Traduzido por Julio Batista
Original de Stuart Vyse para o Skeptical Inquirer
A astrologia, a teoria mais antiga e popular da personalidade humana, não funciona. Eu desempenhei um pequeno papel em provar que a astrologia não funciona quando uma aluna, que era uma entusiasta da astrologia, veio até mim e disse que queria realizar um teste de astrologia para sua pesquisa de monografia. Para seu crédito, ela estava disposta a deixar a mente aberta e a mudar de ideia. Com um pouco de orientação, ela projetou um teste duplo-cego no qual estudantes universitários recebiam seu horóscopo real, com base em um mapa natal produzido por um programa de software de astrologia comercial altamente conceituado, e um horóscopo falso selecionado aleatoriamente entre os produzidos para o outros alunos do estudo. Cada participante teve uma chance de 50/50 de escolher seu próprio horóscopo, e isso teve resultados interessantes. Na verdade, os alunos acertaram apenas 46%, indicando que havia uma leve – embora não estatisticamente significativa – tendência dos alunos escolherem o falso horóscopo da astrologia em vez do seu próprio.
Para eliminar a possibilidade de que os estudantes universitários simplesmente não tivessem noção de suas personalidades, minha aluna também fez com que cada participante preenchesse um famoso teste de personalidade de papel e lápis. Apresentados a uma escolha semelhante: seu próprio perfil de escala de personalidade combinado com o perfil de outra pessoa aleatória, os alunos se saíram muito melhor. Desta vez, houve uma taxa de identificação correta de 79%, muito acima do que seria esperado ao acaso. Portanto, a astrologia não funcionou, mas um teste de personalidade amplamente utilizado funcionou. Os resultados da tese de minha aluna foram consistentes com uma longa linha de testes semelhantes mostrando que a astrologia não fornece uma descrição precisa da personalidade, e ela publicou o estudo no Journal of General Psychology (Wyman e Vyse, 2008).
Embora minha aluna tenha aceitado a precisão de seus resultados, tenho quase certeza de que ela não desistiu de sua crença na astrologia e não está sozinha. Apesar da evidência esmagadora de que a astrologia é baseada em uma teoria pseudocientífica e não é uma medida confiável da personalidade – parecida com uma bola de cristal prevendo o futuro – esta antiga forma de crendice não diminuiu em popularidade. De fato, Julie Beck (2018), escrevendo no Atlantic, sugere que estamos experimentando um boom na astrologia entre os Millennials, impulsionado pela diminuição do estigma e do marketing na internet. A astrologia é particularmente popular na Índia, onde, de acordo com uma projeção, a indústria online lucrou US$ 3 bilhões de 2017 a 2020 (Magon, 2017). Mas pode haver outras explicações de por que a astrologia estaria particularmente popular neste momento.
O básico
A astrologia é um sistema de crença que implica a localização das estrelas e planetas no momento do nascimento de uma pessoa na determinação de sua personalidade, e seus proponentes afirmam que é possível escrever um mapa natal astrológico que revele sua natureza básica. Além disso, ao longo de sua vida, as posições dos astros continuam influenciando sua vida, tornando útil consultar seu horóscopo diário para saber o que vai acontecer e como você deve abordar o dia. A astrologia é usada de várias maneiras e vem em muitas formas. Um estudioso escreve que, “dependendo das definições de todas essas palavras, pode ser considerado magia, adivinhação, uma ferramenta psicológica, uma religião, uma arte ou uma ciência” (Campion, 2016, 1).
Acredita-se que a astrologia surgiu na Babilônia no segundo milênio a.C., como uma forma mais simples de astrologia de presságio ligada ao calendário e às constelações. Evidências de tabuletas cuneiformes sobreviventes sugerem que uma astrologia nmais próxima dos horóscopos de hoje surgiu em algum momento entre os séculos VII e IV a.C (Holden, 2006). Dadas as suas origens antigas, a astrologia tem sido notavelmente bem-sucedida. As pesquisas do Gallup sugerem que aproximadamente 25% dos adultos nos Estados Unidos, Reino Unido e França acreditam em astrologia (citado em Campion, 2016).
Além disso, a astrologia é uma espécie de linguagem universal e o material para cantadas entre jovens místicos. Segundo algumas estimativas, 90% dos adultos conhecem seu signo solar astrológico (Campion, 2017).
A demografia da crença
Um dos aspectos mais notáveis da crença na astrologia é que ela é mais frequentemente adotada pelos ditos progressistas. Um estudo do Pew Research Center de 2009 descobriu que as pessoas que se descrevem como progressistas tinham quase o dobro de probabilidade de dizer que acreditam em astrologia do que os autodenominados conservadores: 30% dos progressistas em comparação com 16% dos conservadores (Liu, 2009). Da mesma forma, um estudo de 2015 usando dados da Pesquisa Social Geral da Pesquisa de Opinião Nacional da Universidade de Chicago, EUA, descobriu que os conservadores eram mais propensos a endossar a declaração: “a sociedade confia demais na ciência e não o suficiente na fé religiosa” e os progressistas eram mais propensos a consultar seu horóscopo diário ou perfil astrológico (DellaPosta, Shi e Macy, 2015, 1482–1483).
De acordo com o estudo do Pew, é mais provável que a crença seja um fenômeno entre jovens, com a faixa etária de 18 a 29 anos, tendo uma taxa de crença de 30% que diminui a cada faixa etária crescente. Apenas 18% das pessoas de 65 anos ou mais endossavam a astrologia. A educação também foi sistematicamente associada a níveis mais baixos de crença, com 18% dos graduados universitários endossando a astrologia, em comparação com 30% dos alunos do ensino médio ou menos escolarizados. Finalmente, tanto para protestantes quanto para católicos, a frequência mais frequente à igreja estava relacionada a níveis mais baixos de crença na astrologia (Liu, 2009).
A Psicologia da Crença
Talvez porque a astrologia seja tão extraordinariamente resiliente, a pesquisa sobre a psicologia da crença tem uma história longa e contínua. Uma das primeiras contribuições de pesquisa identificou uma das razões pelas quais as pessoas tendem a se ver em seus horóscopos – não importa o que o horóscopo diga. O psicólogo Paul Meehl chamou isso de “Efeito Barnum”, uma referência ao lema do famoso showman PT Barnum: “nasce um otário a cada minuto”. Mas a mais famosa demonstração inicial do efeito Barnum foi feita por Bertram Forer (Forer 1949; Meehl 1958). Forer deu a uma classe de estudantes de psicologia um questionário de personalidade para preencher e depois distribuiu o que os alunos presumiram ser esboços de personalidade únicos. Na verdade, todos os esboços eram iguais e foram tirados de um livro de astrologia de banca de jornal. Quando solicitados a avaliar a precisão dos esboços, a esmagadora maioria considerou-os notavelmente precisos. O ilusionista James “The Amazing” Randi liderou uma demonstração em sala de aula do efeito Barnum em uma transmissão da PBS NOVA (Carlson, 2000). Deve-se notar que os horóscopos são particularmente suscetíveis ao efeito Barnum, porque tendem a ser escritos em termos ambíguos e não específicos que podem ser interpretados de várias maneiras, mas os testes psicológicos também são propensos ao efeito Barnum (Wyman e Vyse, 2008). Um fator adicional que tem sido implicado na aceitação dos horóscopos é se a descrição é positiva ou negativa. Em um teste usando horóscopos que variavam em sua valência positiva ou negativa, Hamilton (2001) descobriu que – como você poderia esperar – as pessoas estavam mais dispostas a dizer que seu horóscopo era válido se a descrição fosse geralmente positiva, no entanto, usando um método diferente de teste com uma amostra alemã, Wunder (2004) não encontrou efeito do favorabilidade dos signos solares.
Por algum tempo após o estudo de Forer, a maioria das investigações científicas da astrologia foram testes de sua validade (Tyson, 1984; Carlson, 1985; Hartmann, Reuter e Nyborg, 2006). Um grupo de estudos tentou determinar se a pessoa se reconhece na descrição oferecida no horóscopo — semelhante à tese da minha aluna. Em alguns casos, em vez de o indivíduo escolher seu próprio horóscopo de uma seleção de horóscopos, a identificação era feita por um amigo ou parente que conhecia bem o indivíduo-alvo (Tyson, 1984), mas essa técnica não produzia melhores resultados. Outra abordagem, usada por Hartmann e colegas (2006), foi administrar um teste psicológico validado de personalidade a um grande grupo de pessoas e tentar encontrar qualquer traço de personalidade associado aos signos astrológicos dos participantes. Este método também resultados negativos para a astrologia. Assim, o resultado esmagador de muitos estudos é que os horóscopos não são descrições válidas da personalidade.
Uma das principais explicações para a crença na superstição é o desejo de controle sobre eventos incontroláveis (Vyse, 2014), e vários estudos sugerem que o desejo de controle também é um fator importante na crença na astrologia. Por exemplo, em um estudo finlandês, Outi Lillqvist e Marjaana Lindeman (1998) aplicaram questionários a pessoas que se inscreveram em aulas de educação para adultos em introdução à astrologia, psicologia ou alemão. Em comparação com os alunos das outras turmas, os alunos de astrologia relataram ter passado recentemente por mais crises em suas vidas (por exemplo, divórcio, infidelidade ou filho saindo de casa). Curiosamente, mesmo entre os grupos de controle que tiveram aulas de psicologia ou alemão, aqueles que relataram maior crença na astrologia também relataram ter experimentado mais crises em suas vidsa. Então, parece que quando as pessoas perdem o equilíbrio e são abaladas pelo mundo, a astrologia fornece uma sensação de ordem e controle. Em um estudo de laboratório, os participantes de uma pesquisa estadunidense foram solicitados a julgar o quão preciso era um horóscopo, mas antes de fazerem o julgamento, eles foram preparados para ter um senso de controle ou falta de controle. Metade dos participantes foi convidada a recordar um momento em que algo aconteceu com eles e eles estavam no controle da situação, e a outra metade foi solicitada a lembrar de um momento em que algo aconteceu, mas eles não estavam no controle. Quando posteriormente solicitado a julgar os horóscopos, o grupo “fora de controle” relatou que seu horóscopo era mais preciso. Juntos, esses estudos apontam para a astrologia sendo usada como uma forma de “controle compensatório” para estabilizar os crédulos quando eles se sentem instáveis (Landua, Kay e Whitson, 2015).
Os ingredientes para um boom astrológico
O resumo anterior fornece algumas pistas sobre por que a astrologia pode estar bombando no momento. Primeiro, é um movimento jovem, e outro estudo recente da Pew Research mostra que a geração Millennial é menos religiosa do que as gerações mais velhas, mas não menos espiritual. Em resposta à pergunta “a religião é muito importante”, apenas 41% dos Millennials disseram que sim, em comparação com 59% dos boomers. Ao mesmo tempo, os Millennials eram muito semelhantes a outras gerações em questões sobre ter um senso de admiração pelo universo, sentimentos de gratidão e uma preocupação com significado e propósito (Alper, 2015). Assim, para algumas pessoas mais jovens para quem a religião tradicional não é atraente, a astrologia pode fornecer uma saída espiritual.
Em segundo lugar, é muito provável que dois fatores tenham se combinado para tornar a astrologia mais atraente no momento: o progressismo e a necessidade de controle. A astrologia tem um apelo mais forte para os progressistas do que para os conservadores, e nos Estados Unidos, desde novembro de 2016, o mundo progressista foi abalado. Se alguma vez houve um momento em que os progressistas poderiam estar procurando por um senso compensatório de controle, é agora. Os conservadores estão se sentindo melhor, mas mesmo que a situação fosse invertida, os dados da pesquisa Pew sugerem que eles estariam mais propensos a se refugiar na religião do que na astrologia ou em outras formas de espiritualidade. Se a história deste momento promoveu a crença no paranormal, não seria a primeira vez. Estudos anteriores mostraram um interesse crescente em astrologia e outras crenças ocultas durante períodos de dificuldades econômicas e políticas. como na Alemanha durante a década de 1930 (Padgett e Jorgenson, 1982). Da mesma forma, o programa NOVA “Secrets of the Psychics”, no qual James Randi demonstrou o Efeito Barnum, foi produzido em resposta a um aumento no interesse pelo paranormal na Rússia após a queda do Muro de Berlim e o desmembramento da União Soviética.
Finalmente, não podemos ignorar um fator adicional óbvio – a internet. Atualmente, há menos comerciais de televisão para médiuns e suas sensitivisses em consultas por telefone, mas a internet explodiu como um novo veículo para médiuns e astrólogos. A geração do milênio é muito adepta de computadores e smartphones, e a internet oferece a oportunidade de ler um horóscopo ou consultar um astrólogo sem medo de estigmatização ou ridicularização.
Se, como suspeito, minha aluna não abandonou a astrologia depois de descobrir evidências de que ela é uma pseudociência sem fundamento (como mais uma prova dessa hipótese, observarei que ela me deu um livro de astrologia quando se formou), deve haver uma grande público para signos solares e mapas astrais natais. Além disso, o surgimento de uma geração que não é tão tradicionalmente religiosa quanto as anteriores, mas ainda busca uma espécie de satisfação espiritual, combinada com a derrota da política progressista nos Estados Unidos e no exterior, criou um ambiente fértil para essa forma de superstição e irracionalidade. A atual tempestade pseudocientífica pode passar, mas a história da minha aluna sugere que a evidência por si só pode não ser suficiente para transformar crédulos em racionalistas.
Referências
- Alper, Becka A. 2015. “Millennials Are Less Religious than Older Americans, but Just as Spiritual.” Pew Research Center. 23 de novembro de 2015. Disponível online em: http://www.pewresearch.org/fact-tank/2015/11/23/millennials-are-less-religious-than-older-americans-but-just-as-spiritual/.
- Beck, Julie. 2018. “The New Age of Astrology.” The Atlantic. 16 de janeiro de 2018. Disponível online em: https://www.theatlantic.com/health/archive/2018/01/the-new-age-of-astrology/550034/.
- Campion, Nicholas. 2016. Astrology and popular religion in the modern west: Prophecy, cosmology and the new age movement. Routledge.
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