Pular para o conteúdo

A Lua pode ter defendido a Terra primitiva do Sol

Por Michelle Starr
Publicado na ScienceAlert

A Terra primitiva não era um bom lugar para a vida.

No início, há cerca de 4,5 bilhões de anos, quando a Terra era apenas um planeta recém-formado quente e frágil, Theia – um objeto do tamanho de Marte – colidiu com ela, enviando pedaços para o espaço e aquecendo a Terra a milhares de graus.

Então, cerca de 4 bilhões de anos atrás, o Sistema Solar estava passando por um período chamado de Intenso Bombardeio Tardio, no qual asteroides golpeavam de forma brutal os planetas telúricos do Sistema Solar. Sob este ataque, a Terra permaneceu quente e com sua superfície derretida.

Enquanto isso, o Sol, embora muito mais escuro e frio do que é hoje, estava passando por seus terríveis anos de criança, castigando o espaço ao redor com violentas e poderosas erupções e com ventos solares selvagens. Nessas condições, é incrível que a Terra tenha conseguido reter o suficiente de sua atmosfera para evoluir para um mundo hospitaleiro à vida.

De fato, podemos agradecer a Theia (pelo menos, parcialmente). Os pedaços da Terra que se separaram desse evento passaram a formar a Lua. E uma nova pesquisa mostra que o campo magnético da Lua poderia ter protegido a Terra de todo o impacto da fúria do Sol.

“A Lua parece ter servido como uma barreira protetora substancial contra o vento solar enviado para a Terra, o que foi fundamental para a capacidade da Terra de manter sua atmosfera durante este tempo”, disse o físico Jim Green, cientista-chefe da NASA e principal autor do novo estudo.

Costumávamos pensar que a Lua era um pedaço de rocha mais ou menos sem importância. Ela não tem um campo magnético agora, então presumíamos que nunca teve um, já que é tão pequena e pode não ter mantido o efeito dínamo necessário.

Mas quando enviamos astronautas para lá nas décadas de 1960 e 1970, as rochas que eles trouxeram mostraram evidências de magnetismo – prova de que a Lua já teve um campo magnético muito parecido com o da Terra.

O campo magnético da Terra é o resultado de um dínamo – um fluido condutor de eletricidade em rotação e convecção que converte energia cinética em energia magnética, formando um campo magnético para o espaço ao redor do planeta. Esse fluido é o núcleo de ferro fundido da Terra.

Quando foi recém-formada, evidências crescentes sugerem que a Lua também era quente o suficiente para ter um centro viscoso, um núcleo de ferro fundido próprio. Os cientistas acreditam que ela foi capaz de manter um campo magnético até cerca de 1 a 2,5 bilhões de anos atrás, quando esfriou a ponto de solidificar o núcleo de ferro.

“É como assar um bolo: você tira do forno e ainda está esfriando”, disse Green. “Quanto maior a massa, mais tempo leva para esfriar”.

A relação Terra-Lua naqueles primeiros dias era muito mais próxima do que é hoje. Por volta de 4 bilhões de anos atrás, a Lua estava a apenas 130.000 quilômetros de distância – cerca de um terço de sua distância atual de 384.400 quilômetros. A Terra também estava girando mais rápido: um dia durava apenas cinco horas. À medida que a rotação do planeta desacelera, a Lua recua a uma taxa de cerca de 3,82 centímetros por ano – é um processo contínuo.

Green e sua equipe queriam saber como o campo magnético da Lua interagiria com o da Terra nessas condições do passado. Então, eles projetaram um modelo computacional para simular isso.

Eles descobriram que os campos magnéticos dos dois corpos foram conectados por meio dos polos. Este campo magnético unido, às vezes, teria protegido a Terra de ter sua atmosfera despojada pelo vento solar.

Terra, Lua e seus campos magnéticos unidos. Crédito: NASA.

Curiosamente, também pode ter havido um pouco de troca de atmosfera. Evidências recentemente descobertas sugerem que a Lua tinha uma atmosfera própria entre 3,5 a 4 bilhões de anos atrás, devido à atividade vulcânica, mantida pelo campo magnético lunar. Mas o nitrogênio encontrado no regolito lunar confundiu os cientistas, já que deve ter vindo de fora.

As simulações da equipe sugerem que a Terra e a Lua podem ter trocado gases atmosféricos, sendo isso uma solução para o quebra-cabeça do nitrogênio lunar.

Essas simulações indicam que os dois campos magnéticos permaneceram unidos até cerca de 3,5 milhões de anos atrás. É uma descoberta muito interessante que corresponde ao tempo da atmosfera lunar e também à força do campo magnético, que teria atingido seu pico há cerca de 4 bilhões de anos.

A equipe espera que novas amostras obtidas em missões lunares forneçam mais informações. De particular interesse são as regiões em sombra permanente nos polos. Elas podem reter oxigênio e nitrogênio retirados da atmosfera da Terra que teriam sido destruídos pela forte radiação solar em outros lugares.

Isso é interessante, porque mostra que as condições de habitabilidade podem depender de muito mais do que um certo tipo de planeta (rochoso) a uma certa distância (nem muito quente, nem muito frio) orbitando um certo tipo de estrela. Outra pesquisa recente sugere que a presença de um gigante gasoso no mesmo sistema também pode ser crucial, por causa de sua influência gravitacional no planeta e em objetos potencialmente perigosos quem vêm de fora do sistema.

Descobrir quais características da Terra e do Sistema Solar desempenham um papel importante na habitabilidade nos ajudará a limitar onde procurar por vida extraterrestre.

Mas aprender sobre a Lua também é importante.

“Compreender a história do campo magnético da Lua nos ajuda a entender não apenas como eram as possíveis atmosferas iniciais, mas como o interior lunar evoluiu”, disse o astrônomo e cientista-chefe da NASA, David Draper.

“Isso nos revela sobre como o núcleo da Lua poderia ter sido – provavelmente, uma combinação de metal líquido e sólido em algum ponto de sua história – e essa é uma peça muito importante do quebra-cabeça de como a Lua funciona por dentro”.

A pesquisa foi publicada na Science Advances.