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Astrônomos detectam uma migração em massa de estrelas convergindo para Andrômeda

Traduzido por Julio Batista
Original de Evan Gough para o Universe Today

Os astrônomos sabem que as galáxias crescem ao longo do tempo por meio de fusões com outras galáxias. Podemos ver isso acontecendo em nossa galáxia. A Via Láctea está lentamente absorvendo as Grandes e Pequenas Nuvens de Magalhães e a Galáxia Esferoidal Anã de Sagitário.

Pela primeira vez, astrônomos encontraram evidências de uma antiga migração em massa de estrelas para outra galáxia. Eles avistaram mais de 7.000 estrelas em Andrômeda (M31), nosso vizinho mais próximo, que faziam parte de uma fusão com outra galáxia há cerca de dois bilhões de anos.

O enorme halo de gás é destacado nesta imagem capturada da galáxia de Andrômeda. (Créditos: NASA, ESA e E. Wheatley (STScI))

O crescimento e a evolução das galáxias é um tema quente na astronomia e uma das razões pelas quais o Telescópio Espacial James Webb (JWST, na sigla em inglês) está ganhando muitas manchetes ultimamente. Um dos principais objetivos científicos do JWST é olhar para trás no tempo para as primeiras galáxias do Universo para entender como elas cresceram e evoluíram para o que são hoje. Mas não é o único telescópio que pode ajudar a esclarecer isso.

“Galáxias como M31 e nossa Via Láctea são formadas a partir dos blocos de construção de muitas galáxias menores ao longo da história cósmica.”

– Arjun Dey, NOIRLab

Essas novas observações de Andrômeda e a migração interna de estrelas vêm do Instrumento Espectroscópico de Energia Escura (DESI). Ele foi construído para medir o efeito que a energia escura tem na expansão do Universo. Ele faz isso reunindo espectros ópticos em dezenas de milhões de objetos, principalmente galáxias e quasares, e então construindo um mapa 3D dos resultados.

O DESI é semelhante à mais conhecida espaçonave Gaia. Gaia tem um objetivo ambicioso de mapear com precisão as posições e movimentos de bilhões de estrelas na Via Láctea. Os dados do Gaia levaram a uma riqueza de descobertas sobre nossa própria galáxia. Mas está confinado ao mapeamento de estrelas na Via Láctea.

Agora, graças ao DESI, os astrônomos têm pelo menos um mapa parcial das estrelas de Andrômeda pela primeira vez. E esse mapa, incluindo os movimentos de quase 7.500 estrelas no halo interno da Galáxia de Andrômeda, está revelando sua história.

Esses resultados estão em um novo paper intitulado “DESI Observations of the Andromeda Galaxy: Revealing the Immigration History of our Nearest Neighbor” (Observações do DESI da Galáxia de Andrômeda: revelando a história da imigração de nosso vizinho mais próximo, na tradução livre). Ele aparecerá no The Astrophysical Journal, e o principal autor é Arjun Dey, astrônomo do NOIRLab da National Science Foundation dos EUA, a instalação responsável pelo DESI.

O DESI mostra que cerca de dois bilhões de anos atrás, outra galáxia se fundiu com Andrômeda. As posições e movimentos de cerca de 7.500 estrelas analisadas pelo DESI revelam que elas vieram de outra galáxia. A teoria nos dizia que foi assim que Andrômeda e outras galáxias cresceram tanto, mas agora há um corpo crescente de evidências claras.

“Nossas novas observações do grande vizinho galáctico mais próximo da Via Láctea, a Galáxia de Andrômeda, revelam evidências de um evento de imigração galáctica em detalhes requintados”, explicou o principal autor Dey. “Embora o céu noturno possa parecer imutável, o Universo é um lugar dinâmico. Galáxias como M31 e nossa Via Láctea são formadas a partir dos blocos de construção de muitas galáxias menores ao longo da história cósmica.”

A Via Láctea experimentou uma fusão semelhante entre 8 e 10 bilhões de anos atrás. A maioria das estrelas no halo da nossa galáxia se originou em uma galáxia diferente e se juntou à Via Láctea como resultado da antiga fusão. Os astrônomos podem aprender mais sobre a história antiga da Via Láctea observando de perto esse evento de fusão semelhante e mais recente em Andrômeda.

“Nunca vimos isso tão claramente nos movimentos das estrelas, nem nunca tínhamos visto algumas das estruturas resultantes dessa fusão”, disse Sergey Koposov, astrofísico da Universidade de Edimburgo e coautor do paper. “Nossa imagem emergente é que a história da Galáxia de Andrômeda é semelhante à da nossa própria Galáxia, a Via Láctea. Os halos internos de ambas as galáxias são dominados por um único evento de imigração.”

Pela primeira vez, vislumbramos as estruturas que se formaram como resultado da fusão. “As assinaturas observacionais esperadas da migração galáctica incluem fluxos de detritos, camadas, anéis e plumas, os resultados esperados das interações de fusão entre grandes galáxias e suas companheiras”, escreveram os autores em seu paper.

Estrelas no halo interno de Andrômeda e suas velocidades. (Créditos: Dey et al., ApJ, 2023)

“Encontramos evidências cinemáticas claras para estruturas de camadas no Fluxo Estelar Gigante, nas regiões nordeste e  ocidental”, afirmou o paper. “A cinemática é notavelmente semelhante às previsões de modelos dinâmicos construídos para explicar a morfologia espacial do halo interno. Os resultados são consistentes com a interpretação de que grande parte da subestrutura no halo interno de M31 foi produzida por um único evento de imigração galáctica 1-2 bilhões de anos atrás.”

“Embora indícios de estruturas coerentes tenham sido detectados anteriormente em M31, esta é a primeira vez que foram vistos com tantos detalhes e clareza em uma galáxia além da Via Láctea”, escreveram os autores em seu paper. “As observações revelam uma complexada estrutura cinemática coerente nas posições e velocidades de estrelas individuais: fluxos, cunhas e asnas.”

Velocidades vs. distância de algumas das estrelas de Andrômeda por cor. (Créditos: Dey et al., ApJ, 2023)

Embora as posições e velocidades das 7.500 estrelas desempenhem um papel importante nessas descobertas, o mesmo aconteceu com a metalicidade estelar. A equipe encontrou estrelas de alta metalicidade em todas as subestruturas decorrentes da fusão. “Encontramos um número significativo de estrelas ricas em metal em todas as subestruturas detectadas, sugerindo que a galáxia progenitora (ou galáxias) teve uma longa história de formação estelar, talvez mais representativa de galáxias mais massivas”, explicaram os autores em sua conclusão.

O estudo destaca semelhanças entre Andrômeda e a Via Láctea, fortalecendo a ideia teórica de que as fusões desempenham um papel fundamental na evolução e crescimento galáctico. “M31 é notavelmente semelhante à Via Láctea, pois os halos internos de ambas as galáxias são dominados por estrelas de um único evento de acreção”, afirma o paper. “De fato, um estudo recente da cinemática das estrelas da Via Láctea perto do Sol relata subestruturas cinemáticas em forma de asna que lembram as relatadas aqui.”

O poder do DESI está em plena exibição nesta pesquisa. Os resultados decorrem da capacidade do DESI de coletar espectros de 5.000 objetos simultaneamente. Este instrumento complexo é o mais poderoso espectrógrafo de pesquisa multiobjeto do mundo e pode reconfigurar seus 5.000 planos focais separados em apenas dois minutos, enquanto gira entre os alvos.

“É incrível podermos olhar para o céu e ler bilhões de anos da história de outra galáxia escrita nos movimentos de suas estrelas.”

–  Joan R. Najita, NOIRLab.

Ele foi projetado para medir os espectros de mais de 40 bilhões de galáxias distantes e quasares para mapear a estrutura em larga escala do Universo e como a energia escura alimenta sua expansão. Ao longo do caminho, está nos mostrando como as galáxias se fundem ao longo do tempo.

“Esta ciência não poderia ter sido feita em nenhuma outra instalação do mundo. A incrível eficiência, rendimento e campo de visão do DESI o tornam o melhor sistema do mundo para realizar um levantamento das estrelas na Galáxia de Andrômeda”, disse Dey. “Em apenas algumas horas de tempo de observação, o DESI foi capaz de superar mais de uma década de espectroscopia com telescópios muito maiores”.

“É incrível podermos olhar para o céu e ler bilhões de anos da história de outra galáxia escrita nos movimentos de suas estrelas – cada estrela conta parte da história”, disse o co-autor Joan R. Najita, também do NOIRLab. “Nossas observações iniciais excederam nossas expectativas mais ousadas e agora esperamos realizar um levantamento de todo o halo de M31 com DESI. Quem sabe quais novas descobertas nos aguardam!”

Julio Batista

Julio Batista

Sou Julio Batista, de Praia Grande, São Paulo, nascido em Santos. Professor de História no Ensino Fundamental II. Auxiliar na tradução de artigos científicos para o português brasileiro e colaboro com a divulgação do site e da página no Facebook. Sou formado em História pela Universidade Católica de Santos e em roteiro especializado em Cinema, TV e WebTV e videoclipes pela TecnoPonta. Autodidata e livre pensador, amante das ciências, da filosofia e das artes.