Por Michelle Starr
Publicado na ScienceAlert
Daqui a apenas alguns dias, a NASA vai fazer a sonda OSIRIS-REx pousar no asteroide Bennu. A missão se baseia em coletar uma amostra do asteroide e devolvê-la à Terra para um estudo mais detalhado – uma das primeiras missões desse tipo.
Essa amostra de retorno nos ajudará a entender não apenas os asteroides, mas os primeiros dias da existência do Sistema Solar. No entanto, essa não é a única missão do OSIRIS-REx.
A sonda chegou à órbita de Bennu em dezembro de 2018 e, desde então, tem usado seu conjunto de instrumentos para aprender o máximo possível sobre o asteroide antes de seu encontro há muito tempo planejado.
Seis artigos separados acabaram de parar nas revistas Science e Science Advances detalhando as propriedades físicas de Bennu e como elas revelam uma história surpreendentemente complexa.
“A sonda tem observado o asteroide há quase dois anos”, disse o astrônomo Joshua Emery, da Universidade do Norte do Arizona (EUA) e membro da equipe científica do OSIRIS-REx. “Bennu acabou relevando ser um pequeno asteroide fascinante e nos deu muitas surpresas”.
Bennu é o que é conhecido como asteroide ‘pilha de escombros‘, que é exatamente o que parece – um conglomerado de rochas relativamente soltas e de baixa densidade, que se pensa ter se formado quando um objeto maior se partiu, e pelo menos parte do material se juntou. No caso de Bennu, a forma dele é de um diamante bruto, com uma ‘cordilheira’ notória no equador.
Agora, pela primeira vez, temos um mapa digital detalhado do terreno do asteroide em 3D, liderado por Michael Daly, da Universidade York (Canadá). Isso revela que a cordilheira equatorial não está sozinha – outras cordilheiras muito mais sutis se estendem de um polo a outro, indicando que, embora o asteroide seja feito de escombros, ele tem alguma coesão interna.
Nos últimos anos, tivemos pistas de outras coisas estranhas acontecendo em Bennu.
No ano passado, descobrimos que Bennu estava ejetando material de sua superfície, alguns dos quais caíram de volta e alguns pareciam entrar em órbita estável. E os cientistas encontraram evidências de material carbonáceo que sugeria a presença de água em algum momento do misterioso passado de Bennu.
Uma nova pesquisa espectral global do asteroide em infravermelho e infravermelho próximo, liderada por Amy Simon da NASA-Goddard, confirmou a presença de materiais orgânicos e que contêm carbono, espalhados pela superfície de Bennu – a primeira detecção concreta de tais coisas em um asteroide próximo à Terra. Isso é consistente com as hipóteses de que asteroides e meteoritos poderiam ter levado pelo menos alguns dos ingredientes para a vida na Terra.
Era uma vez a água
Mas o carbono do asteroide tem uma história mais detalhada para contar. Um estudo espectral de perto revelou linhas brilhantes de material carbonático passando por uma série de pedras.
Isso, de acordo com uma equipe de cientistas liderada por Hannah Kaplan da NASA-Goddard, é consistente com carbonatos encontrados em “meteoritos condritos carbonáceos alterados aquosos” – carbonatos que se formaram por meio de interações com água.
Algumas dessas linha têm um metro de comprimento e vários centímetros de espessura. Isso, dizem os pesquisadores, é a evidência de que a água já fluía livremente sobre as rochas, um sistema hidrotérmico em escala de asteroide que já estava presente no corpo-pai que mais tarde deu origem a Bennu.
“O fluxo de fluídos no corpo de Bennu teria ocorrido em distâncias de quilômetros por milhares a milhões de anos”, escreveram os pesquisadores em seu artigo.
Imagens multiespectrais da superfície revelaram que Bennu sofre com intemperismo irregular em uma análise conduzida por Daniella DellaGiustina, da Universidade do Arizona (EUA). Por imagens de luz visível com cores falsas do asteroide, a equipe descobriu que algumas regiões foram expostas a fenômenos de intemperismo, como raios cósmicos e vento solar, por mais tempo do que outras, sugerindo processos – como eventos de impacto – que expõem novos materiais em momentos diferentes.
A região da cratera Nightingale, onde a sonda coleterá uma amostra, é feita de um material mais fresco, o que significa que fornecerá uma visão mais clara das coisas do início do Sistema Solar, quando se pensa que Bennu se formou.
E tem mais. Um estudo das mudanças de temperatura liderado por Ben Rozitis, da Open University (Reino Unido), descobriu algo interessante sobre as rochas em Bennu. Elas se dividem em dois tipos – mais fortes e menos porosas e mais fracas e mais porosas. Os pedregulhos mais fortes são aqueles que têm linhas de carbonato, sugerindo que a interação com a água pode, em última análise, produzir rochas mais fortes à medida que o líquido penetra nos buracos.
Mas as pedras mais fracas também são interessantes. Elas dificilmente sobreviveriam à entrada na atmosfera da Terra, já que aqueceriam e explodiriam – o que significa que elas provavelmente são um tipo de rocha espacial que não tivemos a oportunidade de estudar de perto antes.
Finalmente, voltamos às rochas que são ejetadas mencionadas acima. Ainda não sabemos exatamente como elas estão sendo expulsas do asteroide, mas a maneira como elas voam para cima e para baixo é uma ferramenta surpreendentemente útil para sondar o interior do asteroide.
“Foi um pouco parecido como se alguém estivesse na superfície do asteroide e jogando essas bolas de gude para que pudessem ser rastreadas”, disse o líder do estudo Daniel Scheeres, da Universidade de Colorado Boulder (EUA). “Nossos colegas puderam medir o campo gravitacional nas trajetórias que essas partículas fizeram”.
Quando combinado com medições de campo gravitacionais feitas pela sonda OSIRIS-REx, a equipe foi capaz de compilar um perfil de densidade interna do asteroide, uma vez que regiões mais densas criam um campo gravitacional local mais forte.
E eles encontraram algo surpreendente. Eles pensaram que o asteroide teria aproximadamente a mesma densidade em todas as regiões; mas ele parece mais denso na superfície. As regiões menos densas são a crista equatorial e o núcleo do asteroide – como se ele tivesse um grande vazio em seu interior.
Como a rotação do asteroide está acelerando com o tempo, isso significa que, eventualmente, é provável que ele se divida em várias partes.
No entanto, há um longo caminho até que isso aconteça. Por enquanto, o asteroide terá que se contentar com um toque de uma sonda em sua cratera. E essas novas análises deram aos pesquisadores uma estrutura para interpretar o estudo próximo dessa amostra, quando ela finalmente chegar à Terra.
Os seis artigos, publicados na Science e na Science Advances, podem ser encontrados aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.