Por David Nield
Publicado na ScienceAlert
Cientistas acabam de estabelecer um novo recorde mundial de plasma sustentado de alta temperatura com o dispositivo Korea Superconducing Tokamak Advanced Research (KSTAR), atingindo uma temperatura de íons acima de 100 milhões de graus Celsius por um período de 20 segundos.
Conhecido como o “sol artificial” da Coreia, o KSTAR usa campos magnéticos para gerar e estabilizar plasma ultraquecido, com o objetivo final de tornar a energia de fusão nuclear uma realidade – uma fonte potencialmente ilimitada de energia limpa que pode transformar a forma como abastecemos nossas vidas, se conseguirmos fazer com que funcione como pretendido.
Antes desse marco, 100 milhões de graus não haviam sido mantidos por mais de 10 segundos, então é um avanço substancial em relação aos esforços anteriores – mesmo que ainda haja um longo caminho a percorrer antes que possamos nos livrar completamente de outras fontes de energia. Neste ponto, a energia de fusão nuclear continua sendo uma possibilidade, não uma certeza.
“As tecnologias necessárias para operações longas de plasma de 100 milhões de graus são a chave para a realização da energia de fusão”, disse o físico nuclear Si-Woo Yoon, diretor do Centro de Pesquisa do KSTAR do Instituto Coreano de Energia de Fusão (KFE). “O sucesso do KSTAR em manter o plasma de alta temperatura por 20 segundos será um ponto de partida importante na corrida para garantir as tecnologias para a operação do plasma de alto desempenho de longa duração, um componente crítico de um reator de fusão nuclear comercial no futuro”.
A chave para o avanço dos 20 segundos foi uma atualização dos mecanismos de Barreira de Transporte Interno (ITB) dentro do KSTAR. Esses mecanismos não são totalmente compreendidos pelos cientistas, mas no nível mais simples eles ajudam a controlar o confinamento e a estabilidade das reações de fusão nuclear.
O KSTAR é um reator do estilo tokamak, semelhante ao que recentemente entrou em operação na China, fundindo núcleos atômicos para criar essas enormes quantidades de energia (ao contrário da fissão nuclear usada em usinas de energia, que divide os núcleos atômicos).
Embora o trabalho científico necessário para alcançar isso seja complexo, o progresso tem sido constante. O KSTAR rompeu pela primeira vez o limite de 100 milhões de graus em 2018 e, em 2019, conseguiu manter a temperatura por 8 segundos. Agora, esse tempo mais que dobrou.
“O sucesso do experimento KSTAR na operação longa e de alta temperatura, superando algumas desvantagens dos mecanismos ITB nos traz um passo mais perto do desenvolvimento de tecnologias para a realização da energia de fusão nuclear”, disse o físico nuclear Yong-Su Na, da Universidade Nacional de Seul (SNU).
Dispositivos de fusão como o KSTAR usam isótopos de hidrogênio para criar um estado de plasma onde íons e elétrons são separados, preparados assim para o aquecimento – as mesmas reações de fusão que acontecem no Sol, daí o apelido dado a esses reatores.
Por enquanto, manter temperaturas altas o suficiente por um período de tempo longo o suficiente para que a tecnologia seja viável provou ser um desafio. Os cientistas precisarão quebrar mais recordes como esse para que a fusão nuclear funcione como fonte de energia – escoando mais do que água salgada (uma fonte de isótopos de hidrogênio) e produzindo o mínimo de resíduos.
Apesar de todo o trabalho que temos pela frente para fazer com que esses reatores produzam mais energia do que consomem, o progresso tem sido encorajador. Em 2025, os engenheiros do KSTAR almejam exceder a marca de 100 milhões de graus por um período de 300 segundos.
“A temperatura de íons de 100 milhões de graus alcançada ao permitir o aquecimento eficiente do plasma do núcleo por uma duração tão longa demonstrou a capacidade única do dispositivo supercondutor KSTAR e será reconhecida como uma base viável para produzir plasmas de fusão em estado estacionário de alto desempenho”, disse o físico nuclear Young-Seok Park, da Universidade Columbia (EUA).
Os resultados do experimento ainda não foram publicados em um estudo revisado por pares, mas estão sendo compartilhados na Conferência de Energia de Fusão da IAEA 2021.