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A jornada de Alexandre, o Grande – Parte I

1. Introdução e precedentes históricos

Em aulas básicas de história, ensina-se que a Grécia Antiga foi uma das nascentes mundiais de pensamento filosófico, religioso e político. Lá, pessoas como Sócrates, Pitágoras, Aristóteles e Platão trilharam o caminho das virtudes e deixaram rastros indeléveis de apreço pela razão humana. Na literatura clássica, Homero, Sófocles e Ésquilo, por exemplo, se imortalizaram por obras que, embora com alguma margem de incerteza quanto à legitimidade da autoria, podem a eles ser atribuídas. Há ainda lições sobre a exuberante Atenas e seus primeiros sinais de pulsação democrática, cujo aperfeiçoamento se faz ininterrupto em nossa sociedade. Passaram-se milênios após o surgimento de tão majestosa civilização, e, em vez de ofuscar-se no tempo, sua valorosa presença no mundo moderno fez-se irrevogável.

Vários são os fatores envolvidos nesse processo. Além do próprio mérito inerente à arte e ao esplendor da mitologia representada por maravilhas arquitetônicas, os insaciáveis debates políticos e filosóficos contagiaram numerosos reis do passado que incorporaram a tradição helênica em seus governos. Nesse aspecto, o Império Alexandrino talvez tenha sido o mais resoluto da Antiguidade, não só em termos de extensão territorial, mas por irradiar o idioma e o arcabouço cultural grego a povos inimaginavelmente distantes. Em lugares do continente asiático e africano por onde passou, Alexandre, o Grande, semeou o modo de vida helênico por considerá-lo superior a tudo o que havia em sua época. Logo sua hegemonia se consagrou como precursora do Helenismo, fase histórica em que as ideias e costumes do orientais e ocidentais se misturaram.

Alguns argumentam que a opulência desse repertório cultural é resultado de um milagre puramente grego; outros suspeitam de plágio contra a essência milenar da sabedoria oriental, por meio da qual constituíram a filosofia da antiga Grécia. Mas um terceiro ponto de vista estabelece relações menos incompatíveis e mais confraternizadas entre as duas opiniões. Afinal, os gregos não evoluíram de modo isolado, e, tanto quanto os egípcios, babilônios, indianos e persas, gozavam de certa peculiaridade e autonomia intelectual. Eles também estiveram à mercê de desafetos e aliados, fossem internos ou externos. Por mais de um século, o principal inimigo da Grécia foi o imponente Império Persa, fundado sob a dinastia Aquemênida de Ciro, o Grande, no século VI a.C.

O embate greco-pérsico, compreendido no período das Guerras Médicas ocorridas ao longo do século V a.C., foi uma reação belicosa dos reis da Pérsia contra a Revolta Jônica, que consistiu na insurreição de colônias gregas da Ásia Menor, bem como na luta dos povos jônios daquela região para se emanciparem do domínio medo-persa. Isso prenuncia dramáticos surtos de instabilidade em solo grego, seguidos de constantes desavenças internas, tais como a Guerra de Peloponeso, datada no final do século V a.C. Nesse episódio, Atenas e Esparta guerrearam entre si, cada uma disposta a tornar-se potência local e estender sua supremacia às demais cidades-estados gregas.

Por vários anos, essas querelas sangrentas acentuaram a crise política da Grécia e fragilizaram o vínculo diplomático entre líderes atenienses, espartanos e tebanos. À medida que a situação se agravava, mais vulneráveis eles ficavam ante a ameaça de invasões estrangeiras. Entretanto, tudo isso mudou quando Filipe II assumiu o reino da Macedônia em 359 a.C. As primeiras medidas que ele adotou ampliaram o alistamento militar aos jovens macedônios e revolucionaram as táticas de formação em batalha, auxiliadas por equipamentos de guerra em permanente evolução. Não bastassem tais façanhas, Filipe ainda propôs que a saída da crise estava em unificar a Grécia e formar uma liga pan-helênica sob seu comando, para então derrotar o Império Persa e explorar os ricos e desconhecidos limites da Ásia.

Um projeto de governo tão robusto como esse demandaria décadas, talvez séculos para se cumprir. Se quisesse ver seu legado perdurar por tanto tempo, o rei precisaria infundir seus propósitos num sucessor incorruptível e obstinado, alguém tão disciplinado e poderoso como um deus. Em 356 a.C., nasce, então, na capital macedônica chamada Pela, Alexandre III, filho de Olímpia e herdeiro do trono. O jovem príncipe não apenas realizaria os planos de seu pai, como alimentaria, insaciavelmente, suas próprias ambições. Alexandre tencionou criar um mundo novo dentro de um único império, e para isso dedicaria sua vida à erudição e ao aperfeiçoamento de inexpugnáveis estratégias de combate. O que torna sua história tão formidável e impactante, o que o transformou em “o Grande”, isso é o que descobriremos nos próximos textos.

Leia: parte II e parte III.

Ricardo Silas

Ricardo Silas

Estudante de História (UFRB), 25 anos.