Por Javier Yanes
Publicado na Open Mind
Se existe um cientista que quase qualquer pessoa saberia reconhecer, sem dúvida, esse alguém é Albert Einstein. Como relatou Jürgen Neffe em sua biografia, Einstein foi o primeiro cientista midiático da história, promovido à categoria de ídolo quando o jornal londrino The Times divulgou, em 1919, que a teoria da relatividade geral tinha sido demonstrada graças às fotografias de um eclipse do Sol que revelava a curvatura da luz das estrelas, como o físico tinha predito.
Einstein recebeu o Nobel de Física em 1921. Mas, embora seu tenha sido miticamente ligado à sua teoria da relatividade e à sua famosa equação E=mc², não foi essa conquista que o fez digno do prêmio, mas sua explicação do efeito fotoelétrico, um fenômeno que Heinrich Hertz tinha observado em 1887. Em 1905, Einstein descreveu como a luz arrancava do metal pacotes discretos de energia, chamado quanta. A ideia dos quanta de luz foi o germe da revolução científica, que nas primeiras décadas do século XX levaria ao desenvolvimento da mecânica quântica.
Apesar de ter o caminho para uma nova física, Einstein manteve uma estranha relação de suspeita com a visão de quem conduziu esse vibrante campo da ciência. Físicos como Heisenberg ou Schrödinger introduziram com total naturalidade conceitos que se afastaram do realismo clássico, como a ação que determina as propriedades do sistema, ou que um átomo poderia estar intacto ou desintegrado ao mesmo tempo (ou um gato vivo e morto ao mesmo tempo, no exemplo metafórico mais famoso do Schrödinger).
“Deus não joga dados”
Mas para Einstein, essa dependência da probabilidade sugeria uma ignorância das leis envolvidas que governam a realidade. “Estou convencido de que ele [Deus] não joga dados”, escreveu ele em uma carta ao próprio físico Max Born. Em outra ocasião, ele perguntou ao seu biógrafo Abraham Pais se ele acreditava que a Lua só existia quando a miravam.
Em 1935, Einstein publicou, junto com seus colegas Boris Podolsky e Nathan Rosen, um experimento mental que conhecemos hoje como o paradoxo de EPR. Existe a possibilidade de que duas partículas compartilhem suas propriedades, como se fossem gêmeas. Mas se, como defendia a majoritária corrente da quântica, a ação de um observador sobre uma delas deveria influir em outra, isso implicaria que existia uma comunicação instantânea entre ambas. Em que, argumentou Einstein e seus colaboradores, rompia o inquebrável limite da velocidade da luz. Deveria existir, portanto, “variáveis ocultas”, segundo as quais o sistema obedecia a um tipo de programação anterior.
Em conclusão, a mecânica quântica não estava errada, pensava Einstein; simplesmente estava incompleta. Da mesma forma que a relatividade geral tinha descrito o tecido do espaço-tempo que ligava os corpos entre si, eliminando a necessidade de uma ação gravitacional à distância que tinha desconcertado o próprio Isaac Newton, Einstein acreditava que essas variáveis ocultas no ambiente local das partículas, antes de sua separação, explicariam seu comportamento posterior, sem recorrer ao que chamou de “ação fantasmagórica à distância”.
Uma discussão de décadas
O paradoxo de EPR alimentou vívidas discussões entre os físicos durante décadas, mas foi em 1964, quando o norte-irlandês, John Stewart Bell, descartou a existência de variáveis ocultas que poderiam explicar o que agora conhecemos como emaranhamento quântico. Como consequência do teorema de Bell, concluiu-se que existia uma ação à distância não local entre as partículas.
No entanto, a declaração de Bell não resolveu o debate. Em anos posteriores, outros físicos assumiram a tarefa de cobrir as possíveis lacunas dos experimentos de emaranhamento quântico que poderiam abrir o caminho para outras explicações dentro da visão realista de Einstein. Por exemplo, os críticos argumentaram que os experimentos podem estar enviesados por erros dos aparatos ou vieses dos pesquisadores.
Entre os físicos que tentaram blindar os experimentos de emaranhamento quântico contra possíveis fissuras se encontra Ronald Hansson, da Universidade de Tecnologia de Delft (Holanda). “Os experimentos livres das lacunas de 2015, dos quais o nosso foi o primeiro, fecharam todas as lacunas possíveis”, diz Hanson. “Isso prova a existência do emaranhamento? É melhor dizer o contrário: a visão de causalidade local, ou realismo local, foi provada falsa”, afirma Hanson.
Em defesa do emaranhamento quântico
Mas ainda existem aqueles que sustentam que o curto período de tempo decorrido entre a geração das partículas e sua medição nos experimentos de emaranhamento poderia seguir avaliando a ideia de programação. Um experimento recente tratou de derrubar essa possível fissura medindo fótons procedentes de estrela de até 600 anos-luz de distância; é altamente improvável, defendem os pesquisadores, pensar em uma programação das partículas capaz de durar 600 anos. Para Hanson, não obstante, esses chamados experimentos “cósmicos” de Bell não proporcionam um avanço fundamental, uma que não descartam a influência de variáveis ocultas.
De acordo com David Kaiser, físico do Instituto Tecnológico de Masachusetts e coautor desse último estudo, “ainda é pouco cedo para proclamar que o emaranhamento quântico foi definitivamente provado”. O motivo, expõe Kaiser, é que os últimos experimentos feitos até agora tamparam fissuras de duas em duas, mas não de três ao mesmo tempo. “Mas o progresso recente desse campo parece mais sugestivo do que nunca em favor do emaranhamento quântico”.
Isso significa que o grande Einstein finalmente falhou em desconfiar da quântica? Se os experimentos atuais o fizessem mudar de ideia ou não, só Einstein poderia dizer. Mas, de acordo com sua posição, Hanson diz: “Minha visão é de que Einstein foi um dos primeiros a descobrir as consequências não locais da teoria quântica”, mas “não acreditava que essas consequências pudessem estar certas”. Se tivesse tido a oportunidade de testemunhar os avanços mais recentes, prossegue Hanson, “ele teria aceitado como um fato da natureza; afinal, ele era um homem muito inteligente”.