As origens
O pensamento marxista foi sintetizador de diferentes preocupações filosóficas, políticas e científicas de sua época, assim como herdeiro de fundamentos formulados por outros pensadores. Em primeiro lugar, deve-se fazer justiça à influência da filosofia hegeliana de quem Marx absorveu uma diferente percepção da história – não um movimento linear ascendente como propunham os evolucionistas, nem o resultado da ação voluntariosa e consciente dos heróis envolvidos, como pensavam os historiadores românticos. Hegel entendia a história como um processo coeso que envolvia diversas instâncias da sociedade – da religião à economia – e cuja dinâmica se dava por oposições entre forças antagônicas – tese e antítese. Desse embate emergia a síntese que fechava o processo “dialético” de conceber a história. Marx utilizou esse método de explicação histórica para o qual os agentes sociais, apesar de conscientes, não são os únicos responsáveis pela dinâmica dos acontecimentos – as forças em oposição atuam sobre o devir.
Também significativo foi o contato de Marx com o pensamento socialista francês e inglês do século XIX, de Claude Henri de Rouvroy, ou conde de Saint-Simon (1771-1858). Marx admirava o pioneirismo desses críticos da sociedade burguesa e suas propostas de transformação social, apesar de julgá-las “utópicas”, ou seja, idealistas e irreais. Esses autores, influenciados por Rousseau – que atribuíra as origens da desigualdade social ao advento da propriedade privada -, propunham transformar radicalmente a sociedade, implantando uma ordem social justa e igualitária, da qual seriam eliminados o individualismo, a competição e a propriedade privada. Os métodos para isso variavam do uso massivo da propaganda até a realização de experiências-modelo, que deveriam servir de guia para o restante da sociedade. Entretanto, nenhum deles havia considerado seriamente a necessidade de luta política entre as classes sociais e o papel revolucionário do proletariado na implantação de uma nova ordem social. Era por esse aspecto que Marx os denominava de utópicos, em contrapartida o socialismo defendido por ele era denominado de científico.
Há ainda na obra de Marx, toda a leitura crítica do pensamento clássico dos economicistas ingleses, em particular Adam Smith e David Ricardo, trabalho que tomou a atenção de Marx até o final da vida e resultou na maior parte do seu esforço teórico. Essa trajetória é marcada pelo desenvolvimento de conceitos importantes como alienação, classes sociais, valor, mercado trabalho, mais-valia, modo de produção.
Finalmente, impossível não fazer referência ao seu grande interlocutor – Friedrich Engels – economista político e revolucionário alemão que trabalhou com Marx de 1844 até a sua morte, sendo co-fundador do socialismo científico, também conhecido por “comunismo”, doutrina que demonstrava pela análise científica e dialética da realidade social que as contradições históricas do capitalismo levariam, necessariamente, à sua superação por um regime igualitário e democrático que seria sua antítese.
A idéia de alienação
A palavra “alienação” tem um conteúdo jurídico que designa a transferência ou venda de um bem ou direito. Mas, desde a publicação da obra de Rousseau (1712-1778), passa a predominar para o termo a idéia de privação, falta ou exclusão. Filósofos alemães, como Hegel e Feuerbach, também fazem uso da palavra, emprestando-lhe um sentindo de desumanização e injustiça que será absorvido por Marx. Este faz do conceito uma peça-chave de sua teoria para a compreensão da exploração econômica exercida sobre o trabalhador no capitalismo. A indústria, a propriedade privada e o assalariamento alienavam ou separavam o operário dos “meios de produção” – ferramentas, matérias primas, terra e máquina – e do fruto de seu trabalho, que se tornaram propriedade privada do empresário capitalista.
Politicamente, também o homem se tornou alienado, pois o princípio da representatividade, base do liberalismo, criou a idéia de Estado como um órgão político imparcial, capaz de representar toda a sociedade e dirigi-la pelo poder delegado pelos indivíduos. Marx mostrou, entretanto, que na sociedade de classes esse Estado representa apenas a classe dominante e age conforme o interesse desta.
Segundo Marx, a “divisão social do trabalho” fez com que o pensamento filosófico se tornasse atividade exclusiva de um determinado grupo. As diversas escolas filosóficas passaram a expressar a visão parcial que esse grupo tem da vida, da sociedade e do Estado, refletindo, assim, seus interesses. Algumas, como o liberalismo, transformaram-se em verdadeiras “filosofias do Estado”, com o intuito explícito de defendê-lo e justifica-lo.
Alienado, separado e mutilado, o homem só pode recuperar a integridade de sua condição humana pela crítica radical do sistema econômico, à política e à filosofia que o excluíram da participação efetiva na vida social. Essa crítica radical, que nasce do livre exercício da consciência, só se efetiva na práxis, que é a ação política consciente e transformadora. A crítica está assim unida à práxis – novo método de abordar e explicar a sociedade e também um projeto para a ação sobre ela. Assim o marxismo se propunha como opção libertadora do homem.
As classes sociais
Outro conceito basilar do marxismo é o de classes sociais, que Marx desenvolve na busca por denunciar as desigualdades sociais contra a falsa ideia de igualdade política e jurídica proclamada pelos liberais. Para ele, os inalienáveis direitos de liberdade e justiça, considerados naturais pelo liberalismo, não resistem às evidências das desigualdades sociais promovidas pelas “relações de produção”, que dividem os homens em proprietários e não-proprietários dos meios de produção. Dessa divisão se originam as classes sociais: os “proletários” – trabalhadores despossuídos dos “meios de produção”, que vendem sua força de trabalho em troca de salário – e os “capitalistas”, que, possuindo meios de produção sob a forma legal da propriedade privada, “apropriam-se” do produto do trabalho de seus operários em troca do salário do qual eles dependem para sobreviver.
As classes sociais formadas no capitalismo – burgueses e proletários – estabelecem intransponíveis desigualdades entre os homens e relações que são, antes de tudo, de antagonismo e exploração. A oposição e o antagonismo derivam dos interesses inconciliáveis entre as classes – o capitalista desejando preservar seu direito à propriedade dos meios de produção e dos produtos a à máxima exploração do trabalho do operário, pagando baixos salários ou ampliando a jornada de trabalho. O trabalhador, por sua vez, luta contra a exploração, reivindicando menor jornada de trabalho, melhores salários e participação nos lucros que se acumulam com a venda daquilo que ele produziu.
Por outro lado, apesar das oposições, as classes sociais são também complementares e interdependentes, pois uma só existe em função da outra. Só existem proprietários porque há uma massa de despossuídos cuja única propriedade é a sua força de trabalho, dispostos a vendê-la para assegurar sua sobrevivência. De qualquer maneira, só existem proletários porque há alguém que lucra com seu assalariamento.
Para Marx, a história humana é a história da luta de classes, da disputa constante por interesses que se opõem, embora essa oposição nem sempre se manifeste socialmente sob a forma de conflito ou guerra declarada. As divergências e antagonismos das classes estão subjacentes a toda relação social, nos mais diversos níveis da sociedade, em todos os tempos, desde o surgimento da sociedade.
A origem histórica do capitalismo
Para desenvolver sua teoria, Marx se vale de conceitos abrangentes, da análise crítica do momento que vive e de uma sólida visão histórica com os quais procura explicar a origem das classes sociais e do capitalismo. É assim que ele atribui a origem das desigualdades sociais a uma enorme quantidade de riquezas que se concentra, na Europa, do século XIII até meados do século XVIII, nas mãos de uns poucos indivíduos, que tem o objetivo e as possibilidades de acumular bens e obter lucros cada vez maiores.
No início, essa acumulação de riquezas se fez por meio de pirataria, do roubo, dos monopólios e do controle de preços praticados pelos Estados absolutistas. A comercialização, principalmente com as colônias, era a grande fonte de rendimentos para os Estados e a nascente burguesia. Mas, a partir do século XVI, o artesão e as corporações de ofício foram paulatinamente substituídas, respectivamente, pelo trabalhador “livre” assalariado – o operário – e pela indústria.
Na produção artesanal européia da Idade Média e do Renascimento (Idade Moderna), o trabalhador mantinha em sua casa os instrumentos de produção. Aos poucos, porém, surgiram oficinas organizadas por comerciantes enriquecidos que produziam mais e a baixo custo. A generalização desses galpões originou, em meados do século XVIII, na Inglaterra, a Revolução Industrial. Essa possibilitou a mecanização ampla e sistemática da produção de mercadorias, acelerando o processo de separação entre o trabalhador e os instrumentos de produção e levando à os artesãos individuais. As máquinas e tudo o mais necessário ao processo produtivo – força motriz, instalações, matérias primas – ficaram acessíveis somente aos empresários capitalistas com os quais os artesãos, isolados, não podiam competir. Assim, multiplicou-se o número de operários, isto é, trabalhadores “livres” expropriados, artesãos que não conseguiam competir com o sistema industrial e desistiam da produção individual, empregando-se nas indústrias, constituindo uma nova classe social.
O salário
O operário é o indivíduo que, nada possuindo, é obrigado a sobreviver da sua força de trabalho. No capitalismo, ele se torna uma mercadoria, algo útil, que se pode comprar e vender. Por meio de um contrato estabelecido entre ele e o capitalista, a quem é permitido ao comprar ou “alugar por um certo tempo” sua força de trabalho em troca de uma quantia de dinheiro, o salário.
O salário é, assim, o valor da força de trabalho, considerada como mercadoria. Como a força de trabalho não é uma “coisa”, mas uma capacidade, inseparável do corpo do operário, o salário deve corresponder à quantia que permita ao operário alimentar-se, vestir-se, cuidar dos filhos, recuperar as energias e, assim, estar de volta ao serviço no dia seguinte. Em outras palavras, o salário deve garantir as condições de subsistência do trabalhador e sua família.
O cálculo do salário depende do preço dos bens necessários à subsistência do trabalhador. O tipo de bens necessários depende, por sua vez, dos hábitos e dos costumes dos trabalhadores. Isso faz com o salário varie de lugar para lugar. Além disso, o salário depende ainda da natureza e da habilidade do próprio trabalhador. No cálculo do salário de um operário qualificado deve-se computar o tempo que ele gastou com educação e treinamento para desenvolver suas capacidades.
Trabalho, valor e lucro
O capitalismo vê a força de trabalho como mercadoria, mas é claro que não se trata de uma mercadoria qualquer. Ela é a única capaz de criar valor. Os economistas clássicos ingleses, desde Adam Smith, já haviam percebido isso ao reconhecerem o trabalho como a verdadeira fonte de riqueza das sociedades.
Marx foi além. Para ele, o trabalho, ao se exercer sobre determinados objetos, provoca nestes uma espécie de “ressurreição”. Tudo o que é criado pelo homem, diz Marx, contém em si um trabalho passado, “morto”, que só pode ser reanimado por outro trabalho. Assim, por exemplo, um pedaço de couro animal curtido, uma agulha de aço e fios de linha são, todos, produtos do trabalho humano. Deixados em si mesmos, são coisas mortas; utilizados para produzir um par de sapatos, renascem como meios de produção e se incorporam num novo produto, uma nova mercadoria, um novo valor.
Os economistas ingleses já haviam postulado que o valor das mercadorias dependia do tempo de trabalho gasto na sua produção. Marx acrescentou que esse tempo de trabalho se estabelecia em relação às habilidades individuais médias e às condições técnicas vigentes na sociedade. Por isso, dizia que no valor de uma mercadoria era incorporado o “tempo de trabalho socialmente necessário” à sua produção.
De modo geral, as mercadorias resultam da colaboração de várias habilidades profissionais distintas; por isso, seu valor incorpora todos os tempos de trabalho específicos. Por exemplo, o valor de um par de sapatos inclui não só o tempo gasto para confeccioná-lo, mas também o dos trabalhadores que curtiram o couro, produziram fios de linha, a máquina de costura e etc. O valor de todos esses trabalhos está embutido no preço que o capitalista paga ao adquirir essas matérias primas e instrumentos, os quais, justamente com a quantia paga a título de salário, serão incorporados ao valor do produto.
Imaginemos um capitalista interessado em produzir sapatos, utilizando, para calcular os custos de produção e o lucro, uma unidade de moeda qualquer. Pois bem, suponhamos que a produção de um par lhe custe 100 unidades de moeda de matéria prima, mais 20 com o desgaste dos instrumentos (ao término da vida útil dos equipamentos, o empresário terá de substituí-los por novos), mais 30 de salário diário pago a cada trabalhador. Essa soma – 150 unidades de moeda – representa sua despesa com investimentos. O valor do par de sapatos produzido nessas condições será a soma de todos os valores representados pelas diversas mercadorias que entraram na produção (matéria prima, instrumentos, força de trabalho), o que totaliza também 150 unidades de moeda.
Sabemos que o capitalista produz para obter lucro, isto é, quer ganhar com os seus produtos mais do que investiu. No exemplo acima, vemos, porém, que o valor de um produto corresponde exatamente ao que se investe para produzi-lo. Como estão se obtém lucro?
O capitalista poderia lucrar simplesmente aumentando o preço de venda do produto – por exemplo, cobrando 200 unidades de moeda pelo par de sapatos. Mas o simples aumento de preços é um recurso transitório e com o tempo traz problemas. De um lado, uma mercadoria com preços elevados, ao sugerir possibilidades de ganho imediato, atrai novos capitalistas interessados em produzi-la. Com isso, porém, corre-se o risco de inundar o mercado com artigos semelhantes, cujo o preço fatalmente cairá. De outro lado, uma alta arbitrária no preço de uma mercadoria qualquer tende a provocar elevação generalizada nos demais preços, pois, nesse caso, todos os capitalistas desejarão ganhar mais com seus produtos. Isso pode ocorrer durante algum tempo, mas, se a disputa se prolongar, poderá levar o sistema econômico à desorganização.
Na verdade, de acordo com a análise de Marx, não é no âmbito da compra e da venda de mercadorias que se encontram as bases estáveis para o lucro dos capitalistas individuais nem para a manutenção do sistema capitalista. Ao contrário, a valorização da mercadoria se dá no âmbito de sua produção.
A mais-valia
Retomamos o nosso exemplo. Suponhamos que o operário tenha uma jornada diária de nove horas e confeccione um par de sapatos a cada três horas. Nessas três horas ele cria uma quantidade de valor correspondente ao seu salário, que é suficiente para obter o necessário à sua subsistência. Como o capitalista lhe paga o valor de um dia de força de trabalho, no restante do tempo, seis horas, o operário produz mais mercadorias, que geram um valor maior do que lhe foi pago na forma de salário. A duração da jornada de trabalho resulta, portanto, de um cálculo que leva em consideração o quanto interessa ao capitalista produzir para obter lucro sem desvalorizar seu produto.
Suponhamos uma jornada de nove horas, no final da qual o sapateiro produza três pares de sapatos. Cada par continua valendo 150 unidades de moeda, mas agora eles custam menos ao capitalista. É que, no cálculo do valor dos três pares, a quantia investida em meios de produção também foi multiplicada por três, mas a quantia relativa ao salário – correspondente a um dia de trabalho – permaneceu constante. Desse modo, o custo de cada par de sapatos se reduziu a 130 unidades.
Assim, ao final da jornada de trabalho, o operário recebe 30 unidades de moeda, ainda que seu trabalho tenha rendido o dobro ao capitalista: 20 unidades de moedas, por par de sapatos produzido, totalizando 60 unidades de moeda. Esse valor a mais não retorna ao operário: incorpora-se ao produto e é apropriado pelo capitalista.
Visualiza-se, portanto, que uma coisa é o valor da força de trabalho, isto é, o salário, e outra é o quanto esse trabalho rende ao capitalista. Esse valor excedente produzido pelo operário é o que Marx chama de mais-valia.
O capitalista pode obter mais-valia procurando aumentar constantemente a jornada de trabalho, tal como no nosso exemplo. Essa é, segundo Marx, a mais-valia absoluta. É claro, porém, que a extensão indefinida da jornada esbarra nos limites físicos do trabalhador e na necessidade de controlar a própria quantidade de mercadorias que se produz.
Agora, pensemos numa indústria altamente mecanizada. A tecnologia aplicada faz aumentar a produtividade, isto é, as mesmas nove horas de trabalho agora produzem um número maior de mercadorias, digamos, vinte pares de sapatos. A mecanização também faz com que a qualidade dos produtos dependa menos da habilidade e do conhecimento técnico do trabalhador individual. Numa situação dessas, portanto, a força de trabalho vale cada vez menos e, ao mesmo tempo, graças à maquinaria desenvolvida, produz cada vez mais. Esse é, em síntese, o processo de obtenção daquilo que Marx denomina mais-valia relativa.
O processo descrito esclarece a dependência do capitalismo em relação ao desenvolvimento das tecnologias de produção. Mostra ainda como o trabalho, sob o capital, perde todo o atrativo e faz do operário mero “apêndice da máquina”.
As relações políticas
Após essa análise detalhada do modo de produção capitalista, Marx passa ao estudo das formas políticas produzidas no seu interior. Ele constata que as diferenças entre as classes sociais não se reduzem a diversas quantidades de riquezas, mas expressam uma diferença de “existência material”. Os indivíduos de uma mesma classe social partilham uma situação de classes que lhes é comum, incluindo valores, comportamentos, regras de convivência e interesses.
A essas diferenças econômicas e sociais segue-se uma desigual distribuição de poder. Diante da alienação do operariado, as classes economicamente dominantes desenvolveram formas de dominação políticas que lhes permitem apropiar-se do aparato de poder do Estado e, com ele, legitimar seus interesses sob a forma de leis e planos econômicos políticos.
Cada forma assumida pelo Estado na sociedade burguesa, seja sob o regime liberal, monárquico, monárquico constitucional ou ditatorial, representa diferentes maneiras pelas quais ele se transforma num “comitê para gerir os negócios comuns de toda a burguesia” (K. Marx e F. Engels, “Manifesto do Partido Comunista”, in Cartas filosóficas e outros escritos, p. 86), sob quaisquer dos regimes já propostos, dos mais liberais aos mais ditatoriais.
Para Marx, as condições específicas de trabalho geradas pela industrialização tendem a promover a consciência de que há interesses comuns para o conjunto da classe trabalhadora e, consequentemente, tendem a impulsionar a sua organização política para a ação. A classe trabalhadora, portanto, vivendo uma mesma situação de classe e sofrendo progressivo empobrecimento em razão das formas cada vez mais eficientes de exploração do trabalhador, acaba por se organizar politicamente. Essa organização é que permite a tomada da consciência da classe operária e sua mobilização para a ação política.
Materialismo histórico
Para entender o capitalismo e explicar a natureza da organização econômica humana, Marx desenvolveu uma teoria abrangente e universal, que procura dar conta de toda e qualquer forma produtiva criada pelo homem. Os princípios básicos dessa teoria são expressos em seu método de análise – o materialismo histórico.
Marx parte do princípio de que a estrutura de uma sociedade qualquer reflete a forma como os homens se organizam para a produção social de bens que engloba dois fatores fundamentais: as forças produtivas e as relações de produção.
As forças produtivas constituem as condições materiais de toda a produção. Qualquer processo de trabalho implica determinados objetos – matérias primas identificadas e extraídas da natureza – e determinados instrumentos – conjunto de forças naturais já transformadas e adaptadas pelo homem, como ferramentas ou máquinas, utilizadas segundo uma orientação técnica específica. O homem, principal elemento das forças produtivas, é o responsável por fazer a ligação entre a natureza e a técnica e os instrumentos. O desenvolvimento da produção vai determinar a combinação e o uso desses diversos diversos elementos: recursos naturais, mão-de-obra disponível, instrumentos e técnicas produtivas essas combinações procuram atingir o máximo de produção em função do mercado existente. A cada forma de organização das forças produtivas corresponde uma determinada forma de relação de produção.
As relações de produção são as formas pelas quais os homens se organizam para executar a atividade produtiva. Elas se referem às diversas maneiras pelas quais são apropriados e distribuídos os elementos envolvidos no processo de trabalho: as matérias-primas, os instrumentos e a técnica, os próprios trabalhadores e o produto final. Assim, as relações de produção podem ser, num determinado momento, cooperativistas (como num mutirão), escravista (como na Antiguidade), servis (como na Europa feudal), ou capitalista (como na indústria moderna).
Forças produtivas e relações de produção são condições naturais e históricas de toda a atividade produtiva que ocorre em sociedade. A forma pela qual ambas existem e são reproduzidas numa determinada sociedade constitui o que Marx denominou “modo de produção”.
Para Marx, o estudo de modo de produção é fundamental para compreender como se organiza e funciona uma sociedade. As relações de produção, nesse sentido, são consideradas as mais importantes relações sociais. Os modelos de família, as leis, a religião, as ideias políticas, os valores sociais são aspectos cuja explicação depende, em princípio, do estudo do desenvolvimento e do colapso de diferentes modos de produção. Analisando a história, Marx identificou alguns modos de produção específicos que serão trabalhados posteriormente no artigo II.
Em cada modo de produção, a desigualdade de propriedade, como fundamento das relações de produção, cria contradições básicas com o desenvolvimento das forças produtivas. Essas contradições se acirram até provocar um processo revolucionário, com a derrocada do modo de produção vigente e a ascensão de outro.
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