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Evolução química #1: Perspectivas

O termo evolução poderia tranquilamente ser apontado como uma das maiores falhas na educação científica social. O desconhecimento e/ou desentendimento dos conceitos relacionados com a evolução fomentam discussões irrelevantes sobre a veracidade de fatos bem definidos e observáveis, seja por parte da população cientificamente analfabeta, ou por diversas classes de defensores de ideologias anticientíficas (e, por analogia, antifactuais).

A maquinaria que move a ciência moderna advém da epistemologia cunhada no pensamento humano por diversos pensadores ao longo da história e, principalmente a partir do século XVIII (diga-se, de passagem, uma bela trajetória fora do escopo desta discussão). Uma vez que aprendemos como testar hipóteses empiricamente, a ciência evoluiu exponencialmente, fornecendo além das tão utilizadas comodidades modernas, uma maneira real de enxergar o universo ao nosso redor, e como ele funciona, doa a quem doer. Felizmente (ou infelizmente, em alguns casos), as mitocôndrias não deixarão de realizar seu processo respiratório porque um indivíduo não acredita nisso. Nem as moléculas perderão suas propriedades eletrônicas pelo mesmo motivo. Desta forma, os cientistas têm tempo de analisar cuidadosamente cada processo natural que factualmente está ocorrendo neste momento.

Enquanto você lê este texto, milhares de pesquisadores estão confinados em laboratórios, percorrendo campos ou mergulhados no espaço procurando respostas triviais como: Como estamos aqui? Frisemos aqui especial atenção a utilização do como ao invés do famoso por que. Ela indica que por mais que a ciência disponha de ferramentas diversas para a perscrutação da natureza, ela reconhece que significar o que ocorre ao seu redor está além de seus objetivos. Apesar disso, os resultados científicos obtidos até então sugerem que, como veremos durante os próximos artigos desta sequencia, não existe razão aparente (além de física e química) para nossa existência e temos que aprender a lidar com isso.

De qualquer forma, entender como chegamos aqui é plausivelmente possível e exige um árduo trabalho realizado pelos mesmos cientistas supracitados, financiados diretamente e indiretamente pela sociedade. Na biologia, essas perguntas movimentam o campo da evolução biológica. No entanto, o papel da biologia reside na discussão de como, uma vez existente, a vida evoluiu.

A resposta de como a vida surgiu é de cunho majoritariamente químico (porém multidisciplinar) e é discutida por um campo denominado evolução química. A evolução química estuda como a maquinaria responsável pela vida tomou forma e, emergencialmente, permitiu a vida. Os reais significados dos termos vida e emergência utilizados pela ciência são desconhecidos ou erroneamente utilizados pela maioria das pessoas. Uma vez entendidos e bem suportados, os mesmos nos dão, com grande segurança, uma ideia satisfatória (porém ainda incompleta) de como a vida surgiu. O surgimento desta ainda é um quebra-cabeça com a falta de inúmeras peças. Porém, como qualquer quebra-cabeça parcialmente montado, nos permite ter uma ideia de que se trata a figura quando completo. E, felizmente, diferente de diversas ideologias, no quebra-cabeça da ciência, as peças são reais.

Henrique Esteves

Henrique Esteves

Doutorando em Ciência pela UNICAMP, onde pesquisa estrutura e reatividade de moléculas orgânicas.