Traduzido por Julio Batista
Original de Peter Dockrill para o ScienceAlert
Pela primeira vez na engenharia genética, os cientistas desenvolveram um organismo sintético unicelular que cresce e se divide como uma célula normal, imitando aspectos do ciclo de divisão celular que fundamenta e gera a vida celular saudável.
A conquista, demonstrada em uma forma de vida projetada semelhante a uma bactéria unicelular chamada JCVI-syn3A, é o resultado de décadas de sequenciamento genômico e análise por cientistas, explorando os papéis que genes individuais desempenham dentro de criaturas vivas.
“Nosso objetivo é conhecer a função de cada gene para que possamos desenvolver um modelo completo de como uma célula funciona”, disse o biofísico James Pelletier do MIT e do Instituto Nacional de Padrões e Tecnologia (NIST).
Embora as raízes do trabalho possam ser traçadas até a década de 1990, os avanços mais recentes ocorreram neste século, com pesquisadores em 2003 sintetizando com sucesso um pequeno vírus que infecta bactérias.
Isso levou a um novo avanço em 2010, com cientistas do Instituto J. Craig Venter (JCVI) em Maryland (EUA) projetando a primeira célula bacteriana sintética, chamada JCVI-syn1.0: o primeiro organismo na Terra com um genoma totalmente sintético, desenvolvido através da remoção do DNA natural da bactéria Mycoplasma mycoides.
Vários anos depois, a equipe deu mais um passo à frente, criando uma espécie de bactéria em laboratório com um código genético menor do que qualquer outro encontrado na natureza.
Este organismo, chamado JCVI-syn3.0, possuía apenas 473 genes no total – menor do que qualquer organismo vivo autossustentável conhecido no mundo natural.
Mas enquanto o kit de ferramentas genéticas miniaturizado do JCVI-syn3.0 permitiu que ele se perpetuasse por meio da divisão celular, ele fez isso de uma maneira incomum, produzindo “variação morfológica notável” nas novas células que criou, que surgiram em uma variedade de formas e tamanhos diferentes.
Agora, membros da mesma equipe de pesquisa descobriram uma maneira de evitar que essas estranhas morfologias ocorram, com uma variante recém-modificada de JCVI-syn3.0, conhecida como JCVI-syn3A.
Com a adição de 19 genes não presentes em JCVI-syn3.0, JCVI-syn3A é capaz de sofrer divisão celular de uma forma mais consistente e de aparência normal, com variação morfológica significativamente menor do que JCVI-syn3.0 exibiu.
Apesar dos vários anos de trabalho por trás dessa conquista, ainda há um grande mistério envolvido nesses genes.
Por exemplo, enquanto JCVI-syn3A apresenta 19 novos genes, pensa-se que apenas 7 genes desempenham um papel de fazer com que seus processos de divisão celular funcionem de forma mais regular. E desses sete, apenas dois genes – chamados ftsZ e sepF – tiveram suas funções identificadas.
A questão de como os outros cinco necessariamente contribuem para a consistência morfológica do JCVI-syn3A permanece um mistério, mas uma coisa é certa: esse minúsculo genoma agora representa o novo padrão de experimentação que pode nos ajudar a caracterizar o que esses genes fazem dentro dos organismos.
“O JCVI-syn3A oferece, portanto, um modelo mínimo atraente para a fisiologia bacteriana e uma plataforma para a engenharia biológica em geral”, explicam os pesquisadores em seu paper.
Ou como disse a líder do Grupo de Engenharia Celular do NIST, Elizabeth Strychalski: “queremos entender as regras fundamentais da estrutura da vida. Se esta célula pode nos ajudar a descobrir e entender essas regras, então nós vamos correr para descobrir.”
Os resultados são relatados na Cell.