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O que aconteceu com as mulheres na ciência da computação?

Por Steve Henn
Publicado no
NPR

A ciência da computação moderna é dominada por homens, mas nem sempre foi assim.

Uma boa parte dos(as) pioneiros(as) em computação — pessoas que programaram os primeiros computadores digitais — eram mulheres. Por décadas, o número de mulheres estudando ciência da computação estava crescendo mais rápido do que o número de homens. Mas em 1984 — ano de lançamento do primeiro Macintosh — algo mudou, o percentual de mulheres em ciência da computação se estabilizou e depois declinou consideravelmente mesmo que o percentual de mulheres em outras áreas técnicas e profissionais continuou subindo.

O que aconteceu?

Passamos as últimas semanas tentando responder esta pergunta e não conseguimos nenhuma resposta clara e única.

Mas aqui está um bom ponto de partida: a participação de mulheres na ciência da computação começou a cair praticamente no mesmo momento em que os computadores pessoais começaram a aparecer nos lares norte-americanos em números significativos.

Estes primitivos computadores pessoais não eram muito mais do que brinquedos. Você podia jogar simples jogos de ping-pong ou jogos de tiro, quem sabe fazer algumas edições de texto. E estes brinquedos foram comercializados quase que inteiramente voltado aos homens e meninos.

Esta ideia de que os computadores são para meninos se tornou um marco. Tornou-se uma história que que nós contamos a nós mesmos sobre a revolução da computação. Isso ajudou a definir quem eram os geeks e criou a cultura tech.

Filmes como Weird Science (Mulher nota 1000 ou Que Loucura de Mulher), A Vingança dos Nerds ou Jogos de Guerra apareceram todos nos anos 80. E os resumos dos enredos são bem parecidos: um menino geek estranho e gênio usa seus conhecimentos em tecnologia para vencer suas adversidades e conquistar a garota.

Na década de 90, a pesquisadora Jane Margolis entrevistou centenas de estudantes de ciência da computação na Universidade Carnegie Mellon, que tem uma das melhores grades curriculares do país. Ela descobriu que as famílias eram muito mais propensas a comprar computadores para os meninos do que para as meninas — mesmo quando elas estavam bastante interessadas em computadores.

Isto foi muito significante quando estes jovens entraram pra faculdade. Quanto mais os computadores pessoais se tornavam mais comuns, mais os professores de ciência da computação assumiam que seus alunos haviam crescido operando computadores em casa.

Patricia Ordóñez não tinha computador em casa, mas ela era um gênio da matemática na escola.

“Minha professora percebeu que eu era muito boa em resolver problemas, então ela colocou eu e um outro rapaz para fazer matemática especial”, ela disse. “Nós fazíamos matemática em vez de intervalo”.

Então, quando Ordóñez entrou para Universidade Johns Hopkins, nos anos 80, ela imaginou que iria estudar ciência da computação ou engenharia elétrica. Em seguida, ela teve sua primeira aula introdutória e descobriu que a maioria de seus colegas do sexo masculino estavam muito à frente dela porque tinham crescido operando computadores.

“Lembro de uma vez que eu fiz uma pergunta e o professor parou e olhou para mim e disse: ‘Você já devia saber isso'”, ela lembra. “E eu pensei ‘Eu nunca vou me destacar’”.

Nos anos 70, isso jamais teria acontecido, pois os professores das aulas introdutórias assumiam que seus alunos tinham entrado com sem qualquer experiência, mas nos anos 80 isso tinha mudado.

Ordóñez se dedicou na aula, mas ganhou o primeiro C de sua vida. Então, por fim, ela abandonou a grade e se formou em Línguas Estrangeiras.

Mais de uma década depois, porém, ela retornou para os computadores. Ela encontrou um orientador e, finalmente, se tornou Ph.D. em Ciência da Computação. Agora ela é professora assistente de ciência da computação na Universidade de Porto Rico.

A história de Ordóñez e os dados nos mostram que, apesar de sabermos que não é tudo que é construído socialmente, não podemos negar a influência social que, como consequência, acabou desestimulando o interesse por acadêmicas na área de ciência da computação, assim como formou-se um esteriótipo social da cultura tech, como já dito no artigo.

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Engenheiro de software na Codenation