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Neutrinos: as partículas mensageiras

Texto de Carolina S. Takeda no blog Coleção de Partículas

Estas características já nos mostram que os neutrinos são partículas muito peculiares. Tendo carga nula e uma massa tão pequena, os neutrinos raramente interagem com a matéria, sendo muito difíceis de detectar. Para exemplificar: para parar um neutrino de ~10MeV seria necessário mais de 1 ano luz de chumbo! Eu estava me referindo aos neutrinos quando disse sobre o chuveiro de partículas na postagem introdutória (clique aqui para ver). Porém, é graças a esta propriedade dos neutrinos que o chamamos de partículas ‘mensageiras’, pois eles conseguem sair de objetos densos como o sol e nos trazer informações.

Além disso, existem neutrinos que foram gerados no início do universo que não sofreram interações e portanto podem nos dizer mais sobre este tempo tão remoto.

Um experimento em 1962 mostrou que aqueles neutrinos que foram formados junto com múons (por exemplo), ao colidirem com um núcleo atômico apenas geravam múons. Isto também acontece com elétrons e taus. Por isto, é dito que existem 3 tipos de neutrinos, um de sabor elétron, outro de múon e por último um de sabor tau. Cada um possui um número leptônico (que é um número quântico) diferente associado que é conservado.  Como que conseguiram detectar esta partícula com uma presença tão sutil? 

Acredito que o ponto marcante para a descoberta do neutrino foi a carta de Wolfgang Pauli:

“Queridos senhoras e senhores radioativos”… 4 de dezembro 1930. Nesta carta, Pauli propõe a existência do neutrino como solução para o seguinte problema: no decaimento beta, as partículas resultantes não somavam o total de energia inicial. Isto estaria violando a conservação de energia que é muito importante na física. De acordo com a teoria de  Enrico Fermi, seguindo a ideia de Pauli, um neutrino (na verdade é um antineutrino, fato que está ligado à conservação do número leptônico) também é gerado neste decaimento, igualando assim as energias.

Portanto, o desafio se tornou em como detectar tal partícula. Como os neutrinos são neutros, é mais fácil procurarmos pelo resultado de sua colisão com um átomo gerando partículas que são mais fáceis de detectar. Como há muitos neutrinos (muitos mesmo), eventualmente, um acabará colidindo com um átomo.

Pensando assim, os cientistas vieram com várias ideias. A primeira foi de Bruno Pontecorvo: Vou escolher tetracloreto de carbono líquido pois quando um neutrino colidir com um de seus átomos, vai gerar um átomo radioativo que podemos detectar! Porém, foi com o experimento de Frederick Reines e Clyde Cowan que o primeiro neutrino foi detectado: Usando um reator nuclear como fonte dos neutrinos, sabemos que quando um neutrino interagir com a matéria irá liberar um nêutron que em seguida será absorvido, liberando raios gama que podemos medir.

Até aqui tudo ia bem, mas quando Raymond Davis realizou seu experimento para capturar neutrinos vindos do sol, um grande problema surgiu: Menos de um terço dos neutrinos esperados foram medidos! Por muitos anos este problema dos neutrinos solares, como foi chamado, intrigou os cientistas.

A solução veio de uma grande ideia de Pontecorvo: um neutrino não possui um sabor fixo, mas fica mudando e oscilando entre seus 3 sabores, sendo formado por mais de um sabor. Porém, se realmente existisse esta mudança de sabor, os neutrinos precisariam ter uma certa massa, por menor que fosse. Pensou que legal um sorvete que muda de sabor com o tempo?

Como sabiam que todos os neutrinos que saíam do Sol eram da forma de neutrinos do elétron, segundo Pontecorvo, eles mudavam de sabor no meio do caminho e ao chegar na Terra, dois terços estavam com sabores diferentes que não são detectáveis pelo experimento.  Mais tarde, experimentos confirmaram estas oscilações dos neutrinos!

Consequentemente, os neutrinos possuem massa, contradizendo a teoria atual e abrindo uma porta para desenvolvimentos na física.

Vamos ver alguns exemplos da importância desta partícula tão pequenina:

  • ASTROFÍSICA

Quando há uma explosão de uma estrela, na ordem de 10⁵⁸ neutrinos são gerados e por isto, mais neutrinos são detectados. Isto serve como um aviso de que uma supernova aconteceu, nos trazendo informações sobre esses eventos tão distantes.

Além disto, o número de neutrinos solares é muito sensível à temperatura, o que nos dá informações mais precisas da temperatura do Sol.

  • PARIDADE

Foi com os neutrinos que os cientistas sofreram um grande choque, percebendo que eles violam 100% a conservação da paridade, que era tido como inviolável. (clique aqui para ver mais sobre paridade e violação CP)

Buscando uma alternativa, foi descoberta a simetria CP que é conservada para os neutrinos. Porém, mais tarde, também foi descoberto que esta simetria é violada.

  • PLANETA TERRA

Até os geólogos estão interessados nos neutrinos, pois muitos são gerados no núcleo da Terra devido à elementos radioativos. Portanto, eles podem nos ajudar a entender melhor o núcleo do nosso planeta.  (geoneutrinos)

  • BIOLOGIA MARÍTIMA

Uma curiosidade é que experimentos para detectar neutrinos estão ajudando biólogos que estão pesquisando sobre a vida de animais que vivem nas profundezas do mar. Através de potentes equipamentos para captar sons, é possível descobrir tanto neutrinos quanto sobre a vida destes animais.

  • DESAFIO EXPERIMENTAL

Para detectar neutrinos, é preciso bloquear os raios cósmicos: chuva de partículas vindas do universo que acabam atrapalhando as medidas.

Por isto, os primeiros experimentos foram feitos em minas abandonadas, pois a grossa camada de terra bloqueia a maior parte destas partículas (não os neutrinos!). Alguns exemplos: Kamiokande e SNO, ambos possuem reservatórios cheios de água e muitos detectores em volta para medir os neutrinos.

  • ICE CUBE

Este é um exemplo de experimento mais recente em que o detector fica enterrado no gelo do pólo sul! Um neutrino interage com um próton no cubo de gelo, liberando um múon e uma luz azulada que é detectada pelas tiras de detectores.

Caio Dallaqua

Caio Dallaqua

Graduando em Física na USP, com um pé na Computação. Divulga Ciência e Tecnologia em seu canal do YouTube e, claro, produz conteúdo para o Universo Racionalista.