Por Carly Cassella
Publicado no ScienceAlert
Se algum animal fosse dito ter nascido do ventre da Terra, poderia muito bem ser a cigarra periódica.
O ‘nascimento’ em massa sincronizado deste incrível inseto é um dos maiores mistérios não resolvidos do mundo natural.
Na América do Norte, ninhadas de cigarras juvenis, chamadas ninfas, desenvolvem-se silenciosamente no solo, sugando a seiva através das raízes das árvores.
Presos a esse ‘cordão umbilical’, os insetos alados podem passar treze ou dezessete anos se desenvolvendo (dependendo da espécie), antes de finalmente entrar no mundo acima.
O que é ainda mais estranho é que todos os indivíduos de uma ninhada regional ‘nascem’ mais ou menos ao mesmo tempo, ‘gritando’ como bebês – não por suas mães, mas por parceiros em potencial.
Em 2020, mais de um milhão de cigarras irromperam do subsolo após 17 anos no sudoeste da Virgínia, partes da Carolina do Norte e Virgínia Ocidental, criando uma cacofonia.
Alguns meses depois, tudo estava em silêncio novamente. Os insetos acasalaram e morreram, e a próxima geração já está se desenvolvendo no subsolo, para emergir apenas em 2037.
Apesar de as cigarras periódicas (do gênero Magicicada) estarem entre os insetos mais estudados em evolução e ecologia, ninguém sabe como ou por que fazem isso.
A temperatura do solo e os nutrientes que as ninfas obtêm das raízes das árvores podem indicar a passagem das estações, mas isso só é relevante para um único ano no subsolo. Como elas contam até 17?
“Não está totalmente claro como seus ciclos de vida periódicos são controlados”, escreveu o zoólogo Teiji Sota em um artigo de 2022 sobre cigarras periódicas.
Nenhum outro animal tem um ciclo de vida tão longo, fixo e sincronizado, onde a reprodução ocorre em massa e apenas uma vez na vida.
Então, por que a cigarra?
Uma teoria importante é que o ciclo de vida extremo da cigarra ajuda a reduzir a predação. Ao passar até 99,5% de sua vida no subsolo como ninfa, adultos indefesos e desajeitados evitam se expor a predadores como répteis, pássaros e pequenos e grandes mamíferos.
Nesse caso, encontrar um parceiro é muito mais fácil e seguro se todos os insetos surgirem ao mesmo tempo.
Mas as Magicicada não são as únicas cigarras que enfrentam o risco de predadores, então por que seu estilo de vida é tão raro?
Alguns cientistas acham que a temperatura pode desempenhar um papel fundamental.
Em ambientes frios, os modelos mostram que “estágios juvenis extremamente longos levam a densidades adultas extremamente baixas, limitando as oportunidades de acasalamento e favorecendo a evolução da emergência sincronizada”.
Talvez o estilo de vida da cigarra seja um resquício evolutivo de tempos muito mais frios.
Com o aquecimento global, os cientistas notaram que algumas cigarras estão surgindo quatro anos antes do normal.
Mas é aqui que todo o mistério fica realmente curioso. O ciclo de vida de uma ninhada pode ser ajustado.
A metamorfose adulta das Magicicada, da qual existem sete espécies, é flexível em mais ou menos quatro anos.
Isso significa que os adultos tendem a emergir no final de abril e início de junho aos 9, 13, 17 ou 21 anos de idade, dependendo da espécie. Mas como uma ninhada sabe quando é a hora certa de acordar? Ou para relaxar um pouco mais?
Talvez elas tenham atingido um peso crítico ou um marco de desenvolvimento que as leve à idade adulta.
Ou talvez elas tenham algum tipo de relógio biológico de 4 anos que reavalie o estado de desenvolvimento da criatura em um ciclo regular.
Sota acha que é uma mistura de todos esses fatores.
“Em essência”, escreveu ele, “o momento da emergência do adulto (metamorfose) é determinado pela interação do relógio interno, taxa de crescimento determinada geneticamente e peso corporal crítico”.
Mais estudos do genoma são necessários para apoiar essa hipótese, mas com base no progresso recente, Sota acredita que o mistério das Magicicada será resolvido na próxima década.