Por Pamela Geraldine Olivo Montaño
Publicado no Instituto de Física da Universidade Nacional Autônoma do México
O que para vários físicos parece ser uma questão pouco discutida, para a investigadora do Instituto de Física da Universidade Nacional Autônoma do México, Ana María Cetto, é uma pergunta digna para um amplo debate: Física? Sem filosofia? Ou, em outras palavras: Se pode fazer física inocentemente? Sem se dar conta das posturas filosóficas que estão por trás da ciência?
Com estas questões, Cetto, participou de um ciclo de debates, “Por que os cientistas devem saber filosofia?”, organizado pelo Centro de Investigações Interdisciplinares em Ciências e Humanidades (CEIICH) e pela Faculdade de Ciências, nos dias 23 e 25 de abril.
Cetto se referiu a física quântica como “a descrição mais completa e bem sucedida que conhece hoje em dia a respeito do comportamento quântico da matéria com uma grande capacidade de previsão”; um dos maiores avanços da história da ciência que, no entanto, enfrenta importantes problemas filosóficos que surgiram desde os primeiros anos de sua criação e construção.
A mecânica quântica fornece uma descrição completa ou incompleta da natureza? Ela oferece informação sobre um caso individual ou uma descrição estatística do comportamento dos átomos? Se trata de uma descrição causal ou acausal?
Nesta última pergunta, segunda ela, a questão sobre “indeterminação”, é uma importante noção conceitual que significou um dos maiores rompimentos com a física clássica.
Os resultados obtidos através da física clássica se mostraram um mundo determinista, ou seja, de um estado presente se pode prever um estado futuro. No entanto, com a física quântica não é possível obter previsões precisas sobre o comportamento dos objetos subatômicos. Antes da física clássica, era impossível conceber o indeterminismo. O próprio Einstein se recusou a acreditar que não é uma escolha livre do elétron, pensamento que refletiu em sua famosa frase: “Deus não joga dados”.
O divisor de águas da física quântica e seus percursores como Planck, Ehrenfest, De Broglie, Born, Heisenberg, Schrödinger, Bohr, Einstein, entre outros, surgiu na famosa “Quinta Conferência de Solvay”, em 1927. Lá, haviam duas posições evidentemente opostas: enquanto alguns estavam a favor do realismo, outros defendiam o instrumentalismo.
Em geral, o realismo sugere que na relação sujeito-objeto, o objeto terá sempre uma realidade independente do sujeito cognoscente. Por outro lado, o instrumentalismo, descreve a natureza considerando apenas os objetos que podem ser observados nos fenômenos; o instrumentalismo se utiliza de teorias utilizadas como ferramentas para descrever o observável com a pretensão de representar a realidade.
As duas posturas tiveram importantes defensores: o realista, liderado por Einstein e Schrödinger, entre outros, contra os instrumentistas, Niels Bohr e Heisenberg. Assim, os próprios físicos iniciaram a discussão de caráter filosófico.
Depois de várias discussões, a posição de Bohr conhecida como ortodoxa ou “Interpretação de Copenhague”, foi a que melhor parece ter conseguido triunfar e ela tem dominado até agora, é a mais conhecida e geralmente apresentada nos livros didáticos e nas abordagens investigativas.
Quando se estuda a física quântica do ponto de visto ortodoxo (ou instrumentista), aparecem alguns paradoxos que vão contra a intuição, “tinha uma situação no mundo quântico, onde a noção de caminho desaparece, onde, de repente, tem objetos virtuais, e não temos que pensar que exista uma realidade subjacente”, disse Cetto.
Oito anos após as conclusões de 1927, e ainda não estando satisfeito, Erwin Schrödinger publicou um artigo em que apresentou o conhecido paradoxo do “Gato de Schrödinger”, que mostra os conceitos paradoxais da postura ortodoxa.
De um modo geral, a analogia consiste em ter um gato dentro de uma caixa e um núcleo radioativo que pode ser ativado a qualquer momento e que provocaria a morte do gato. Os ortodoxos diriam que no momento em que você abrir a caixa e tiver uma observação, você saberá com exatidão o estado do gato. No entanto, a premissa de Schrödinger aponta que se você não saber quando o núcleo radioativo se ativa, o gato não vai estar nem vivo e nem morto.
Mas além do debate histórico a favor de uma ou outra posição, para a pesquisadora, o importante é a necessidade dos físicos saberem filosofia. Dentro da física sempre se trabalham pressupostos filosóficos, mas os cientistas nem sempre estão cientes disso, disse ela.
Para ela, os físicos deveriam passar por uma aprendizagem mínima de filosofia da ciência, não para se tornarem filósofos, mas para entender quais posições ou visões filosóficas existem por trás da ciência que fazem.