Pular para o conteúdo

As estrelas mais comuns em nossa galáxia podem ser mais hospitaleiras a vida ​​do que pensávamos

Traduzido por Julio Batista
Original de Evan Gough para o Universe Today

Estrelas anãs vermelhas são o tipo mais comum de estrela em nossa vizinhança e provavelmente na Via Láctea. Por causa disso, muitos dos exoplanetas semelhantes à Terra e potencialmente sustentadores de vida que detectamos estão em órbita ao redor das anãs vermelhas. O problema é que as anãs vermelhas podem exibir um comportamento intenso de erupções, muito mais energético do que nosso Sol relativamente plácido.

Então, o que isso significa para o potencial desses exoplanetas de sustentar a vida?

A maior parte da vida na Terra, e provavelmente em outros mundos, depende da energia estelar para sobreviver. O Sol tem sido o motor da vida na Terra desde a reprodução das primeiras células. Mas às vezes, como todas as estrelas, o Sol mostra sua violência por meio das erupções.

Às vezes, as erupções são extremamente energéticas. A poderosa energia magnética na atmosfera do Sol torna-se instável e uma enorme quantidade de energia é liberada. Se ela for lançada em direção à Terra, pode causar problemas. Isso pode causar interrupções nas comunicações de rádio e até mesmo blackouts.

Mas em termos de atividade de erupções, o Sol é relativamente fraco em comparação com algumas outras estrelas. Algumas estrelas, especialmente as anãs vermelhas, podem ter erupções com mais frequência e violência. Uma equipe de pesquisadores estudou como a atividade das erupções afeta a atmosfera e o potencial de vida em planetas semelhantes à Terra orbitando estrelas de baixa massa, incluindo estrelas do tipo M, estrelas do tipo K e estrelas do tipo G.

Representação artística de uma estrela anã vermelha e suas erupções, orbitada por um exoplaneta. (Créditos: NASA/ESA/G. Bacon/STScI)

O novo estudo é chamado de “Persistence of flare-driven atmospheric chemistry on rocky habitable zone worlds“. O autor principal é Howard Chen, um estudante de doutorado na Universidade do Noroeste (EUA). O artigo foi publicado na revista Nature Astronomy.

“Nosso Sol é um gigante gentil”, disse Allison Youngblood, astrônoma da Universidade do Colorado em Boulder (EUA) e coautora do estudo.

“É mais velho e não tão ativo quanto estrelas mais jovens e menores. A Terra também tem um forte campo magnético, que desvia os ventos prejudiciais do Sol.”

Isso ajuda a explicar por que a Terra está positivamente “permeada com vida”, como Carl Sagan descreveu nosso planeta. Mas para planetas orbitando estrelas de baixa massa como anãs vermelhas (anãs do tipo M), a situação é muito diferente.

Sabemos que as erupções solares e as ejeções de massa coronal associadas podem ser muito prejudiciais às perspectivas de vida em exoplanetas desprotegidos. Os autores escrevem em sua introdução que “a atividade estelar – que inclui erupções estelares, ejeções de massa coronal (EMCs) e eventos de prótons estelares (EPEs) – tem uma profunda influência na habitabilidade de um planeta, principalmente por meio de seu efeito no ozônio atmosférico.”

Uma única erupção aqui e ali ao longo do tempo não tem muito efeito. Mas muitas anãs vermelhas apresentam erupções frequentes e prolongadas.

“Nós comparamos a química atmosférica de planetas que experimentam erupções frequentes com planetas que não experimentam erupções. A química atmosférica de longo prazo é muito diferente”, disse Howard Chen da Universidade do Noroeste, o autor principal do estudo, em um comunicado à imprensa.

“Erupções contínuas realmente conduzem a composição atmosférica de um planeta a um novo equilíbrio químico.”

Uma das coisas que a equipe examinou foi o ozônio e o efeito que as erupções têm sobre ele. Aqui na Terra, nossa camada de ozônio ajuda a nos proteger da radiação ultravioleta do Sol. Mas a atividade extrema de erupções nas anãs vermelhas pode destruir o ozônio na atmosfera dos planetas que orbitam perto dela.

Quando os níveis de ozônio caem, um planeta fica menos protegido da radiação ultravioleta vinda de sua estrela. A poderosa radiação ultravioleta pode diminuir a possibilidade de vida.

Em seu estudo, a equipe usou modelos para ajudar a entender as erupções e seus efeitos nas atmosferas de exoplanetas. Eles usaram dados de erupções do TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite) da NASA e dados climáticos de longo prazo dos exoplanetas de outros estudos. Eles encontraram alguns casos em que o ozônio persistiu, apesar das erupções.

“Descobrimos que erupções estelares podem não impedir a existência de vida”, acrescentou Daniel Horton, autor sênior do estudo. “Em alguns casos, a erupção não destrói todo o ozônio atmosférico. A vida na superfície ainda pode ter uma chance de persistir.”

Esta figura do estudo mostra perfis verticais médios globais de espécies atmosféricas em um planeta simulado em torno de uma estrela do tipo G semelhante ao Sol. Da esquerda para a direita estão as proporções de mistura de ozônio, óxido nitroso, ácido nítrico e vapor d’água. Tradução da imagem: na vertical, a pressão em hPa (pressure [hPa]) e a altitude em km (altitude [km]); na horizontal, a proporção mista (mixing ratio), a pré-erupção (pre-flare), o pico das erupções em 60 dias (flare peak [60 day]) e a média de 300 dias terrestres (300 Earth-day mean). (Créditos: Chen et al, Nature Astronomy, 2020)

Os planetas que podem suportar vida, pelo menos potencialmente, podem estar em uma situação difícil. Eles devem estar próximos o suficiente de suas estrelas para evitar que sua água congele, mas não muito próximos ou eles seriam muito quentes. Mas essa dança coladinha com a estrela pode expô-los a poderosas erupções.

As anãs vermelhas são menores e mais frias do que o nosso Sol, o que significa que a zona habitável para quaisquer planetas que as orbitam é menor e muito mais próxima da estrela do que a Terra está do Sol. Isso não apenas os expõe a erupções, mas também leva a uma situação em que os planetas ficam presos às suas estrelas.

A combinação de erupções com ficar preso pela força de maré pode ser ruim para as perspectivas de vida. A rotação da Terra gera sua magnetosfera protetora, mas os planetas presos pela força de maré não podem gerá-la e são amplamente desprotegidos da radiação ultravioleta estelar.

“Nós estudamos planetas orbitando dentro das zonas habitáveis ​​de estrelas anãs M e K – as estrelas mais comuns do universo”, disse Horton.

“Zonas habitáveis ​​ao redor dessas estrelas são mais estreitas porque as estrelas são menores e menos poderosas do que as estrelas como o nosso Sol. Por outro lado, acredita-se que as estrelas anãs M e K tenham atividade de erupções mais frequente do que o nosso Sol, e é improvável que seus planetas presos pelas força de maré tenha campos magnéticos ajudando a desviar seus ventos estelares.”

Esta figura do estudo mostra como as repetidas erupções estelares podem alterar os gases atmosféricos em um planeta semelhante à Terra simulado em torno de uma estrela semelhante ao Sol. Tradução da imagem: pré-erupção (pre-flare), pico das erupções (flare peak), pós-erupções (post-flare) e média de 300 dias terrestres (300 Earth-day mean). (Créditos: Chen et al, 2020)

Também há um lado mais positivo neste estudo. A equipe descobriu que a atividade de erupções pode realmente ajudar na busca por vida.

As erupções podem facilitar a detecção de alguns gases que são biomarcadores. Nesse caso, eles descobriram que a energia das erupções pode destacar a presença de gases como ácido nítrico, dióxido de nitrogênio e óxido de nitrogênio, que podem ser indicadores de processos vivos.

Esta figura do estudo mostra como as repetidas erupções estelares podem afetar a química atmosférica em um planeta semelhante à Terra modelado em torno de uma estrela do tipo K. Observe os níveis elevados de NO detectável, um potencial biomarcador. Tradução da imagem: pré-erupção (pre-flare), pico das erupções (flare peak), pós-erupções (post-flare) e média de 300 dias terrestres (300 Earth-day mean). (Créditos: Chen et al, 2020)

“Os eventos climáticos espaciais são normalmente vistos como um prejuízo para a habitabilidade”, disse Chen.

“Mas nosso estudo mostrou quantitativamente que alguns climas espaciais podem realmente nos ajudar a detectar assinaturas de gases importantes que podem significar processos biológicos.”

Mas apenas alguns. Em outros casos, seu trabalho mostrou que as erupções podem destruir bioassinaturas potenciais de vida anóxica.

“Embora relatemos os efeitos 3D de erupções estelares em atmosferas oxidantes, erupções fortes podem ter outros impactos inesperados nas atmosferas com condições redutoras. Por exemplo, espécies de óxido de hidrogênio derivadas de erupções estelares podem destruir bioassinaturas anóxicas importantes, como metano, sulfeto de dimetila e sulfeto de carbonila, suprimindo assim suas características espectroscópicas”, relatam os autores.

Outro resultado interessante deste estudo diz respeito às magnetosferas de exoplanetas. Eles descobrem que as hipererupções podem ajudar a revelar a natureza e a extensão das magnetosferas.

“Mais especulativamente, os eventos de prótons durante as hipererupções podem revelar a existência de campos magnéticos em escala planetária, destacando regiões específicas do planeta. Ao identificar pegadas dos fluxos que emitem nitrogênio ou óxido de hidrogênio durante tempestades magnéticas e/ou eventos de precipitação auroral, pode-se ser capaz de determinar a extensão geométrica das magnetosferas exoplanetárias.”

Hipererupções podem nos ajudar a entender a extensão das magnetosferas exoplaneta, identificando a extensão da pegada do fluxo de óxido de nitrogênio. Tradução da imagem: pré-erupção (pre-flare), pico das erupções (flare peak), pós-erupções (post-flare) e média de 300 dias terrestres (300 Earth-day mean). (Créditos: Chen et al, 2020)

Outra pesquisa recente sugeriu que exoplanetas submetidos a erupções, especialmente em torno de estrelas anãs vermelhas, não são ótimos locais para procurar por vida. A atividade de erupções é muito prejudicial. Mas este estudo mostra que há mais complexidade na situação.

No geral, isso mostra que as erupções podem nos ajudar a detectar bioassinaturas em alguns casos. Também mostra que, embora as erupções possam perturbar as atmosferas de exoplanetas, em muitos casos elas voltam ao normal. Também é um fato que estrelas de baixa massa vivem muito mais do que estrelas como o nosso Sol, o que significa que há mais tempo para a vida se desenvolver em seus planetas.

Este novo trabalho destaca o quão complicada é a busca pela vida e quantas variáveis ​​estão envolvidas. E contém pelo menos uma surpresa. Considerando que as erupções foram amplamente consideradas prejudiciais à habitabilidade dos exoplanetas, o fato de que elas podem ajudar a detectar bioassinaturas significa que há mais coisas acontecendo do que o esperado.

Essa pesquisa exigiu a cooperação de cientistas de muitas disciplinas. Ela uniu cientistas climáticos, astrônomos, observadores e teóricos e, claro, cientistas de exoplanetas.

“Este projeto foi o resultado de um fantástico esforço coletivo de equipe”, disse Eric T. Wolf, cientista planetário da Universidade do Colorado em Boulder e co autor do estudo.

“Nosso trabalho destaca os benefícios dos esforços interdisciplinares ao investigar as condições em planetas extrasolares.”

Julio Batista

Julio Batista

Sou Julio Batista, de Praia Grande, São Paulo, nascido em Santos. Professor de História no Ensino Fundamental II. Auxiliar na tradução de artigos científicos para o português brasileiro e colaboro com a divulgação do site e da página no Facebook. Sou formado em História pela Universidade Católica de Santos e em roteiro especializado em Cinema, TV e WebTV e videoclipes pela TecnoPonta. Autodidata e livre pensador, amante das ciências, da filosofia e das artes.