Traduzido por Julio Batista
Original de Jonny Thomson para o Big Think
Estoicismo é algo do momento agora. Se você gosta de ler artigos longos ou passa o tempo na seção “Filosofia Popular” de uma livraria, notará uma enorme quantidade de títulos focados nisso. Esta filosofia antiga está ganhando grande força no momento. No entanto, quem faz sua propaganda deve ser precavido, porque embora haja muita sabedoria no que os estoicos escreveram, também há muito conteúdo duvidoso.
Como qualquer grande movimento ou religião, sua popularidade depende do quanto você escolhe as partes que funcionam para você. Podemos aceitar sabiamente algum aforismo em uma página, mas com inteligência ignorar o estranho ou incompreensível que vem depois. Podemos descontextualizar os antigos de seu tempo e modernizar as questões revelantes para o estoico, mas em que ponto o estoicismo se torna uma espécie de efeito Barnum — isto é, tudo para todos, mas filosoficamente nebuloso?
Então, como contraponto à sabedoria convencional predominante, aqui estão algumas razões pelas quais você pode considerar não ser um estoico.
Sem amizade, sem amor
Embora todos sejamos culpados de escolher a dedo ou suprimir evidências de vez em quando, os estoicos modernos mostram um caso particularmente exagerado quando se trata de relacionamentos. Há uma acusação frequente contra o estoicismo de que ele se preocupa apenas com a racionalidade. Isso é injusto. Os estoicos não eram alienígenas sem emoção que buscavam apenas o racionalismo e nunca qualquer sentimento. Diógenes Laércio adverte explicitamente contra ser “de coração duro” e “insensível”. Epicteto adverte que uma vida boa não é ser “como uma estátua”. Os estoicos não são robôs e sua posição era muito mais matizada.
No entanto, também é verdade que eles advertem explicitamente contra apegos mundanos de qualquer tipo. A maioria de nós pode descartar vaidades como smartphones, roupas de luxo e carros velozes. Mas ser verdadeiramente estoico também significa nunca se apegar ao seu país, seus amigos, sua família – ou qualquer coisa. Você não pode segurar nada muito perto de você. Tudo deve ser tratado como descartável (porque, em última análise, será descartado). Portanto, guarde seu coração para si mesmo e não ame como muitas pessoas entenderiam o amor.
Qualquer um que afirme ser estoico, mas que também afirme manter algo veementemente perto, está ignorando deliberadamente o que os estoicos estavam dizendo (meu filho, mesmo que você fique bravo com este artigo, você não estaria sendo estoico). O apego ao próprio estoicismo — como algum dogmatismo tribal — é a antítese do que os estoicos argumentam. Na melhor das hipóteses, os estoicos veem coisas como amigos, filhos e cônjuges como algo “preferível ao indiferente” – bom de se ter, mas dispensável. Na pior das hipóteses, eles são vistos como um obstáculo.
Torne-se invulnerável
Claro, a razão pela qual os estoicos argumentam contra apegos desse tipo é que eles frequentemente agem como distrações de um propósito maior. Mas também porque os estóicos estavam sintonizados com aquele velho mantra do memento mori: tudo morrerá e todas as coisas passarão. Seus amigos podem abandoná-lo; seus filhos podem ser atingidos por alguma doença terrível; seu cônjuge pode morrer amanhã. Se você reconhecer esses fatos, poderá se preparar para eles e, assim, atenuar ou prevenir o golpe psicológico da perda.
No entanto, fazer isso deixa algo relevante de algo. A falecida Rainha Elizabeth II disse uma vez: “o luto é o preço que pagamos pelo amor”. Podemos saber desse fato e ainda escolher amar, aceitando que o sofrimento se seguirá. A filosofia estoica ensina que o apego leva ao sofrimento. O compromisso leva à dor. No entanto, a citação de Elizabeth II é outra sabedoria. Ela nos diz que o amor é uma dor aceita conscientemente. Não importa o quão frios, longos e difíceis sejam os anos de luto, eles são um preço justo por um segundo de amor verdadeiro conhecido. Em suma, às vezes (mas não o tempo todo) a tristeza e o sofrimento valem a pena pelo amor investido antes.
Nenhum homem é uma ilha
Outro traço comum ao estoicismo é a autossuficiência. A ideia é que, se você depende de alguém, você se torna menor por causa disso. Se você permite que alguém controle sua vida e sua mente, você não é forte. Portanto, ficar chateado com a traição de um parceiro o torna fraco. Se você quer estar com alguém, isso o diminui. Como Epicteto escreveu: “Você entrega sua mente a qualquer um que apareça, para que eles possam abusar de você, deixando-a perturbada – você não tem vergonha disso?”
Pode-se argumentar que não há vergonha nisso. Na verdade, é inerentemente humano. É um símbolo de orgulho. Como argumentou Aristóteles (definitivamente não um estoico), somos todos animais sociopolíticos. Só podemos florescer quando trabalhamos juntos e em sociedade. Nos tempos modernos, há alguns que argumentam (como nesta entrevista do Big Think com Rutger Bregman) que somos evolutivamente inclinados para sermos sociais, cooperativos e mutuamente dependentes. Sim, natural não significa “certo”, mas às vezes antinatural pelo menos parece errado.
Se justapusermos o estoicismo a algo como o confucionismo, por exemplo, poderemos ver uma maneira melhor de avaliar as coisas. A filosofia confucionista coloca grande ênfase no aspecto relacional do ser humano – o que significa que os humanos são definidos por relacionamentos como “filha”, “irmão”, “companheiro de equipe”, “amigo” ou “compatriota”. As aranhas são solitárias. Humanos não são.
Jogar a água do banho fora, mas não com o bebê junto
Nada disso quer dizer que o estoicismo seja um sistema filosófico ruim. De fato, há muita sabedoria nos aforismos de grandes pensadores como Marco Aurélio, Epicteto e Sêneca. Mas isso não significa que devemos desligar nossas faculdades críticas. Criticar aspectos de uma coisa não significa renegar o todo. É uma posição perfeitamente aceitável de se manter, desde que o que resta seja algo coerente.
Por exemplo, os estoicos costumam repetir a ideia de que devemos aceitar coisas que estão além do nosso controle. No entanto, tradicionalmente, eles faziam isso com base em um compromisso quase religioso com um universo predeterminado. Os estoicos acreditavam que havia um plano para a natureza e, portanto, devemos concordar com isso. É filosoficamente coerente assumir a crença “aceite o que você não pode mudar”, ao mesmo tempo em que rejeitamos o fatalismo da crença estoica.
O racionalismo e a filosofia eram práticas estoicas importantes (se não as mais importantes). Ironicamente, seria totalmente anti-estoico se engulissemos o estoicismo acriticamente sem nem mesmo um momento de reflexão.