a concentração de matéria é tal que a estrutura geométrica do próprio espaço curva-se sobre si mesma e separa a matéria do resto do universo.

Na região interior do buraco nada pode escapar para o exterior, nem mesmo a luz. Daí o nome que é dado: eles são literalmente negros.

Os buracos negros são objetos extremamente compactos: um buraco com a massa do Sol medirá apenas 3km do raio, em comparação com quase 700 mil km que mede o próprio Sol.

A superfície do buraco negro não é sólida, é apenas um limite no espaço de tal forma que nada que tenha cruzado pode voltar. Essa característica é chamada de “horizonte de eventos”: do lado de fora não podemos ver nada sobre o que acontece do lado de dentro.

O que cai no buraco é inevitavelmente separado do resto do universo. Essa propriedade faz com que os buracos negros cresçam à medida que engulam as coisas. O que cai permanece preso e aumenta a massa do buraco. Quanto maior é a sua massa, maior será o seu horizonte de eventos.

Em nossa galáxia, conhecemos buracos negros de várias massas solares que formam parte de sistemas binários com outras estrelas. A matéria da estrela flui para o buraco dando lugar a uma transferência de massa que tem efeitos observáveis a partir da Terra. Uma vez que a estrela desaparece, o buraco negro continua existindo, vagando sozinho pelo espaço, imperceptível exceto pelos efeitos de seu campo gravitacional.

No ano passado, a colaboração LIGO, que opera um detector de ondas gravitacionais com duas estações nos Estados Unidos, detectou os efeitos produzidos por dois buracos negros de 36 e 29 massas solares ao colidirem uns com os outros em uma galáxia distante a 410 megaparsec (a uns 1.500 milhões de anos-luz).

Os buracos formavam um sistema binário que encolheu por perda de energia, que significa a emissão de ondas. Na etapa final, eles colidiram, formando um único buraco de umas 60 massas solares. No processo, eles emitiram uma enorme quantidade de ondas, que podem ser pensadas como perturbações no espaço-tempo produzidas pela colisão. Isso é o que a LIGO detectou em 14 de setembro de 2015 (o resultado foi anunciado em fevereiro de 2016).

Concepção artística de dois buracos negros em um sistema binário e a perturbação causada no espaço-tempo. Crédito: LIGO.

Em busca do Superburaco do centro da galáxia

A detecção da LIGO é indireta no sentido de que o que se observa não são os buracos negros em si, mas, sim, as ondas produzidas no espaço-tempo.

Uma coalizão internacional de astrônomos com seus instrumentos, que compõem o chamado Event Horizon Telescope, ou EHT (“Telescópio de Horizonte de Eventos”), buscará, agora, a observação direta de um buraco negro supermassivo do centro de nossa galáxia.

Um enorme buraco no espaço-tempo localizado no centro vibrante da Via Láctea. Sua massa é enorme: cerca de 4 milhões de vezes ao do Sol. O tamanho de seu horizonte de eventos atinge 12 milhões de quilômetros.

Em torno do buraco negro espirala-se o gás que há na região central galáctica, que a medida que é engolido emite radiação eletromagnética. Parte dessa radiação é produzida na faixa de micro-ondas. Os astrônomos utilizaram uma combinação de vários radiotelescópios que estão localizados em diferentes partes do planeta para formar uma gigantesca rede (chamada “interferômetro”) para obter uma imagem do gás que está girando em torno do buraco.

Como o buraco distorce em seu entorno o espaço e o tempo, a imagem aparecerá altamente deformada de acordo com as predições da relatividade geral. É possível usar um supercomputador para reconstruí-la. O que os astrônomos esperam ver é a sombra do buraco negro recortada sobre um fundo luminoso produzido pelo gás. A luz que se move em torno do buraco não segue linhas retas como na Terra, mas, sim, trajetórias curvadas pela enorme atração gravitacional. Por isso, a imagem será bem incomum. Analisando a sua forma exata e comparando com as imagens calculadas teoricamente seremos capazes de avaliar o quão boas são as predições da relatividade em um sistema onde a gravidade é extremamente forte.

Os radiotelescópios submilimétricos utilizados pela EHT estão em Mount Graham (Arizona), Califórnia, Havaí, Chile, México e o Polo Sul. Durante o mês retrasado, de 5 a 14 de abril, os astrônomos tiraram uma imagem profunda do centro galáctico.

Levará alguns meses para poder processá-la até chegar a uma identificação clara. Se tiverem sucesso, será a primeira vez que um buraco negro, ou melhor, sua sombra, será visto de forma direta pelos cientistas. Com o que observam, os astrônomos poderão realizar um novo teste da teoria de Einstein, que tem resistida até agora sob os diversos testes das quais ela foi submetida. Será que ela continuará resistindo aos novos testes?

Imagem simulada por computador do buraco negro que está no centro da galáxia. Crédito: Scott Noble.
Gustavo Esteban Romero

Gustavo Esteban Romero

Gustavo E. Romero tem doutorado em física pela Universidade Nacional de la Plata. Atualmente, é Professor Titular de Astrofísica Relativística na Faculdade de Ciências Astronômicas e Geofísicas da UNLP e Investigador Superior do CONICET, Argentina, com lugar de trabalho no Instituto Argentino de Radioastronomia, onde dirige o Grupo de Astrofísica Relativística e Radioastronomia (GARRA). Foi presidente da Associação Argentina de Astronomia, Professor Visitante das universidades de Paris VII, Barcelona, Karlsruhe, Gunagzhou, Hong Kong e UNAM, entre outras, assim como cientista convidado em mais de 20 instituições científicas ao redor do mundo. Publicou mais de 350 artigos de ciência e filosofia e 10 livros. Seus principais interesses acadêmicos se concentram na astrofísica relativística, na filosofia científica, na cosmologia e no cinema. Vive na cidade de La Plata, Argentina.